Lá se vão 28 anos desde o longínquo ano de 1994, data em que possivelmente muitos dos que estão lendo este texto nesse exato instante sequer haviam nascido. O subestimado console NeoGeo, além dos arcades da época, estava recebendo um tal de Windjammers, jogo esportivo desenvolvido pela Data East (mais famosa pelo inesquecível Side Pocket) em uma época anterior até mesmo ao lendário Internacional Super Star Soccer, que seria lançado dois anos depois. Basicamente, tratava-se de um jogo competitivo entre duas pessoas (ou numa batalha entre um humano contra a CPU) onde o objetivo era vencer o adversário, do outro lado da tela em uma arena vista de cima, arremessando um… disco de frisbee. De forma bem grosseira, uma evolução do conceito lá do princípio dos games, mais especificamente do lendário Pong.
Esta não foi, porém, a última vez que ouvimos falar desse jogo. Em 2017, a Dotemu assumiu a missão de desenvolver um port do original para a família Playstation (que mais tarde chegaria também ao Nintendo Switch), versão que provavelmente é a mais conhecida atualmente. Como relataram os próprios desenvolvedores, o plano ia além de simplesmente requentar um sucesso represado de quase trinta anos atrás, e uma continuação direta estava no horizonte desde que iniciaram-se os trabalhos. Provavelmente, a boa receptividade da nova edição de Windjammers, que uniu estética retrô com uma jogabilidade frenética do original com as modernidades atuais, sobretudo as competições on-line, permitiu que a segunda parte do plano fosse viabilizada.
Eis que recebemos em 2022 a continuação, Windjammers 2, totalmente produzido do zero, mas fortemente influenciado por todos os acertos (e alguns probleminhas) do port de cinco anos atrás. A sequência traz de volta o princípio básico: a competição ferrenha nas mais diversas arenas pelo título e pelas glórias de ser o melhor entre os melhores. E não demora para que entendamos que essa fidelidade às origens permeia toda a experiência, que não se furta da relativa complexidade de mecânicas e estratégias e que ao mesmo tempo se mantém simples e objetivo, sem inventar demais, sem desviar do foco e dos princípios fundamentais do projeto.
Logo de cara, temos três formas de aproveitar o jogo: o primeiro deles é baseado na boa e velha campanha cuja estética se aproxima muito mais de jogos de luta noventistas do que necessariamente do nicho dos esportes. A caminhada até o topo leva o jogador a enfrentar uma série de adversários em suas arenas – sempre com a possibilidade de escolher dentre duas possibilidades – até a final. Com direito a fases bônus que testam reflexos e controle, o modo é um bom e clássico arcade das antigas, com direito a cenas finais dedicadas a cada personagem. Detalhe interessante é que até mesmo as poses de vitória e de derrota remetem diretamente a Street Fighter II, com direito a galo na cabeça e tudo.
Outra possibilidade é a mais óbvia, o sistema 1×1 local, tanto contra um adversário humano quanto enfrentando a CPU, jeito mais adequado para treinar movimentos para quem quer dominar as principais táticas, internalizar o timing dos controles e praticar estratégias, uma vez que o tutorial não é lá muito instrutivo por só ilustrar comandos em esquemas estáticos, e não haver um lugar para testar combinações que não as partidas em si. Tão básico quanto necessário, o versus é daquelas experiências que vão render muito para aquele domingão com a família no sofá pós churrascão, já que essencialmente Windjammers 2 conta com partidas rápidas, bem diretas e próprias para o já não tão popular, mas essencial “perdeu, passa o controle”.
Já o terceiro modo, como não poderia deixar de ser, é a categoria on-line que traz a possibilidade de partidas casuais ou ranqueadas contra adversários ao redor do mundo, assim como a opção de se jogar com alguém da sua lista de amizades. Rankings mundiais e estatísticas on-line fecham o pacote de possibilidades multiplayer, e sobre esse modo, não há muito a se dizer para além da estabilidade aparentemente sólida, ao menos nesse período de avaliação pré-lançamento, que aliás ajustou alguns probleminhas detectados durante os testes abertos realizados meses atrás. Com um desempenho bastante satisfatório, algo que pesou bastante no lançamento anterior, foram poucos os momentos onde senti uma diferença de latência na comparação com os modos off-line.
Dito isso, senti falta de conteúdos outros, modos mais criativos que aproveitem as mecânicas aqui sedimentadas (das quais falo mais adiante) ou algo assim. Os três modos, no final, são basicamente variações do mesmo princípio, o da competição simples de dois adversários. Quem sabe se houvesse a possibilidade de jogos em duplas (inspirando-se ainda mais em esportes como Tennis ou Ping Pong) para partidas cooperativas, ou ainda desafios extras de força, agilidade ou criatividade, ou até desbloqueáveis cosméticos, não sei. É notório que faltam incentivos para que o jogador se mantenha imerso no mundo de Windjammers 2 por muito tempo, ainda que a jogabilidade garanta camadas surpreendentes de profundidade que podem desafiar os mais perfeccionistas.
Pra entrar no tema do gameplay em si, o princípio básico se mantém exatamente o mesmo do original: exceto pelas fases especiais de bônus, o objetivo é ultrapassar a linha de defesa do adversário com um disco ou fazê-lo cair no chão do lado de lá, considerando que o campo é dividido ao meio por uma rede. Para tal, é necessário dominar tanto os movimentos mais comuns, como simplesmente jogar o objeto em uma direção utilizando ou não as laterais (como naquele clássico brinquedo de shopping, o air disc); usar um movimento lento colocado; ou então se utilizar de comandos especiais que garantem bonificações. O primeiro dele é parar o arremesso adversário com um tapa no disco para cima, acumulando energia para devolver o ataque. Esse especial pode ainda ser evocado também por meio de uma barra que se acumula conforme o jogo avança.
Particularmente, me pareceu que faltam alguns refinamentos em termos de precisão no direcionamento de ataques tanto diretos quanto utilizando os limites do cenário. Como um amante de jogos de sinuca (incluindo o já citado clássico do SNES Side Pocket) que sempre quis fazer malabarismos usando ângulos improváveis para surpreender, me senti um pouco restrito aqui. Também me incomodei um pouco com o baixo incentivo para o bate-rebate que tanto faz subir a adrenalina no tal jogo dos disquinhos do qual falei anteriormente, já que mesmo com um comando para isso, parece ser um recurso pouco efetivo a ponto de a CPU quase nunca utilizá-lo e preferir aparar o arremesso inimigo para carregar um ataque especial.
Outros movimentos complementares, como o dash lateral e o salto, além de tiros com efeitos, também estão presentes e podem ser utilizados como ferramentas para superar uma desvantagem, e entender como cada função se encaixa na dinâmica garante competitividade mesmo diante adversários mais cascudos nas dificuldades mais elevadas. Mesmo que se apresente como um jogo conceitualmente simples de se aprender, porém, isso não significa que seja de fácil domínio. Os meus primeiros momentos, que podem ser conferidos no vídeo que acompanha esta análise, mesmo jogando na dificuldade mais fácil, apresentaram obstáculos pesados. Demorou para que eu pudesse me arriscar mesmo no patamar médio.
Cada personagem disponível traz consigo algumas habilidades especiais próprias, com efeitos diferentes uns dos outros, o que garante surpresas no início. Com alguns deles, me adaptei melhor, outros já parecem menos eficientes principalmente quando se tornam mais previsíveis. Além desse poder especial, os bonecos ainda trazem um equilíbrio diferenciado entre velocidade e poder, garantindo-lhes alguma personalidade. Aliás, o primeiro da lista, Jão Raposa, carrega o legado das cores do nosso país (com direito a frases de efeito típicas do Brasil), e é um dos que mais se destacam no quesito da agilidade. São 10 personagens no total, alguns repaginados do game original, outros totalmente originais.
Esse carisma de cada personagem é bastante valorizado, aliás, por um trabalho de direção de arte bem interessante, que não se limita ao saudosismo, sem contudo renegar o valor da nostalgia. Felizmente, mesmo que mantenha a máxima de um representante de cada país que agregam alguns traços característicos mais exagerados, eles fogem de alguns estereótipos rasos que eram típicos dos anos 1990 e, portanto, não espere um japonês lutador de sumô, um chinês que veste vermelho e sabe tudo de kung-fu ou do brasileiro selvagem sambando em um morro carioca ou na floresta amazônica.
Falando nos cenários, o grande acréscimo que eles trazem ao jogo não está só na skin temática, mas também nas características físicas, como dimensões mais estreitas ou alargadas, obstáculos na rede e até marcações de pontuação diferentes. Acertar o canto do adversário pode dar mais ou menos pontos do que no centro dependendo do cenário, e saber se aproveitar dessas especificidades é uma ótima forma de conquistar vantagem. Um cenário mais largo é prejudicial para jogadores mais lentos, enquanto os mais fortes podem lidar melhor com arremessos em laterais mais aproximadas ou barreiras centrais. Uma vez mais, a estratégia é composta por uma série de fatores, e tudo acaba fazendo diferença.
Em suma, o game é uma grande evolução de tudo o que de melhor trouxe o jogo original somado ao que o estúdio aprendeu no relançamento da versão remasterizada. Ao expandir as possibilidades estratégias tanto pelas características dos personagens jogáveis quanto das arenas de combate, os desenvolvedores trouxeram profundidade a um dos modelos mais simples e consagrados da história dos videogames. A ausência de elementos narrativos para além de uma ou outra cena pós-campanha não chega a ser um problema considerando o gênero, mas confesso que a falta de elementos criativos em quaisquer dos modos pode abreviar a longevidade do título. Como um todo, Windjammers 2 é divertido, dinâmico, e traz o equilíbrio certo entre o simples e o profundo como poucos de seu gênero.
Considerando que já no lançamento o jogo estará disponível, em outras plataformas, em serviços de assinatura, é muito provável que as primeiras semanas sejam bastante povoadas nos servidores on-line, o que garante muita qualificação nas partidas ranqueadas. Considerando que a falta de conteúdos de construção de mundo e de modos diferenciados – como um modo separado para os minigames das fases bônus, por exemplo – teremos em algumas semanas um vislumbre melhor do quanto o jogo conseguirá se manter relevante e interessante para um público mais fiel. De minha parte, estou me divertindo bastante com a experiência e certamente é um daqueles jogos despretensiosos que vou manter instalados na HD para vez ou outra voltar para jogar com amigos e família.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Dotemu.
Veredito
Windjammers 2 é tão simples quanto divertido, oferecendo um raro equilíbrio entre a nostalgia e a modernidade. Em essência, apresenta um desenho de jogabilidade bem sofisticado, ainda que com algumas imprecisões, além de visuais cartunescos caprichados e muito espírito de competição. Mas a falta de modos diferentes e de conteúdo extra podem abreviar a sua vida útil.
Windjammers 2 is as simple as it is fun, offering a rare balance between nostalgia and modernity. In essence, it features a very sophisticated gameplay design, albeit with some inaccuracies, in addition to neat cartoonish visuals and a lot of competition spirit. But the lack of different modes and extra content can shorten its lifespan.
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