Quando Unpacking foi lançado no ano passado para outros consoles, o burburinho em torno do jogo realmente me chamou a atenção. Afinal, a premissa do jogo é algo que é praticamente universal a vivência humana, mas raramente vista sendo transportada para os videogames: desempacotar as suas coisas e organizá-las em seu novo lar.
É natural para todo e qualquer ser humano se mudar de uma casa para outra e o processo de desempacotar suas coisas e encontrar um lugar para guardá-las é uma das partes mais cansativas e, ao mesmo tempo, é o que acaba fazendo com que uma nova casa comece a ter a sensação de ser um novo lar.
Unpacking, esse aclamado jogo indie lançado em 2021 pela Witch Beam, nos coloca então no lugar de um protagonista à medida em que ele vai mudando para novas residências em cada novo estágio da sua vida. É um curto jogo de quebra-cabeça que te convida a pensar e encontrar soluções sobre como e onde colocar cada um dos objetos que lhe pertencem no lugar correto.
Cada um dos sete estágios do jogo funciona da mesma forma. Ao iniciá-lo você verá várias caixas espalhadas pelo chão nos cômodos da casa e, à medida que vai interagindo com ela, precisa ir colocando cada novo item que vai surgindo nas estantes, prateleiras, armários e gavetas que estão a sua disposição.
As coisas começam fáceis o suficiente, com uma criança precisando encontrar onde melhor colocar seus ursos de pelúcia, lápis de cor e outros brinquedos mais simples. Com cada nova mudança, novas coisas vão surgindo e você precisará cuidar também de novos cômodos, como banheiro, cozinha, salas de estar e escritório.
Naturalmente, nem tudo estará nas caixas certas e você precisará saber identificar cada coisa e decidir onde melhor colocá-las para fazer o uso mais eficiente possível do seu espaço. À primeira vista, tudo parece muito simples e intuitivo, mas à medida que mais itens vão surgindo e você vai chegando ao final de cada fase, encontrar a melhor forma de encaixar todos os itens nos lugares corretos vai se tornando bem desafiador.
Isso significa que, em certos pontos, você precisará optar certos itens mais expostos e outros quase que escondidos, pensar sobre a forma mais eficiente de organizar as gavetas da sua cozinha, tentar decidir porque um ser humano pode precisar de tantos eletrodomésticos ou pra que tanto papel higiênico.
E, enquanto o ponto inicial de arrumar as coisas já consegue ser um tanto quanto complexo, após organizar todas as caixas o jogo pode ainda te apontar quais itens estão em locais onde eles não podem estar e daí começa o desafio de tentar descobrir onde eles deveriam estar e como você conseguiria encaixá-los ali tentando reorganizar o que já estava no lugar certo.
Assim, se você se preocupa em fazer tudo da forma correta e, principalmente, se você quiser fazer tudo da forma correta e mais bonita e organizada possível, Unpacking acaba se mostrando um jogo muito mais complexo do que a vibe e aparência relaxantes prometem entregar. É claro, graças às opções de acessibilidade, você pode simplesmente organizar tudo de toda forma e continuar avançando pelo jogo (especialmente se sua busca for só pela platina, que é bem simples), mas isso tira um pouco do que torna ele especial.
O curioso é que Unpacking não é um jogo longo. Ele dura algo entre 3 e 4 horas no máximo. Mas há um determinado ponto em que a experiência parece simplesmente clicar com o jogador e você começa a entender exatamente o que o torna tão especial e porquê a recepção do jogo foi de tamanha aclamação.
Pela forma como o jogo ordena suas mudanças, ele te faz pensar bastante sobre o que significa desempacotar suas coisas. Pensar sobre a forma como a gente se encaixa nos lugares e o que os torna realmente nossos, o que os torna especiais para nós enquanto seres humanos e como às vezes certos espaços acabam se tornando pequenos demais para quem nós passamos a ser depois de certos pontos na vida.
Mesmo sem em momento algum ter qualquer tipo de diálogo, Unpacking é um jogo sobre começos e recomeços, sobre como certos objetos são especiais para nós e acabam indo para todo lugar conosco ao longo de nossa vida, contribuindo para que um lugar que, no fim das contas, é só uma construção feita de cimento, tijolo e alvenaria, de fato se torne um lar.
É um jogo que realmente nos faz pensar sobre como colocar e tirar pessoas da nossa vida muda a dinâmica de um lar. Como algumas pessoas nos fazem subtrair de quem nós somos para que nos encaixemos nelas, enquanto outras adicionam, enriquecem o lugar e como a combinação entre as pessoas certas faz com que até mesmo objetos bastante díspares e aparentemente incongruentes se harmonizem pela harmonia entre as pessoas.
É difícil até falar mais sobre ele porque não tem muito mais o que ser dito sem entrar em spoilers ou detalhes demais que acabem estragando a experiência. Me parecia exagero pensar que um jogo tão simples tenha ganhado tantos prêmios (incluindo um DICE e dois BAFTAs, tendo sua narrativa reconhecida mesmo sem usar uma linha de diálogo). Mas, honestamente, tendo finalmente jogado… Cada prêmio foi mais do que merecido.
Minha única reclamação, se é que eu tenho alguma, é que, pela curta duração do jogo, o preço de R$82,50 é um tanto quanto salgado, especialmente quando comparado com o preço no PC. Dito isso, seja qual for o preço pago, se você gosta de jogos independentes e da mensagem que muitos deles tentam passar de forma mais criativa e singela, Unpacking é o jogo perfeito para você.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Humble Games.
Veredito
Unpacking é uma experiência simples e relaxante que consegue contar uma história envolvente e com uma bela mensagem ao mesmo tempo em que entrega um jogo de quebra-cabeça surpreendentemente desafiador. É um título que, se você se interessa por jogos independentes, precisa jogar.
Unpacking is a simple and relaxing experience that manages to tell an engaging story with a beautiful message while delivering a surprisingly challenging puzzle game. It is a title you need to play if you are interested in indie games.
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