Esquadrão Suicida: Mate a Liga da Justiça promete ser um jogo que será lembrado em diversas conversas sobre os mais variados aspectos quando nos referimos ao desenvolvimento e lançamento de um jogo. Há diversas questões que pairam sobre os jogadores desde o anúncio do título e nada melhorou até seu lançamento após diversos adiamentos. Um estúdio compelido por uma proposta comercial mais lucrativa usando os moldes do jogo como serviço? Saída de diversos desenvolvedores experientes e líderes do estúdio afetaram decisões no conceito e desenvolvimento do jogo? Uma proposta arriscada e não aceita pelo mercado que esperava algo diferente? A verdade é que essas e muitas outras questões jamais saberemos a resposta e precisamos apenas lidar com o que foi lançado.
Antes de mais nada, adianto que odeio criar conceitos rígidos para fórmulas de jogos que para muitos já é rotulada como “lixo” ou “desastre” antes mesmo que algo possa ser conferido. Quando se há público e relatos de sucesso em diversos jogos, fica difícil apenas dizer que a proposta X ou Y é ruim a todo custo e acaba sendo mais fácil afirmar que para uns e outros o modelo não é interessante. A onda de ódio com qualquer coisa que se assemelha ao tipo de jogo como serviço é algo estranho, sendo que muitos até aproveitam títulos que têm se mostrado valiosos assim, como Fortnite, Destiny, Diablo, The Division e outros. Julgar a princípio que o novo jogo da Rocksteady seria ruim apenas por abraçar isso é totalmente questionável.
Dito isso, 9 anos após o lançamento de Batman: Arkham Knight, Esquadrão Suicida: Mate a Liga da Justiça é o próximo capítulo desse universo Arkham. Ainda que de forma um pouco distante, traz uma nova história e diversos novos personagens no que seria uma expansão em potencial dos trabalhos anteriores da Rocksteady Studios.
Se o nome do jogo não foi claro o suficiente, o jogador assume o papel de um dos integrantes de um novo Esquadrão Suicida e precisa, contra todas as chances possíveis, eliminar os membros da Liga da Justiça que foram controlados por Brainiac após sua invasão na Terra. Arlequina, Capitão Bumerangue, Pistoleiro e Tubarão Rei são, por enquanto, os candidatos inesperados a se tornarem os próximos salvadores do planeta, mesmo que apenas a intenção disso possa parecer alguma piada. No comando de Amanda Waller e na busca de diversos outros personagens que irão auxiliar na impossível tarefa, o Esquadrão Suicida precisa descobrir maneiras de enfrentar e derrotar Batman, Lanterna Verde, Flash e Superman para poderem dar fim em Brainiac e sua intenção de transformar a Terra em seu novo lar.
Introduções feitas e já com diversos materiais divulgados é preciso deixar claro o que o jogo exatamente é. Um looter shooter em terceira pessoa, cooperativo para até 4 jogadores online e com intuito de receber diversas atualizações e novidades com o tempo de forma gratuita, mas que pretende se pagar via microtransações em itens cosméticos. Com uma campanha um pouco mais tradicional e conteúdo para criar um pós jogo (endgame), é esperado que jogadores fiquem ativos nas atividades e desafios que oferecem recompensas até que outras novidades sejam adicionadas e vão incrementando este novo universo.
Focando na campanha, o Esquadrão Suicida é formado após a soltura dos 4 vilões (ou anti heróis?) e ficando sob a tutela de Amanda Waller. Na base do “se vira aí”, derrote os membros da Liga e Brainiac, ou tenha a cabeça explodida. Sem muita explicação sobre a chegada do invasor de planetas ou como a Liga foi capturada, o jogador só assume seu papel e sai nos objetivos de história que o vão levar ao final. Apesar da simplicidade do plot e até mesmo de conceitos já batidos vistos até nos últimos 2 filmes, adianto que há bastante personalidade na empreitada ao utilizar aqui personagens de prateleiras inferiores da DC Comics, muito mais pela criação e desenvolvimento dos personagens em si e em cenas únicas repletas de humor e surpresa. Além disso, alguns pontos são de extremo destaque positivo, como fatores técnicos e artísticos de excelente qualidade e um nível de polimento acima do normal para jogos do tipo.
Se você espera uma estrutura de missões e narrativa similar ao que foi visto em qualquer Batman: Arkham, lamento informar que não há nada parecido. Missões lineares convencionais e que movem a história adiante não existem e isso é feito a partir das cutscenes apenas. Em resumo, o design de missões consiste em explorar Metrópolis até chegar ao próximo ícone de missão, realizar ali objetivos que detalharemos logo abaixo, ver a próxima cutscene e seguir. Essas missões acabam sendo batalhas banais com alguns modificadores – terríveis e desinteressantes – ou objetivos como capturar áreas e proteger, acompanhar veículos por uma trajetória, resgatar reféns e coisas do tipo. Como qualquer jogo do estilo, se assemelha muito aos eventos de mundo aberto que encontra em Destiny ou The Division, sem qualquer inspiração ou criatividade.
Com exceção de uma ou outra missão que talvez tente fugir disso, como uma na batcaverna, toda a campanha funciona nessa estrutura e culmina nas lutas de chefe contra os heróis possuídos. Lutas, aliás, que mais fazem um desserviço a cada herói e que também sofrem de uma grande falta de criatividade em design e, sem entrar em muitos detalhes, tornam o que poderiam ser momentos memoráveis em apenas mais uma parte da campanha que acaba sendo subaproveitada.
Como disse brevemente antes, raros momentos de extrema qualidade da campanha ficam por conta do carisma de cada personagem do Esquadrão. Algumas são memoráveis e me fez questionar como a proposta de jogo não vingou para algo focado numa campanha tradicional de momentos assim, como já tivemos em Batman: Arkham, mesmo que houvesse o adendo do cooperativo. De certa forma, no fim, a campanha parece que foi colocada para dar um propósito para que o modelo de jogo como serviço tivesse algum pontapé aqui, ou talvez apenas para agraciar fãs do estúdio/franquia que queriam mais conteúdo solo do mesmo universo.
Com uma duração entre 8 a 10 horas, essa campanha principal não satisfaz o jogador de forma alguma e serve para mostrar, de uma forma estranha, a qualidade do estúdio em outros aspectos. Gostaria de dizer que seria em roteiro, narrativa e outros pontos, mas aqui se destaca exatamente com o que nos acostumamos a receber em baixa qualidade de diversos jogos: parte técnica e visual. Modelos de personagens, dublagem, sincronia labial, animações (combate e cutscenes), expressões faciais, qualidade de imagem e performance de execução são de um nível altíssimo e demonstram um valor de produção considerável. Em época onde esses quesitos estão sendo ajustados apenas com meses após o lançamento, ter em mãos um jogo nesse estado técnico e visual é algo raro e extremamente satisfatório.
Já quanto à jogabilidade, acredito que Esquadrão Suicida: Mate a Liga da Justiça possa ser um 8 ou 80 para muitos. Há uma questão de personalidade que me incomoda desde o conceito, a de que, ainda que seja um jogo de tiro, todos ali tem suas características únicas filtradas para um estilo que convém ao jogo e não demonstra algo que funcionaria numa espécie de classes ou estilos. Em resumo, todos os 4 vilões – e aqui acredito que possa incluir o já anunciado Coringa que chega no futuro – vão agir como um clone de Pistoleiro e se diferenciam apenas pela movimentação. Esperava que cada personagem se mostrasse mais único e com experiências diferentes, não que fossem apenas uma outra forma de atirar e com ataque corpo a corpo que possui o mesmo efeito. Uma comparação direta com um jogo que executou isso muito melhor é Marvel’s Avengers, onde cada herói ali possuía movimentos, ataques, habilidades e equipamentos que os tornavam mais únicos.
Com a jogabilidade tendo sido nivelada a um ponto quase padrão entre os personagens, temos então os ataques com armas de fogo, corpo a corpo, granadas e habilidades especiais. Adicione a isso um sistema de aquisição de escudo, ativação de golpes críticos, efeitos elementais e outros para adicionar alguma profundidade. Níveis de equipamentos, bônus atrelados a status e talentos ativos ou passivos vão formar um sistema até interessante de construção de estilos de jogo. Entretanto, continuaremos a apenas pular, atirar, usar habilidades e mais sem se diferenciar muito um do outros. O que realmente muda é a forma de locomoção, criando finalmente algo que deixa cada personagem diferente além do visual. Inclusive é algo que pode ser muito pessoal, já que todos funcionam de formas diferentes e carecem de certa adaptação para escolher o melhor.
Além disso, o combate de forma geral é apresentado como uma coletânea de caos intermitente, seja pela execução ou visual. Em determinados momentos há informação em excesso na tela, com números de danos, ícones de munição e escudos, marcadores de objetivos e mais. Não é uma questão de interface em si, mas sim uma apresentação de um ambiente com dados exagerados e jogados pelo cenário. Já o combate segue esse mesmo caso e, aqui muito numa opinião pessoal, faz jus aos personagens. Caos e desespero é o que acaba ditando cada batalha no jogo, ao meu ver de uma forma positiva e que se fortalece à medida que o jogador vai se adequando a proposta e engata de vez tanto no sistema de combate quanto na movimentação.
Sobre onde usar tudo isso fica como palco a cidade de Metrópolis. Num estilo diferente do que vimos antes quando Gotham era o centro das atenções, agora temos uma cidade muito mais limpa e iluminada, com bastante verticalidade e um design interessante. O que acaba deixando o lugar quase esquecível é como foi usada, recheada dos mesmos tipos de inimigos que são apenas pessoas e máquinas deformadas pelo controle de Brainiac. Além disso, objetivos na cidade continuam mostrando o lado pouco inspirado do estúdio aqui, com missões nada diferentes das já comentadas para a campanha, nenhuma outra variação ou facção de inimigos e ainda com a adição de puzzles e segredos do Charada que sabe lá como veio parar aqui. Sendo mais um aspecto subaproveitado no jogo, o próprio palco do “espetáculo” deixa a desejar por decisões não compreendidas e que não se pagam no decorrer da jogatina.
Por fim, o fator jogo como serviço surge no pós jogo apresentando uma espécie de multiverso e versões de Brainiac por outras Terras assoladas pela sua invasão. Atravessar essas realidades consome um recurso que precisa ser adquirido ao enfrentar atividades na Terra-1 após a história principal. Após atravessar para outro universo, é necessário concluir objetivos para ter a chance de lutar contra Brainiac e o expulsar daquele local. Agora, se você estiver imaginando que as missões e objetivos do endgame serão diferentes do que já viu, então você está errado. Os mesmo objetivos de resgatar, eliminar hordas, proteger locais, acompanhar veículos e mais vão se repetir outra vez e, caso pensem que não poderia piorar nesse aspecto, a luta com Brainiac é o vilão interpretando um dos heróis enfrentados anteriormente em lutas contra chefes de forma quase totalmente idêntica.
Fica claro que há uma carência enorme de criatividade no design de forma geral no jogo, principalmente para as atividades nas quais se espera que jogadores passem horas e horas ali. Confesso que na metade da campanha tais atividades e objetivos já tinham me cansado o suficiente e não observei melhorias nisso mesmo após mais de 20 horas de jogo. Com o objetivo final sendo repetir tudo para coletar recursos, avançar nessas incursões pelo multiverso à procura de melhores equipamentos, com tudo isso voltando a apresentar as mesmas atividades batidas, temos então um problema sério de sustentabilidade nesse aspecto, que vai tanto cria desinteresse pelo desafio e recompensas.
Com certa experiência em jogos como serviço, o modelo que melhor me apeteceu ao jogar diversos endgames foi o de se preparar o máximo para o novo desafio que chega, seja ele já ingame ou vindo em atualização futura, para, após vencê-lo, conseguir uma recompensa adequada ao seu esforço. Esquadrão Suicida: Mate a Liga da Justiça e diversos outros jogos como serviço no estilo looter shooter se baseiam em fornecer a recompensa (novos personagens ou itens) para que você aproveite ela na mesma estrutura atual com leves mudanças. Anthem e Marvel’s Avengers são exemplos disso, no qual fornecer as recompensas de forma tão facilitada sem um caminho do desafio definido não funciona. Se as temporadas vindouras que a Rocksteady planejou não atuarem de uma forma diferente, não haverá um interesse maior do que já existe hoje.
Uma boa vantagem que a Rocksteady possui é a de entregar um jogo já bem polido. Não tive nenhum problema com desconexões, bugs, crashs ou qualquer coisa do tipo. Diversos outros jogos precisaram usar o tempo após lançado para corrigir problemas sérios de funcionamento, como Outriders, por exemplo. Se a desenvolvedora focar apenas em entregar novidades e balanceamentos pontuais, com mudanças no design ou novas atividades que incrementem o jogo de forma mais criativa, talvez as próximas temporadas realmente possam mudar uma primeira impressão mais negativa.
O que impede Esquadrão Suicida: Mate a Liga da Justiça de ser um jogo excelente não é se abraçar ao modelo live service, mas sim errar em fundamentos básicos para manter o título interessante como um todo, principalmente num sistema de design de missões assombroso. As qualidades notáveis do título estão ali, mas desperdiçadas entre as demais estruturas que não se seguram ou não formam ao menos uma base mínima já acertada que poderia se expandir com o tempo. Ainda que a história exista, ela se segura em seus personagens mais carismáticos e em momentos específicos, mas jamais se destacando por mérito próprio. A jogabilidade acaba por fazer o necessário para ser interessante por si através do combate, mas se perde por inimigos nada interessantes, atividades que não entregam criatividade e numa estrutura de pós jogo cansativa.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela WB Games.
Veredito
Ao tentar entregar um looter shooter num universo já consolidado mas mostrando um outro lado e outra abordagem, a Rocksteady Studios apenas comprovou que os fãs estavam certos desde o primeiro vislumbre do jogo. Há pontos positivos notáveis apesar de tudo, assim como aproveitar isso de forma cooperativa é divertido por algum tempo, mas as decisões tomadas não se mostraram as mais adequadas e Esquadrão Suicida: Mate a Liga da Justiça não consegue se destacar como um todo, sendo um produto pelas metades e sem muita criatividade.
By trying to deliver a looter shooter in an already consolidated universe but showing another side and approach, Rocksteady Studios only proved that fans were right from the first glimpse of the game. There are notable positives despite everything, as enjoying it cooperatively is fun for a while, but the decisions made didn’t prove to be the most appropriate and Suicide Squad: Kill the Justice League fails to stand out as a whole, being a half baked product without much creativity.
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