Serial Cleaner

Jogos stealth, embora cada um com sua particularidade, geralmente caem na mesma premissa de ser um ladrão/assassino, cujos objetivos vão de roubo de itens ao assassinato de alvos específicos, com as ações praticadas na surdina. Serial Cleaner, da polonesa iFun4all, embarca no gênero com uma particularidade inusitada: seu papel é entrar em cena após os crimes terem ocorrido, com o objetivo de fazer uma limpeza na área de modo a não deixar traços dos assassinatos ali praticados. Ou seja, neste jogo, você limpa a sujeira dos outros.

O protagonista possui nome, mas isso é irrelevante. O que importa é seu apelido, que tem tudo a ver com o trabalho exercido: faxineiro. Atendendo a contratos como freelancer para a máfia dos anos 1970, ele deve se infiltrar sorrateiramente em cenas do crime, eliminar corpos, limpar o sangue pós-carnificina e coletar qualquer tipo de evidência incriminadora, tudo isso sem ser pego por policiais e investigadores no local.

A apresentação do jogo de cara faz lembrar Hotline Miami devido a sua visão isométrica, pixel art e humor negro, só que aqui os visuais são mais clean e com cores menos saturadas. É tudo muito bem feito e variado, com um detalhe gráfico interessante de não haver curvas em nenhum elemento do cenário. O único aspecto problemático, que ocorre raramente em algumas fases, é quando a arte minimalista prejudica a identificação do que é estrutura, isto é, algo passível de se ocultar, daquilo que é plano (chão).

Serial Cleaner possui uma boa campanha dividida em 20 fases, que são chamadas de contrato. Cada contrato é composto de duas etapas: a primeira se passa na casa do faxineiro, onde a história avança e é possível saber de mais detalhes da vida do protagonista por meio da interação com alguns objetos e diálogos com a mãe. Sim, embora aparente estar próximo da casa dos 30 anos, o faxineiro ainda mora com a genitora. Ele também possui um vício não saudável por lutas de boxe, gastando sua grana em apostas administradas pela máfia (a mesma que o contrata). Tal vício é a motivação da trama do jogo, em que o faxineiro passa a fazer trabalhos para um cliente desconhecido de modo a ganhar uma grana extra, o que leva a uma sucessão de eventos onde ele começa a questionar a moral de seus serviços.

A segunda etapa do contrato são as incursões em cenas do crime para fazer a faxina deixada pelos malfeitores. Como já comentado, isso consiste em procurar por corpos e livrar-se deles, o que pode ser feito de muitas maneiras a depender de cada cenário: armazená-los em sacos plásticos em seu carro para um posterior descarte, colocá-los nos trilhos de um trem que se aproxima, ou até atirá-los em um tanque cheio de piranhas carnívoras. É também necessário recolher armas e outras evidências esquecidas no local, bem como usar um aspirador para limpar o sangue do chão.

É claro que toda essa faxina não é uma tarefa simples. Como os crimes já ocorreram, existe uma força policial investigando o cenário. Guardas irão perseguir o faxineiro assim que avistá-lo, o que acontece caso o personagem entre dentro do cone de visão de um deles. Ser pego faz com que esta etapa seja reiniciada, mas com um detalhe: a posição de corpos, sangue e objetos (e algumas vezes até mesmo as paredes) muda, exigindo uma nova abordagem da situação pelo jogador.

A IA dos guardas é bem projetada e, em certos casos, mostra aspectos de imprevisibilidade. Eles têm uma rota pré-definida, porém, podem alterá-la caso notem algo de diferente, como um objeto ou corpo faltando, ficando mais alertas e desconfiados. Isso cria várias situações tensas em que o jogador irá cerrar os dentes tentando acertar o timing, e até gera uma frustração divertida quando um guarda se decide por uma direção inesperada. Por outro lado, aproveitar-se do ambiente também pode ser usado a seu favor, fazendo com que guardas desviem da rota padrão, abrindo a oportunidade de chegar em salas mais difíceis ou protegidas.

Todos os contratos possuem um level design muito bem feito, criando diversas oportunidades e perigos. Existe certo nível de dificuldades neles, em que o avanço é na base de tentativa e erro até ter uma boa noção das melhores rotas a serem seguidas. Esporadicamente o jogo vai adicionando mecânicas novas, com guardas diferentes ou formas alternativas de se explorar o ambiente, porém, gostaria que tivessem adicionado objetivos mais variados. É possível jogar cada fase no período diurno e noturno (baseado na localização e hora atual do jogador), o que muda a iluminação, com as fases noturnas trazendo mais oportunidades de se esgueirar pelo ambiente.

Existem colecionáveis escondidos pelos contratos. Alguns dão acesso a novas roupas, o que, infelizmente, é algo apenas estético, não oferecendo nenhum tipo de vantagem adicional. Há também rolos de filmes que desbloqueiam contratos bônus, baseados em cenários e histórias de filmes da época. No entanto, reconheci apenas um ou outro.

Se tudo isso ainda não é o bastante, Serial Cleaner também oferece dezenas de desafios opcionais a serem cumpridos, que alteram algum aspecto de um contrato e incentivam o replay com a adição de uma tabela de líderes. Há o clássico time trial, de executar um contrato no menor tempo possível, e também outros mais divertidos, como jogar bêbado (o cenário fica torto e confuso) ou remover o cone de visão dos guardas, aumentando a dificuldade.

Para fechar este pacote mais que completo, Serial Cleaner possui uma trilha sonora excelente e empolgante. São ritmos variados e baseados nos anos 1970, fazendo uma mistura de jazz, disco e até heavy metal. Cada fase tem uma música exclusiva, adequada à temática, dando a elas uma identidade única. Essa parte sonora é um dos destaques do jogo, superando muitos títulos de orçamento maior. Para aqueles que apreciam, recomendo que adquiram o bundle que traz o jogo e sua trilha sonora. Com certeza não irão se arrepender.

Jogo analisado com código fornecido pela Curve Digital.