ROBOBEAT – Review

Depois da onda absurda dos jogos de simulação de bandas da geração PS2, com o destaque óbvio para franquias como Guitar Hero e Rock Band, o gênero foi perdendo, com o passar do tempo e das gerações, força e relevância mainstream a ponto de, nos dias atuais, pouca gente estar realmente no hype de um eventual retorno triunfante desse formato.
Ter esfriado, porém, não significa ter sumido, tampouco estar superado. Como em quase tudo no campo do entretenimento e da arte, as coisas se transformam, são ressignificadas e assumem novos contornos que, se não são massivamente tão populares quanto no seu auge, certamente oferecem novos meios, novas experiências.
ROBOBEAT, a partir deste breve contexto, surge como uma brisa refrescante que se apropria de uma mistura pouco ortodoxa de gêneros bastante surrados para propor algo diferente. De um lado, temos um típico jogo de ação com elementos modernos se mesclando ao modelo acelerado do que se convencionou chamar de boomer shooter.
Por outro, uma forte influência roquelite nos coloca em níveis desafiadores e com uma boa dose de geração procedural, fazendo com que cada run seja algo relativamente única tanto pela configuração do espaço cênico quando pela articulação entre salas de combate, elementos aleatórios temporários e habilidades permanentes.
Tudo isso temperado, claro, com uma bela abordagem rítmica, com a pulsação de ótimas composições guiando a frequência de tiros, poderes especiais e a movimentação inimiga, já que em essência, se apropriar da cadência musical é a única forma de se sair bem contra as hordas adversárias mais imponentes sobretudo nos níveis mais avançados.
Em outras palavras, ROBOBEAT é basicamente um game de tiro em primeira pessoa roguelite e rítmico, onde cada um destes aspectos tem peso e destaque de forma equilibrada dentro de um conjunto que consegue funcionar coeso, mas que depende do jogador imergir igualmente em todas elas sem ressalvas. Não adianta gostar só de jogos rítmicos e odiar FPS, por exemplo. É necessário bancar a proposta como um todo para aproveitá-la a contento.
Narrativamente, assumimos o papel de Ace, um tipo de caçador de recompensas cibernético que tem toda uma estética que lembra muito as primeiras versões de Starlord nas adaptações cinematográficas dos Guardiões da Galáxia, o que faz todo sentido não só pelo tom mais debochado do game como também pela quase dependência do protagonista em músicas retrô, com direito a toca-fitas-cassete e tudo mais.
Sua próxima missão o leva ao robô esquisitão conhecido como Frazzer, e para alcança-lo, será necessário atravessar uma série crescente de dungeons hi-tech utilizando de armas insanas, recursos técnicos avançados e principalmente, da agilidade sincronizada com a canção do momento.
A dinâmica roguelite não guarda qualquer segredo em seu funcionamento, e o jogador, partindo de um hub comum, terá que adentrar um dos grandes níveis escalonados pela dificuldade, atravessando-o sem perder seus parafusos pelo caminho. Se o primeiro desse micro-mundos parece convidativo e apresenta as principais mecânicas do jogo com clareza, os seguintes vão testar capacidade e resiliência até mesmo dos veteranos do tiroteio raiz.
Uma vez superados, os níveis não serão mais problema, o que significa que fracassar só nos leva de volta ao início da fase em questão. Por um lado, parece justo e quase natural, mas por outro não significa facilitar as coisas porque cada segmento é bastante longo e demanda bastante dedicação ao interligar passagens que incrementam o desafio em uma curva relativamente íngreme. Não é raro chegar ao chefe intermediário com a vida cheia e perecer uma ou duas salas depois.
A boa notícia é que o ciclo de gameplay é tão viciante quanto se espera de jogos assim. Não demora para que estejamos completamente embalados pelas músicas disponíveis, podendo encontrar várias fitas perdidas pelo caminho para jornadas posteriores, e o requisito de atirar no compasso das batidas deixa e ser um limitador e se torna um guia da cadência do combate. É, nesse ponto, catártico.
Com um tipo de arma em cada uma das mãos, tudo é bastante direto, com cada gatilho do controle disparando a arma correspondente. Botões de ombro são ótimos pra habilidades especiais, enquanto os de ação servem para parry, pulo, dash e ataque carregado. Já modificadores especiais mapeados no direcional digital parecem descontextualizados, principalmente porque acessar essas funções no calor do combate é meio desajeitado.
Salas especiais, mais do que esperadas, ajudam a dar pontos de respiro enquanto nos oferecem modificadores, estes sim temporários, como maior dano ou melhor capacidade de esquiva, por exemplo. Outras oferecem a troca de uma ou das duas armas, seja por outras totalmente diferentes, seja por versões aprimoradas das originais. Somados a coletáveis que ajudam a desbloquear itens permanentes, as idas e vindas são contínuas e, como já se pode esperar, frequentes.
O grande atrativo para os constantes retornos é que, por uma quantidade generosa de novas músicas, armas surpreendentemente distintas entre si que são liberadas com constância, bem como gadgets que mudam a perspectiva de níveis complicados, como o arpel por exemplo, toda nova run realmente tem um potencial de ser superior às anteriores. Senti pouco aquela sensação de esforço maior do que a recompensa.
Como resultado, em muitos momentos me vi coreografando sequências dignas dos melhores trechos de coisas como Ghostrunner, tamanhas as peripécias que estava me arriscando a fazer. Andar pelas paredes, usar impulsos de ar e atrair inimigos para armadilhas mortais, tudo isso de forma intrinsecamente ligada ao som pesado, é satisfatório e recompensador.
Já pelo aspecto audiovisual, foi mais difícil comprar a estética retrofuturista do jogo, com texturas pouco detalhadas, quinas e arestas grosseiras e uma certa aparência de inacabado. Os bonecos minimalistas sem personalidade são condizentes com esse ambiente tecno-industrial vazio, e as máquinas mais esquisitonas funcionam no contexto, mas não são atraentes o suficiente.
Mesmo considerando a geração de ambientes e combinações com doses aleatórias, tudo parece muito cru, com toques interessantes aqui e ali tal como nas grafitagens que ora ou outra são vistas nas paredes, mas que só acabam destacando a ausência de tantas outras possibilidades, não como um vazio planejado, mas como a falta de preenchimento, de identidade. Nem mesmo o uso pontual de cores intensas e tons de neon típicos da ficção científica moderna conseguem compensar um level design inteligente, mas pouco atraente.
Quem ganha com isso é o desempenho, com efeitos pirotécnicos abundantes, mesmo simples, e muita coisa acontecendo com uma velocidade impressionante. Não senti, jogando no PS5, qualquer comprometimento como queda de quadros ou serrilhados. Tudo é bem fluido e, considerando um FPS absurdamente agitado na maioria do tempo, é um jogo inegavelmente bem otimizado pelo que está propondo.
Por outro lado, as canções disponíveis originalmente são bem adequadas tanto para a temática, abusando dos pulsos eletrônicos e das batidas marcadas, como pela qualidade, visto que são agradáveis e alimentam sessões mais longas sem o desgaste de outras experiências de ritmo, como no ótimo Thumper, que funciona bem, mas é exaustivo depois de um tempo de foco. Diferentes entre si, elas aceleram ou não a ação de acordo com a escolha e a expectativa do jogador.
Você ainda pode escolher desligar a conexão entre a frequência de tiros e movimentos e a batida sonora, o que permite jogar de forma mais livre e sem as amarras de manter a cadência, mas sinceramente, fazer isso é assassinar tudo o que o jogo tem de mais especial. Ele vai funcionar tal qual qualquer outro shooter tradicional do mercado, mas se for pra fazer isso, melhor jogar os clássicos que, na comparação sem o aspecto musical, tem outras qualidades substancialmente melhores.
A soma de todos estes recortes que compõem ROBOBEAT é, na média, muito mais positivo do que um primeiro olhar desconfiado poderia prever. Se o projeto visual não me conquistou, a jogabilidade conseguiu me prender por mais tempo do que eu gostaria de admitir, mesmo eu já constatando que o formato roguelite anda saturado há algum tempo.
Já pelo lado da experiência rítmica, não seria exagerado dizer que o jogo renova os FPS como Hi-Fi Rush fez com os beat ‘em up, só que sem o mesmo brilhantismo técnico ou narrativo, já que toda a malandragem prometida nas cenas de abertura, bem como a caçada ao famigerado Frazzer, ficam para o último plano, praticamente sem relevância por quase todo o tempo. ROBOBEAT carrega muita personalidade potencial que pouco aparece, e falha narrativamente na mesma medida em que prevalece no gameplay.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Kwalee.
Veredito
A ausência prática de uma boa construção narrativa e os visuais divisivos podem assustar, mas não há dúvidas que ROBOBEAT é uma inesperada mistura muito bem afiada entre FPS clássico, ritmo e roguelike, com os ciclos de gameplay fluidos e viciantes como seu maior e mais competente trunfo.
The practical lack of a good narrative construction and the divisive visuals can be scary, but there is no doubt that ROBOBEAT is an unexpected well-balanced mix of classic FPS, rhythm and roguelike, with the fluid and addictive gameplay cycles as its greatest and most competent asset.
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