Jogos do gênero RPG existem aos montes (nós do PSX Brasil, inclusive, fizemos algumas listas bem legais com recomendações neste link e neste aqui), porém, nem todos conseguem se destacar como Othercide, um Tactical RPG indie que pode surpreender até os mais céticos.
Você provavelmente deve estar se perguntando como um jogo monocromático consegue competir com outros títulos tão cheios de vida e melhor qualidade gráfica, certo? A resposta você verá neste review, mas se tem algo que posso adiantar aqui é que Othercide foi ousado o suficiente para encarar de frente a concorrência.
O jogo foge de padrões já conhecidos no mercado, como Fire Emblem e Final Fantasy Tactics, por exemplo. No entanto, isso mostra que a Lightbulb Crew não teve medo de se arriscar num jogo um tanto quanto “conceitual”, dando aos jogadores uma experiência diferente, envolvente e, ao mesmo tempo, perturbadora.
O véu que separa a realidade desse mundo etéreo foi destroçado, agora, monstros dessa versão monocromática da França estão prestes a invadir o mundo real e cabe a você impedir isso.
A história de Othercide é intrigante e claro, vai muito além do simples “salve o mundo dos monstros dessa realidade”. Existem memórias por trás de toda essa narrativa. Lembranças de uma mãe que preza pela segurança de suas filhas e que fará de tudo para extinguir o mal desse mundo.
Mas agora é hora de deixar um pouco da história de Othercide de lado e focar no título como um todo, com seus pontos positivos, negativos e complexos.
Não gostaria de começar essa análise com o pé esquerdo, mas a primeira crítica (que inclusive pode incomodar o gameplay em certos momentos) vai para o tamanho das letras. Não é algo “uau” que vai tirar vários pontos, porém, quem tem problemas para enxergar de longe poderá se sentir desconfortável. É possível aumentar o tamanho das legendas, mas não dos menus.
Embora esse pequeno problema mencionado anteriormente cause incômodo em alguns jogadores (como eu), há outras opções de acessibilidade que podem agradar outros usuários. O título consegue se adaptar a diferentes perfis, e um deles, por exemplo, é um modo para daltônicos, que substitui a cor vermelha pela amarela.
Como dito no início deste review, Othercide é um RPG tático, porém, muito diferente (e mais difícil) do que outros existentes por aí. No melhor estilo rogue-like, você precisa atacar o “coração” desse mundo alternativo, e para isso, será preciso gerar filhas (unidades de combate) através de VITAES, que podem ser adquiridos nas sinapses.
Percebeu que logo de cara o jogo traz algumas coisas confusas, né? Mas calma. Antes de mais nada, é preciso explicar o que exatamente significa o termo rogue-like. Ele é considerado um subgênero de RPG com algumas características específicas, e uma delas é a morte permanente. Isso mesmo. Neste caso, se você perder todas as filhas geradas, voltará para o início da semana daquela era em questão.
Cada era é marcada por um chefe. A primeira, por exemplo, tem como inimigo o médico da peste. Para tentar deixar as coisas mais legais, alguns inimigos comuns acabam sendo variações mais fracas do chefão. Embora possa parecer algo comum ou sem muita importância, na verdade acaba sendo um detalhe muito bem cuidado, pois dá sentido à aparição de inimigos parecidos com seu mestre.
Para tentar “facilitar” as coisas para o jogador, o título marca o chefe de cada era em dois dias diferentes. Caso você alcance a primeira marcação, será possível enfrentá-lo desde o primeiro dia caso morra ou decida resetar a memória.
Claro que enfrentar um inimigo poderoso logo de cara é suicídio, tendo em vista que, quando se volta ao dia 1 daquela era, todas as filhas geradas morrem e voltam ao nível 1, sendo necessária uma paciência ENORME para treiná-las novamente. Porém, isso é algo que incentiva o jogador a continuar treinando e descobrindo novas táticas, ao invés de se frustrar em ter que fazer tudo de novo.
Geralmente, quando se morre ou reseta uma lembrança para resgatar fragmentos, você ganha uma moeda de ressuscitação. Ela serve para trazer de volta à vida uma de suas filhas, porém, isso acaba sendo um tanto quanto inútil por alguns motivos, já que essas moedas são difíceis de se conquistar.
Não sei se essa dificuldade toda é gratuita ou faz realmente algum sentido, mas ao mesmo tempo em que você se frustra com isso, consegue viciar e ficar com vontade de fazer mais sacrifícios para ficar mais forte.
Para evitar o game over, será preciso conquistar VITAES nas sinapses e gerar filhas dentro do Vazio Interno, que é como se fosse o menu de equipamentos do jogo. Na opção “Fonte de Gênese” é possível dar vida a guerreiras com nomes randômicos, mas que podem ter suas classes definidas entre Escudeira, Pistoleira, Espadachim e Ceifadora.
Cada uma dessas classes tem seus prós e contras. É difícil dizer com exatidão qual é melhor para aquele cenário, pois você nunca vai jogar a mesma fase duas vezes. E talvez essa seja a graça de Othercide. Enfrentar o desconhecido pode ser divertido, mesmo que ele esteja muito difícil de seguir em frente.
Para começar essa carnificina toda, é preciso selecionar as missões nas sinapses, além disso, só é possível atacar um (ou algumas) vezes por dia. Para conseguir batalhar de novo, é preciso descansar e começar um novo dia. Às vezes, na linha temporal das eras, desafios surgem com uma “!”. Eles dão um gostinho a mais às batalhas, aumentando ainda mais o fator replay que, honestamente, já é alto por si só.
Antes de começar qualquer ataque, as sinapses dão uma prévia do nível de dificuldade, o número de filhas que você pode levar, recompensas e tipos de missão. Embora às vezes apareça que existem 2 ou mais sinapses, o jogador não precisa necessariamente completá-las para finalizar a semana. No entanto, quanto mais cenários você concluir, mais forte suas filhas ficam e mais fragmentos você conquista.
Lembra quando mencionamos os fragmentos lá em cima? Pois bem, eles têm sua serventia e são de extrema importância para você não se dar mal no jogo. Existem skills, ou melhor, recordações. Elas podem ser conquistadas ao cumprir certos requisitos, como acumular uma quantidade X de dano ou derrotar determinado chefe. Porém, para equipá-las, será necessário usar esses fragmentos, e as únicas formas de obtê-los são resetando as lembranças ou morrendo.
Essa dificuldade em se conquistar esses fragmentos pode variar entre o amor e o ódio dos jogadores, até mesmo para quem já é acostumado com esse tipo de jogo. Primeiro que é preciso muito empenho e perseverança para chegar no chefe com muito HP. Segundo que para desbloquear um dos troféus é necessário derrotar cada chefe em apenas uma única lembrança. Em outras palavras: você que lute para platinar.
Para – tentar – deixar a situação mais justa, é possível equipar memórias nas habilidades de cada filha. Elas podem ser desbloqueadas durante os embates das sinapses. Não existe uma forma certa de obtê-las, você simplesmente é avisado quando uma nova memória é desbloqueada.
A voz que anuncia essa e outras conquistas, inclusive, acaba tornando tudo mais imersivo. Ela nada mais é que a própria Mãe Vermelha conversando com suas filhas e com você. Esse tipo de interação, mesmo que simples, faz toda a diferença para quem está na frente da tela.
Eu já falei muito das opções que o título te dá e, embora elas sejam muitas, é extremamente importante ter em mente que o modo que você luta com suas filhas em campo, define os traços da personalidade de cada uma delas.
Se por um acaso sua unidade for mais agressiva e atacar diversas vezes sem se importar com a quantidade de AP gastos, ela pode pegar um traço de “agressividade”, que pode dar alguns bônus a ela. Porém, é preciso ficar atento, pois nem todos os “benefícios” são necessariamente bons.
E como estamos falando de benefícios adquiridos em batalhas, vou deixar bem claro aqui que elas são bem difíceis. Talvez os inimigos comuns não sejam tão perigosos no início, porém, caso suas filhas sofram dano, só será possível recuperar o HP sacrificando outra de mesmo nível. Esse ato dificulta muito o avanço, por isso é recomendável treiná-las igualmente.
Dependendo do nível das filhas, as lutas contra inimigos comuns podem ser fáceis, porém, Othercide possui muitas cartas na manga, e uma delas é o fator surpresa. As batalhas contra os chefes são épicas por alguns motivos, mas os principais estão relacionados à incrível trilha sonora e a necessidade de se ter uma boa estratégia para contornar os constantes momentos de perigo.
Othercide não é um simples RPG tático, ele vai muito além disso. Como você pôde perceber no início deste review, foi preciso explicar primeiro algumas das principais funcionalidades, para depois levantarmos outras questões importantes sobre o título. Mas isso se fez necessário pelo simples fato de que o jogo é muito complexo.
As batalhas comuns não são tão difíceis, porém, é preciso passar muito tempo raciocinando quantos fragmentos você precisa, se vale a pena continuar treinando as filhas ou se recomeçar do 0 é a opção mais viável. Tudo isso consome muito do jogador, e se você não for do tipo paciente, não irá gostar nada do jogo.
Felizmente, o título muda a todo momento. Você nunca irá enfrentar os mesmos desafios e inimigos, nos mesmos cenários e formações. Como todo título do gênero rogue-like, este aqui sempre muda o ambiente a cada nova sinapse. Com exceção dos chefes, claro, que acabam trazendo um padrão de ataques que “facilita as batalhas”.
No fim, Othercide supre a necessidade de quem é fã do gênero e busca algo alternativo e conceitual. Mas se você não faz parte do grupo de jogadores que adora uma dificuldade elevada, é melhor ficar bem longe para não passar raiva.
Jogo analisado no PS4 Pro com código fornecido pela Focus Home Interactive.
Veredito
Othercide leva o gênero RPG tático a outro nível com seu conceito. A trilha sonora, chefes épicos e um sistema rico e complexo, faz você passar muitas e muitas horas na frente da TV planejando os seus próximos ataques. Infelizmente ele não é acessível para todos, já que sua elevada dificuldade pode afastar os fãs do gênero. Mas se você ama títulos aos moldes rogue-like, definitivamente, este é o seu jogo.
Othercide takes the tactical RPG genre to another level with its concept. The soundtrack, epic bosses and a rich and complex system, make you spend many, many hours in front of the TV planning your next attacks. Unfortunately, it is not accessible to everyone, as its high difficulty can alienate fans of the genre. But if you love roguelike titles, this is definitely your game.
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