Levar Warhammer para os consoles tem sido um considerável exercício de futilidade nessa geração. Apesar da promessa da Games Workshop de um maior investimento na criação de jogos de videogame baseado na sua mais famosa IP e o relativo sucesso da marca nos PCs com jogos como Total War: Warhammer, a sensação que se tem é que toda semana sai algo para PS4 e ele consegue decepcionar.
Tentando reverter essa péssima sina da franquia, a Rogue Factor Entertainment lança, em parceria com a Focus Home Interactive, Necromunda: Underhive Wars. Tentando traduzir o jogo de tabuleiro de estratégia para um RPG de Estratégia digital, o jogo traz elementos interessantes tanto para fãs de longa-data quanto para novatos no mundo de Warhammer.
Seguindo o mesmo template do jogo anterior da Rogue Factor, Mordheim: City of the Damned, tratando-se de um jogo de estratégia por turnos aquém de um XCOM ou Wasteland, com o principal diferencial sendo a incorporação de um sistema de câmera em terceira pessoa (ao invés da típica visão isométrica) e a inclusão de diferentes níveis no mapa, com o jogador precisando usar elevadores, escadas e tirolesas para se mover e tirar melhor vantagem do seu posicionamento.
Baseado no recente reboot que a Games Workshop fez no tradicional universo de Underhive, o jogo se passa no mundo-colméia de mesmo nome e mantém bastante do estilo mais sombrio típico da série. É notório, no entanto, que ao contrário do uso das tradicionais armaduras pesadas e monstros que costumam ser atrelados ao nome Warhammer, aqui temos um ambiente mais urbano e mais cheio de humanos.
Underhive traz um universo mais metropolitano, mas cheio dos mesmos problemas comuns de qualquer boa distopia: a cidade é extremamente poluída e suja, dominada pelo crime e corrupção, envolvida em diversas guerras entre gangues pelo controle da cidade e na busca por supostos tesouros escondidos abaixo da cidade.
O jogador assume então o comando de uma dessas gangues, precisando fazer tudo o que for necessário para prosperar nesse ambiente hostil, sobreviver às batalhas e crescer no submundo de Underhive, seja encontrando tesouros antigos, seja derrotando uma (ou mais) gangues em confronto direto.
Uma das coisas que Nercromunda: Underhive Wars faz de uma forma bem interessante é capturar a dinâmica geral do jogo de tabuleiro e transportá-lo para os videogames. As batalhas se passam em mapas bem amplos, com múltiplos níveis, nos quais os jogadores precisarão derrotar inimigos específicos ou alcançar uma determinada área e onde o campo de visão e posicionamento são fundamentais e costumam ser a principal diferença entre a vida e a morte dos seus soldados.
A dinâmica das batalhas em si é um pouco distinta de outros jogos do gênero. Ao invés do jogador determinar as ações de todos os seus personagens de uma vez e então vir o turno do adversário, as ações são alternadas. Você pode, livremente, escolher um dos seus soldados, movè-lo pelo mapa, realizar uma ação e, após isso, um soldado do adversário agirá. A exceção aparece quando uma das facções tem mais soldados que a outra, que então é possível realizar mais ações em sequência ao final.
Um outro ponto interessante é que o jogo usa duas barras de ação distintas para movimentação e para as ações, ao contrário de outros jogos como Wasteland e XCOM em que você precisa saber gerenciar os seus pontos de ação para poder fazer as duas coisas ou sacrificar uma em favor da outra.
Isso faz com que você possa se mover bastante a cada turno, além de poder atacar múltiplas vezes ou atacar e recarregar a arma, por exemplo, tudo dentro da mesma fase de ação. Para completar, ao fim de cada rodada de turnos, todos os pontos de movimento e pontos de ação são completamente renovados, tirando completamente qualquer elemento de gerenciamento de AP/MP do jogo.
Como mencionado antes, o jogo adota um sistema de câmera em 3ª Pessoa, que te faz visualizar a ação de um ponto de vista mais dinâmico, algo que é feito, supostamente, para facilitar a tomada de decisões pela incorporação da verticalidade ao mapa. Mas, na prática, ele realmente não funciona como a Rogue Factor parece ter planejado.
Enquanto visualmente o jogo é bem decente e os efeitos dos ataques sejam legais de se ver, não há nada demais nele e existe uma razão pela qual a visão isométrica é tão sinônimo dos jogos do gênero: ela funciona. Ao contrário das outras. Não só o sistema de câmera do jogo realmente atrapalha na tomada de decisões, mas o jogo traz um mapa bem pífio e que não ajuda em planejar as suas ações. Duas coisas fundamentais em um jogo de estratégia.
Se localizar dentro do mapa em Necromunda é muito mais complexo e entediante do que deveria ser, com algumas missões te forçando a andar por vários e vários turnos sem fazer nada só para completar um objetivo aleatório. Assim, não só os mapas são grandes demais horizontalmente, mas a verticalidade trazida não adiciona em nada além de alongar as batalhas mais do que elas precisariam ser.
Junte a isso que, muitas vezes, você precisa exterminar todos os adversário e chegar em um ponto distante do mapa, mas o jogo te joga inimigos surgindo em pontos aleatórios sem motivo nenhum, tornando as missões bastante chatas. Isso poderia ser remediado se a história fosse interessante, mas ela também é bem fraca, mal fazendo um bom uso dos elementos que tornam Necromunda algo marcante dentro de Warhammer 40.000.
Mesmo que ele tente trazer uma nova proposta e seus próprios desafios, a implantação dos vários sistemas de estratégia no jogo é bem morna. Muito do que faz um jogo de estratégia funcionar é colocar ou colocar os jogadores direto em combates tensos em que cada decisão importa ou criar um ar de tensão quando há uma exploração do mapa, com cada nova parte dele podendo trazer uma ameaça que você precisará identificar e lidar mesmo sendo pego de surpresa.
Isso é o que faz com que RPGs de Estratégia orientais (no primeiro caso) ou jogos de estratégia por turno ocidentais (no segundo caso) funcionem e se tornem tão interessantes. Necromunda: Underhive Wars, de alguma forma, falha em fazer os dois. O jogo até traz um sistema de customização interessante, te permitindo evoluir habilidades ativas e passivas, além das estatísticas dos seus personagens, mas, fora a possibilidade de criar o seu time como você quiser e usá-lo no multiplayer, é difícil encontrar muito propósito nisso.
Adicione a isso o fato da IA do jogo ser péssima, com os inimigos tomando decisões assombrosamente ruins, muitas vezes fugindo do jogador sem motivo algum mesmo em vantagem numérica, e a péssima implantação de RNG nos ataques (às infames porcentagens de XCOM talvez sejam a única coisa que foi copiada com sucesso de lá) e é bem difícil encontrar qualquer motivo para recomendar esse jogo.
Até mesmo a forma como o jogo usa os elementos de Necromunda para contar a história da sua gangue, Escher, enquanto ela batalha contra os Orlock e Goliath por poder dentro da Underhive é meio rasa. Elas são bem animadas e os diálogos são bem escritos e dublados, mas nenhum dos personagens parece ter carisma suficiente para te prender a história e ela acaba caindo em uma série de clichês já esperados.
Isso tudo faz com que, apesar de trazer uma série de ideias interessantes, Necromunda: Underhive Wars seja um exemplo delas sendo mal implementadas. Talvez com um pouco mais de tempo em desenvolvimento e polimento, o jogo poderia ter tido um resultado melhor, mas o que temos aqui é mais um jogo que falha em capturar todo o potencial que a série Warhammer tem.
Jogo analisado no PS4 padrão com código fornecido pela Focus Home Interactive.
Veredito
Necromunda: Underhive Wars é um jogo interessante, mas um que falha em algumas das premissas mais básicas do gênero e acaba conseguindo transformá-lo em algo chato que nem mesmo a ambientação consegue salvá-lo do fracasso.
Necromunda: Underhive Wars is an interesting game, but one that fails in some of the most basic premises of the genre and ends up managing to turn it into something boring that not even the setting can save it from failure.
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