Mystic Pillars: Remastered – Review

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Houve um momento onde esta indústria vital dos videogames começou a criar uma dicotomia entre gêneros, formatos e meios. De um lado, os jogos mais complexos, que teriam naturalmente espaço em plataformas dedicadas e potentes, como consoles e PCs. De outro, jogos ditos mais simples e diretos, normalmente puzzles, que teriam encontrado seu espaço em plataformas mobile. Mesmo que a realidade não reflita essa barreira imaginária entre tipos de jogos específicos determinados para um único perfil de jogador, com exemplos infindáveis tanto de um lado quanto do outro, o clichê se tornou uma constante e até hoje há quem veja o mercado desta forma.

Felizmente, é cada vez mais comum que tenhamos mais e mais conteúdos diversos chegando para quaisquer dispositivos, e é muito salutar ter a oportunidade de experimentar coisas como o recente Let’s! Revolution!, game baseado essencialmente em puzzles, foco também de Mystic Pillars, motivo desta análise, uma produção da Holy Cow Productions que se pauta por uma livre adaptação do lendário jogo de tabuleiro conhecido popularmente como Mancala (ou Ali Guli Mane em sua nomenclatura original) e que traz, em sua ambientação, fortes elementos da cultura indiana.

Mystic Pillars: Remastered

Na trama do jogo, uma versão remasterizada de computadores lançada originalmente em 2020 que desembarca agora no Playstation 5, encarnamos um misterioso estrangeiro que chega às terras de Zampi e descobre ser esta uma região castigada pela escassez de recursos básicos, como comida e água. Com uma população receptiva, mas extremamente vulnerável, o reino não tem muito a oferecer porque uma infinidade de pilares de origem desconhecida têm bloqueado a água de escoar pelos antes imponentes rios que banham os vilarejos em suas margens. No encontro com um misterioso espírito, descobrimos um pouco mais da história do local, bem como uma forma de usarmos uma habilidade para derrubá-los e salvar o povo do reino.

Esta contextualização está impressa com uma série de elementos culturais muito próprios do povo indiano, tais como vestes, idioma e arte, temas que estão estampados em cada pilar a ser derrubado, em cada cena de corte que assistimos conforme se avança na trama, em cada tonalidade intensa das cores saturadas que permeiam toda a jornada. Um dos aspectos periféricos ao gameplay é o trabalho audiovisual riquíssimo, que evita os virtuosismos esnobes das grandes produções e, no lugar, utiliza muito bem traços e ilustrações muito autênticas e cheias de uma beleza única.

Mystic Pillars: Remastered

Quando entendemos o que está acontecendo ali e o que deve, de fato, ser feito, entra a essência dos quebra-cabeças a serem resolvidos. Esses pilares místicos que dão nome ao game estão envoltos de uma estranha magia, conectados entre si por caminhos definidos e imbuídos de pedras especiais. Há um gabarito à direita que deve ser atingido, indicando quantas pedras cada pilar deve conter para ser destruído, mas para isso, é necessário leva-las de um lugar a outro. Elas só podem ser transferidas numa relação direta entre quantidade de pedras e distância entre pilares. Pode-se sentir falta de uma integração mais diegética entre o que está sendo contado e o que está sendo jogado, e a narrativa emergente, para quem se importa com isso, parece só como uma mera desculpa para o uso de pilares. Inofensivo, mas ainda assim, pouco coeso.

Em outras palavras, só é possível passar uma pedra por rodada para o pilar exatamente ao lado. Para dois pilares adiante, vão duas pedras ao mesmo tempo. Para um pilar que está a 6 pontos de distância, vão-se 6 pedras de uma só vez, e assim por diante. Portanto, não é o jogador quem define a quantidade a ser transferida, mas sim a distância. Como o número de jogadas é definido junto ao gabarito, é necessário planejar cada movimento para que ao final das rodadas, as pedras estejam exatamente onde deveriam estar. O vídeo das primeiras fases que abre esta análise é bastante ilustrativo dessa regra que permeia cada um dos 100 desafios colocados em jogo, divididos entre 7 povoados distintos.

Mystic Pillars: Remastered

No início, tudo é bastante simples e óbvio, como manda a cartilha do game design que determina que um bom jogo precisa ser fácil de aprender. Bastam algumas fases superadas para a coisa complicar, mantendo o segundo mandamento: ser difícil de dominar. Sem ajudinhas extras e contando somente com a possibilidade de se voltar um passo atrás ou do começo, não há muito o que fazer senão entender a forma de distribuição e encontrar meios mais diretos de se cumprir a meta. Em muitos casos, será algo um tanto quanto automático, principalmente quando a nossa mente começa a funcionar instintivamente pela lógica da coisa toda; mas em outros, nada mais útil do que a insistência, a resiliência e o aprendizado pelo modo empírico.

Algumas regrinhas leves são incorporadas em certos momentos conforme avançamos pelos vilarejos prejudicados, como o de certas direções serem só em um sentido e não em ambos como era no princípio, mas nada de muito relevante que mude totalmente o sistema de jogabilidade: selecionamos o pilar com as pedras que queremos transferir e, depois, aquele que receberá os tais itens mágicos. Quanto mais longe, mais pedras. Muito provavelmente, uma das regras mais fáceis de se aprender na história dos videogames, mas nem por isso, fácil de se executar.

Mystic Pillars: Remastered

Isso porque na maioria do tempo, esses pilares não estarão em linha reta, o que significa que a quantidade de passos entre um e outro é algo bem diversificado. Os design de cada nível é cuidadosamente pensado para nos pregar algumas peças, e mais importante do que imaginar a distância é compreender os caminhos entalecidos pelas linhas conectoras que, como dito, podem estar ligadas por setas unidirecionais ou não. Como não poderia deixar de ser, cada detalhe importa, e se está lá é porque deve ser considerado nos cálculos mentais e na lógica adotada.

A boa notícia é que não há punição pelo erro para além de ter que começar de novo, a não ser por um detalhe: a platina, para os caçadores de troféus, depende de um número limitado de reinícios, então quem estiver interessado em fazer os 100% das conquistas precisa ter muito cuidado porque errar demais pode fazer com que falte um único troféu no final da aventura. As demais metas são relativamente simples: basicamente serão ganhos terminando a campanha, assistindo as cut-scenes sem pula-las, lendo as descrições expandidas de cada local e dando uma bisbilhotada na galeria de artes do jogo. Com cuidado e bom desempenho, dá pra garantir a platina em 4 ou 5 horas, talvez menos dependendo da capacidade do jogador em resolver enigmas.

Mystic Pillars: Remastered

Aliás, a galeria de Mystic Pillars está longe de ser das mais recheadas de conteúdo, mas com algumas peças muito instigantes. Há as cenas de história que já foram desbloqueadas, algumas ilustrações conceituais lindíssimas e a parte que eu, particularmente, mais gostei, com artes de fãs. A diversidade de traço e colorização de pessoas que não são da produção é um elemento complementar relativamente simples, mas muito sintomático sobre o carinho com que a obra foi tratada desde sua concepção. Somada à paixão aos detalhes, ao cuidado com a escrita, à caracterização das personagens e à atuação por vozes – e fica a sugestão de que, mesmo disponível com áudio em inglês, se mantenha o idioma original e legendas em português brasileiro – tudo transpira respeito e capricho.

O modo como o espírito (que, no fim das contas, é o nosso anfitrião para aquele universo), compartimentaliza a história que está nos contando é metódica, mas provocativa o suficiente para que esperemos ansiosamente pela sua próxima interação, mesmo que seja só para nos dizer que estamos indo bem. Rápidas e econômicas, essas passagens narrativas dão um respiro quando a mente começa a cansar dos desafios de cada fase, e levam a campanha adiante. Se o jogo sobreviveria tranquilamente só como uma coleção de puzzles, é nesse aspecto narrativo onde ele demonstra um charme que o destaca de tantas e tantas outras opções mais duras por aí.

Mystic Pillars: Remastered

Mystic Pillars poderia ser classificado por olhos mais conservadores como mais um jogo típico da plataforma mobile a chegar em consoles de mesa por pura conveniência, o que não seria um julgamento errado, mas certamente seria reducionista. Se o desenho de jogabilidade pode até parecer mais natural para as telas de toque, a inexistência da pressão por tempo ou movimentos rápidos torna a interação via DualSense muito tranquila. Se a interface tem poucos detalhes que exigem uma tela grande, eu realmente aproveitei bem jogando deitado no sofá ou sentado na pontinha da cadeira quando a coisa ficava mais complicada.

É sim, em essência, um jogo clássico de desafios rápidos e independentes, que funciona muito bem para aqueles 10 ou 15 minutinhos de bobeira depois do almoço ou no intervalo entre games mais complexos, o que lhe garante espaço no HD do videogame por muito tempo. Mas ao mesmo tempo, incorporando um elemento contextual e cultural tão rico e trazendo quebra-cabeças que podem fritar o cérebro por um bom tempo, ganha contornos mais sofisticados sem perder, entretanto, uma simplicidade cada vez mais rara nos dias atuais.

Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Holy Cow Productions.

Veredito

Culturalmente relevante e provocativo em seu gameplay, Mystic Pillars é daqueles jogos que, bebendo de ótimos referenciais, encontra na simplicidade o seu elemento de interesse. Pode não ser instigante o suficiente para certos perfis de jogadores, mas os interessados em um bom puzzle vão certamente se divertir bastante.

85

Mystic Pillars: Remastered

Fabricante: Holy Cow Productions

Plataforma: PS5

Gênero: Puzzle

Distribuidora: Holy Cow Productions

Lançamento: 19/03/2024

Dublado: Não

Legendado: Sim

Troféus: Sim (inclusive Platina)

Comprar na

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Culturally relevant and provocative in its gameplay, Mystic Pillars is one of those games that, while drawing on great references, finds its element of interest in its simplicity. It may not be exciting enough for certain players, but those interested in a good puzzle will certainly have a lot of fun.

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Culturally relevant and provocative in its gameplay, Mystic Pillars is one of those games that, while drawing on great references, finds its element of interest in its simplicity. It may not be exciting enough for certain players, but those interested in a good puzzle will certainly have a lot of fun.

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