Monster Sanctuary – Review

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Não é a primeira vez que me vejo analisando um jogo que chega com a alcunha de “é tipo um Pokémon” e recordo que, não faz muito tempo, pude tratar aqui no site de Temtem, talvez o maior e mais claro clone do formato tradicional de batalhas por turnos com criaturas colecionáveis. O mais recente caso, porém, foi quando tive a oportunidade de explorar Monster Harvest, que entra naquela categoria derivada de comparação que é basicamente “é tipo um Pokémon misturado com alguma coisa”. Pois bem, agora é a vez de analisar Monster Sanctuary, que não foge, inicialmente, do conceito de ser uma mistura da famosa franquia dos monstros de bolso com outro gênero, desta vez, o consagrado metroidvania.

Felizmente, o rótulo nesse caso se torna só uma notinha de rodapé para que o jogador consiga ter uma ideia do que esperar ao adentrar este extenso e rico universo do game, que já não é tão recente assim, mas que agora lança uma nova expansão e nos dá a oportunidade de fazer uma avaliação mais criteriosa sobre o seu funcionamento, mecânicas e tudo mais. Ao longo da jornada, mesmo que as comparações sejam realmente inevitáveis, o jogo oferece algo que vai muito além do que uma alternativa à tradicional franquia típica da Nintendo, o suficiente para criar e estabelecer uma identidade própria.

Em um mundo povoado por criaturas poderosas e muitos mistérios, nossa personagem inicia sua aventura descobrindo ser parte de uma poderosa dinastia de guardiões que defende uma das quatro casas mais importantes da guilda. Ao escolher nossa criatura inicial dentre quatro possíveis, cada uma delas especializada em alguns poderes elementais, definimos também qual é a nossa herança histórica, e aos poucos somos apresentados às regras e motivações que irão guiar nossas ações pelo mundo. Este parceiro também será a voz que nos ensinará os princípios essenciais ao longo da jornada.

Em um sistema de exploração bidimensional clássica, onde vamos abrindo caminho conforme liberamos acesso a habilidades específicas e autorizações especiais de acordo com nosso status dentro da comunidade dos guardiões, nossos objetivos primeiros são os de encontrar e vencer uma série de monstrinhos selvagens, na maioria das vezes em encontros com trios, alcançar as maiores patentes possíveis e finalmente enfrentar e vencer os mais perigosos inimigos, que funcionam basicamente como chefes de cada unidade narrativa, que ameaçam o equilíbrio do mundo. Claro que há uma história maior a se revelar, mas nada que seja tão bombástico assim, nem que fuja de uma fórmula conhecida.

A narrativa emergente que vai se construindo com bastante calma, o encontro com aliados e adversários e os mistérios que vão se revelando conforme exploramos os cantos mais escondidos daquele mundo é, se não complexa ou sofisticada, coesa e cheia de atrativos que nos empolgam para o próximo passo. Mesmo que tenhamos uma certa liberdade de exploração dentro do espectro já liberado, o game sempre parece estar de fato caminhando adiante, avançando e nos levando para o próximo nível. Também ajuda o fato de que, exceto por um ou outro momento mais expositivo, as conversas via texto são dinâmicas, cheias de bom humor e trazem o nível certo de revelações.

Tudo isso não seria o suficiente, claro, se o desenho de níveis não fosse realmente bem projetado para oferecer a dose certa de desafio. Não é um jogo especialmente complicado no que se refere ao aspecto de plataforma, ainda que certas passagens, sobretudo trechos opcionais, podem dar um pouco mais de trabalho ao exigirem mais precisão, raciocínio e/ou timing do jogador. Bem interessante também aquele detalhe de que certos acessos não dependem necessariamente do nível alcançado ou mesmo da habilidade de quem está no controle, mas sim da equipe que construímos até chegar lá.

Isso porque cada criatura capturada, como já é de praxe, tem afinidade com alguns poderes elementais, como fogo, eletricidade, água, gelo, veneno, e por aí vai. Essa característica, quase que automaticamente, nos remete naturalmente ao combate, onde cada elemento tem suas vantagens e suas desvantagens em relação aos outros. Sobre as batalhas, porém, falo mais adiante. O que interessa aqui é que além de poderes para vencer inimigos, cada um também tem um movimento especial que pode ajudar no acesso a caminhos escondidos, o que torna o elemento metroidvania ainda mais imersivo e diverso. Não basta conseguirmos pular mais longe ou mais alto, nem usarmos da carteirada para passar por um vigia. É necessário estar muito bem acompanhado.

Por exemplo, o meu leão ancestral de fogo já começa com a habilidade de destruir barreiras de visco ou paredes ocultas, o que garante que em vários pontos ele possa literalmente abrir caminhos escondidos. Já os companheiros alados podem nos dar um impulso extra para chegarmos mais longe em saltos. Outros podem ainda criar pedras que valem como plataforma extra ou peso para acionar dispositivos, e para cada um há totens que abrem passagens ou que influenciam diretamente no caminho a se percorrer. Chegar até um aparato desses sem ter chocado um aliado correspondente significa ter que deixar aquilo para depois, ou voltar e procurar ajuda para poder seguir adiante.

Falando nisso, explico melhor o sistema de recrutamento do jogo: diferente de Pokémon (olha a comparação novamente), não capturamos monstros selvagens vencidos ou enfraquecidos, mas sim ganhamos ovos após batalhas bem-sucedidas. A probabilidade de se conquistar esse prêmio depende do nosso desempenho na batalha, e quanto mais rápido superarmos os perigos, mais ovos (e outros equipamentos e consumíveis) ganhamos, necessariamente da mesma espécie da que vencemos. Assim que recebemos o bônus, podemos chocá-lo diretamente pelo inventário e aí aquele que nasce se torna nosso fiel parceiro de aventuras. Na lore do jogo, a justificativa é simples, e descobrimos logo que só nos é leal a criatura que nasce conosco.

O time principal será composto por até seis criaturinhas, mas todas as demais continuam em nosso inventário por todo o caminho, o que, em outras palavras, simplifica ao máximo o sistema de composição do nosso esquadrão. A cada encontro aleatório, é possível ver quais são os inimigos que enfrentaremos (nada de tropeçar em um bicho qualquer escondido na grama alta), então é possível antes de trombar no primeiro deles – evento que dispara a batalha – montar o time adaptando nossas qualidades ao que desejamos enquanto estratégia. Claro que isso demanda um certo conhecimento prévio, mas nada que qualquer caçador experiente não precise. Na dúvida, claro, é só diversificar ao máximo sua elite.

Porém, não são seis os monstrinhos que levaremos para a briga (a não ser quando enfrentamos um outro guardião rival), mas sim três, a mesma quantidade, por padrão, dos adversários. Quando a luta começa, decidimos quais destes seis irão pra porrada. Em caso de vitória, todavia, todo o sexteto recebe os pontos de evolução de nível, permitindo que mesmo aqueles que estavam descansando se beneficiem. O mesmo não acontece com todos os demais que ficam em um terceiro plano. A recomendação aqui é que mesmo tendo um time principal, se reveze os outros três, o banco de reservas, por assim dizer, para que tenhamos mais do que só meia dúzia de aliados prontos para os desafios de maior nível. Claro que estamos falando de um ambiente que valoriza o vai-e-volta, então vale também usar formações alternativas contra inimigos em áreas já superadas para farmar XP para todos antes de partir para novos ares.

As batalhas em si também passam pelo lugar comum do gênero, e funcionam por turnos. Resumidamente, na nossa rodada, escolhemos qual dos três componentes do nosso time irá fazer o movimento, decidimos dentre as habilidades disponíveis e em qual (ou quais) adversários o ataque (se for o caso) será lançado. Há habilidades também de suporte e defesa, como escudos, recuperação de vida e tudo mais, além de outros golpes que criam efeitos permanentes em adversários, como incineração, envenenamento, etc. Quando todos os componentes da equipe agem, é a vez dos adversários, e assim vai até que o último elemento de um dos times caia. Para qualquer um que já tenha experimentado o formato, nada de muito novo aqui e tudo é bastante simples e intuitivo.

Aprender truques novos é parte de uma extensa e bastante generosa árvore de habilidades própria de cada bichinho. Sempre que subimos de nível, podemos desbloquear um novo item, que pode ser um movimento completamente novo, a ampliação dos já existentes, ou até capacidades passivas, como aumento nas barras de vida ou mana (cada movimento, em estado de combate, consome uma certa quantidade dessa energia) e outras tantas opções que favorecem a construção de uma equipe muito bem equilibrada para os desafios que aparecem. Costumeiramente, é sempre bom ter um componente com capacidade de healer ou que adiciona uma barra de escudos ao time todo, para que os demais tenham tranquilidade para ataques diretos.

Completam o arsenal de possibilidades as armas e armaduras que podem ser equipadas diretamente em seus companheiros, uma infinidade de opções que também acrescentam melhorias em diferentes características, como poder de ataque, defesa ou de acerto crítico, por exemplo. Consumíveis, sobretudo alimentos, também dão um gás extra em certas especificidades, o que significa que haverá camada sobre camada que irão transformar nossa composição básica em algo mais adequado e preparado para o que vier pela frente. É bastante improvável que haja qualquer jogador no mundo com a mesma combinação, dadas as virtualmente infindáveis possibilidades.

Felizmente, aquilo que poderia se tornar um pesadelo enfadonho é traduzido para uma linguagem muito acessível para qualquer um. É tudo muito simples e direto, sem rebarbas, sem firulas, e mesmo parecendo algo complicado agora enquanto descrevo, cada aspecto desses é ensinado com muita calma e paciência em um verdadeira aula de suporte ao usuário. O jogo é longo – nada menos do que 40 horas é o que precisamos em uma primeira run para terminar a aventura principal – e dá o tempo necessário para que aprendamos tudo isso até que se torne algo automatizado. Monster Sanctuary está o tempo todo preocupado em facilitar a interface de usuário para que o jogador extraia o máximo de tudo o que tem a disposição para fazer o melhor possível.

E se a burocracia é a mais clean possível, os gráficos também não ficam atrás, o que é muito positivo para a produção. O visual 2D pixelado do game esbanja carisma e, sem medo de se apropriar de cores e palhetas fortes e ousadas típicas da linguagem, consegue transitar de forma muito fluida por diferentes biomas, um mais belo que o outro, e transformar cenários internos e externos em verdadeiras obras de pixel art. O design de alguns monstrinhos, principalmente em suas formas mais primárias, acaba devendo um pouco em termos de criatividade e alguns deles são literalmente bolinhas com olhos, mas outros são mais inspirados e rapidamente se tornam queridinhos do jogador.

O sistema de evolução para uma forma diferente, falando nisso, é também muito conhecido do grande público, e é realizado em um local determinado utilizando artefatos que podem ser ou encontrados em baús, ou dados como premiação nas lutas, ou ainda comprados com mercadores a esmo pelo mundo. Esses comerciantes também oferecem todos os demais itens citados anteriormente, e o valor de compra é, de forma surpreendente, bastante justo. É de se lamentar quando, por exemplo, gastamos todas as moedinhas ganhas com tanto suor em um ou dois itens raros em outras produções. Em Monster Sanctuary, há sim elementos muito caros e de raridade altíssima, mas consumíveis comuns são abundantes e dificilmente ficamos sem os mais importantes.

E se o jogo base já oferece conteúdo o suficiente para nos deixar entretidos por dezenas de horas, a expansão gratuita que chegou recentemente ao game, a chamada Forgotten World, consegue dar aos jogadores – aqueles que já tinham vencido o jogo antes e aqueles que se animarem a começar agora – uma série de novas possibilidades. Começando pela quantidade de criaturas, que aumenta em 10% os números originais e agora chegam a 110 espécies, algo que pode parecer quantitativamente inferior à concorrência, mas que por haver um certo equilíbrio no elemento da repetição, se faz muito adequado ao escopo do game. Colecionar esses bichinhos é, claro, um objetivo, quase uma obsessão, mas felizmente não chega a ser uma forma de engrossar artificialmente a campanha.

Junto com essas adições, vem novas habilidades e itens, incrementando aquela já robusta função de customização do time. Além disso, há agora a possibilidade de jogar, além das dificuldades padrão, em um modo mais exigente, o Bravery Mode, e para os mais corajosos, há ainda a chance de ativar o temido Permadeth, deixando cada encontro ainda mais tenso, algo recomendado, obviamente, só para os jogadores experientes em uma segunda, quem sabe terceira run. Contudo, o jogo é, como já citado, bastante responsivo e paciente, e o modo normal é de certa forma muito tranquilo para quem não ousar queimar etapas. Então, nada impede que os desbravadores já partam para os níveis mais pesados logo de cara, o que significa que quem pegar o jogo agora já pode ser petulante como quiser.

Monster Sanctuary é um verdadeiro achado, seja você fã ou não do primo mais famoso lá da Nintendo. Com um modelo de jogo que definitivamente não é dos mais originais, misturando gêneros e fórmulas consagradas, o jogo tinha tudo para se encaixar naquela incômoda gaveta dos clones esquecíveis, mas ao usar de suas inspirações de forma muito peculiar, sem querer reinventar a roda ou encher o jogador de menus e sub-menus complicados e com páginas e mais páginas de texto explicativo, ele consegue se solidificar pelos próprios méritos. O visual retrô faz parte desse charme, e mesmo que também seja algo pouco inventivo dentro do mercado independente atual, corresponde bem ao propósito o jogo, sem parecer um elemento nostálgico vazio.

Talvez seja esse o grande mérito, afinal das contas, desse jogo: ao misturar uma série de elementos que todos nós já vimos antes, Monster Sanctuary consegue evitar os perigos de ser só um mais-do-mesmo qualquer, e estabelece um mundo rico, cheio de cores e personagens que tornam aquilo algo vivo. Cheio que caminhos fascinantes, encontros emblemáticos que no testam e nos exigem o uso criativo de tudo o que aprendemos e evoluímos até ali, além de ótimos puzzles que dão um toque de diversidade que faz bem ao gênero, é um jogo que, quietinho, cumpre tudo o que promete com louvor. Não à toa, a expansão consegue evidenciar que esse universo é vasto, poderoso e cheio de potencialidades, e já fico esperando ansiosamente para saber o que poderá surgir a partir daqui.

Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Team17.

Veredito

Ao unir ótimos sistemas de progressão lateral, combate por turnos e com toques generosos de um bom RPG no melhor estilo pixel art, Monster Sanctuary é um belíssimo exemplo de que uma mistura de várias coisas conhecidas pode resultar em algo cheio de identidade, carisma e encantamento. E com uma expansão de respeito, mostra que está longe de se esgotar.

90

Monster Sanctuary

Fabricante: Moi Rai Games

Plataforma: PS4

Gênero: Metroidvania

Distribuidora: Team17

Lançamento: 08/12/2020

Dublado: Não

Legendado: Sim

Troféus: Sim (inclusive Platina)

Comprar na

[lightweight-accordion title="Veredict"]

By uniting great systems of side-scrolling, turn-based combat and generous touches of a good RPG in the best pixel art style, Monster Sanctuary is a beautiful example that a mixture of several known things can result in something full of identity, charisma and enchantment. And with an expansion of respect, it shows that it is far from exhausting itself.

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By uniting great systems of side-scrolling, turn-based combat and generous touches of a good RPG in the best pixel art style, Monster Sanctuary is a beautiful example that a mixture of several known things can result in something full of identity, charisma and enchantment. And with an expansion of respect, it shows that it is far from exhausting itself.

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