O gênero Metroidvania, títulos que focam em exploração não linear com mecânicas de RPG, teve um crescimento expressivo no mercado graças a vários títulos indie. Muitos deles se tornaram sucessos comerciais e, agora, também servem de inspiração para muitos novos títulos que estão chegando, entre eles, Ghost Song. O jogo tem inspirações claras em Metroid e Hollow Knight, com a adição de algumas mecânicas únicas, mas o resultado final não é ruim, mas também não atinge o mesmo nível de qualidade de suas inspirações.
Diferenciar um bom metroidvania de um ruim é uma tarefa difícil, pois partilham de vários elementos básicos e se destacam no quão bem executam algum ou vários desses elementos. A exploração é determinada pela liberdade dada ao jogador e também pela progressão dos poderes adquiridos que, gradativamente, abrem novas áreas e segredos. Uma boa exploração consiste em sempre deixar o jogador curioso por aquilo que ele pode encontrar na área seguinte e, também, em alterar sua percepção das áreas que já passou, muitas vezes oferecendo uma melhoria que anteriormente era impossível de se alcançar ou caminhos alternativos e novas áreas nesses espaços que o jogador já passou. O combate faz uso dos poderes adquiridos e também é influenciado drasticamente por mecânicas de RPG que cada título pode ter como equipamento, magia, stamina, etc. Um bom combate é muitas vezes acompanhado por um bom desafio na forma de chefes e inimigos com padrões de ataques interessantes, uso inteligente das mecânicas e/ou builds que o jogador pode montar para conquistar um obstáculo.
Ghost Song tem todas as características inerentes ao seu gênero e algumas idéias próprias que são bastante interessantes, mas suas principais fraquezas estão na falta de elementos modernos que são esperados do gênero atualmente e a falta de um polimento em todos os demais aspectos. Isso resulta em uma experiência, em momentos, ótima, mas que gradativamente vai revelando seus problemas e não consegue manter sua qualidade durante toda sua duração.
A história do título começa com uma Deadsuit acordando de maneira repentina e, sem razão alguma, começa a explorar o local que se encontra. Após explorar um pouco, logo encontra uma nave que fez um pouso forçado no planeta e os poucos sobreviventes do acidente. Novamente, sem grandes motivos, a Deadsuit se voluntaria a explorar o planeta por peças que possam consertar a nave e ajudar os sobreviventes a escapar do planeta. Encontrar essas peças é a força motriz da história e uma que, particularmente, fiquei sem entender absolutamente nada.
Cada sobrevivente, usualmente, fala um pouco sobre si próprio e da situação em que se encontram. Existem outras pessoas nesse perigoso planeta e cada uma é um pequeno pedaço de história que se resolve em 2 ou 3 encontros. Não há dicas ou registros para onde essas pessoas vão ou das condições que aparecem, então é deixado para o jogador descobrir absolutamente tudo. Muitas vezes, você vai tropeçar com algum personagem, ele vai falar algo enigmático que, teoricamente, serve de dica para continuar sua história e vai sumir. Não há registro ou qualquer indicação que possa ajudar o jogador caso esse esqueça do conteúdo das conversas.
A forma de se contar a história é semelhante a Hollow Knight, no entanto, eu nunca cheguei num ponto que minhas perguntas foram propriamente respondidas. É possível que exista um final alternativo que tivesse respondido tudo, mas também fiquei sem pistas sobre o que e onde procurar. O final que obtive certamente finalizou a história, mas de maneira bastante superficial e insatisfatória. O destaque da história fica pela escrita e pela atuação por voz em inglês, ambos tão sem alma e tediosos que certamente vão permanecer na memória.
As mecânicas de Ghost Song para exploração e combate são bem construídas, mas que nem sempre estão bem balanceadas ou que, no conjunto do todo, fazem sentido. Uma das melhores mecânicas está no canhão da Deadsuit que gradativamente aquece conforme são feitos disparos. A alta temperatura faz com que a cadência de tiros diminua, no entanto, aumenta o poder de seus ataques físicos. Uma vez que o jogador fica um pouco tempo sem atirar, o canhão esfria e retorna ao seu estado normal. Isso traz uma dinâmica, bastante interessante, que força o jogador a alternar entre o canhão de longa distância e ataques físicos de curta distância. Essa dinâmica acabou perdendo sua razão na metade do jogo para frente, quando ataques físicos se tornaram drasticamente mais fortes que ataques de longa distância e puderam ser facilmente abusados com alguns dos equipamentos certos.
A customização da Deadsuit seria um dos pontos altos, mas cujas limitações acabam não incentivando o jogador a experimentar com diversos tipos. Existem dois tipos de equipamento: armas de canhão, físicas e módulo. A Deadsuit pode equiper somente uma arma e há uma boa variedade de armas espalhadas pelo jogo com características bem distintas de jogo. As armas de canhão e os módulos, no entanto, podem ter vários equipados simultaneamente, no entanto, todos consomem do seu limite de energia. As armas de canhão são funções alternativas para seus ataques de longa distância e os módulos funcionam, principalmente, para alterar as mecânicas básicas como aquecimento, status, dano, pulos, etc. A Deadsuit consegue uma capacidade maior de energia conforme evolui de nível e este é o básico visto em RPGs: derrotando inimigos e chefes e carregando sua experiência até um local no mapa para evoluir. Caso morra, a experiência fica no local para ser coletada e perde-se caso morra novamente sem recuperá-la.
A limitação de energia acabou não me incentivando a utilizar as diferentes armas de maneira simultânea até porque ainda é necessário selecioná-las individualmente durante o combate. Os mísseis foram minha principal arma de longa distância, tornando os tiros comuns praticamente inúteis. O restante do meu equipamento foram melhorias de status, aumentos de dano físico e uma invencibilidade maior ao tomar dano. Esse último é algo necessário (e uma melhoria que, quase certeza, é dado de forma aleatória) porque a invencibilidade padrão é muito curta e permite que uma sequência de ataques derrote facilmente o jogador sem a mínima chance de revidar.
Os chefes começaram desafiadores, no entanto, gradativamente tornaram-se batalhas simples com poucos padrões de ataque e que terminaram de maneira rápida demais. Em alguns momentos, eu eliminava metade da vida do chefe antes mesmo de aparecer o seu nome. Outros módulos que utilizei foram para ajudar a exploração como pulo adicional, menor consumo de stamina ao correr, entre outros. Esses últimos, poderiam ser habilidades passivas e permanentes ao invés de algo que você deve ligar/desligar conforme necessário.
A exploração libera o jogador para buscar as peças da nave na ordem que bem entender, mas há uma recomendação da primeira que se deve ir atrás. De fato, mesmo tentando bastante ir para as demais peças no início, acabei chegando na peça recomendada devido a vários caminhos inacessíveis pela falta de poderes. O jogo certamente “afunila” o jogador em seus ambientes já que cada região é quase que uma área isolada por si própria e com poucas conexões com as demais. Essas áreas, usualmente, tem um formato circular para que o jogador saia da área rapidamente uma vez que chegue a seu cenário mais profundo. A razão principal disso é que cada peça precisa ser carregada manualmente de volta para a nave, fazendo deste um retorno por cenários bastante tedioso, pois não contém nenhuma novidade exceto inimigos novos que servem somente para atrapalhar o retorno e torná-lo mais inconveniente do que já é.
Inconveniência também é algo que permeia quase todos os pontos de Ghost Song. Os save points, denotados por plantas luminosas no mapa, muitas vezes estão bem distantes um do outro e isso torna a experiência particularmente tediosa caso se morra em um cenário muito afastado desses. O level-up da Deadsuit e a função de teletransporte entre cenários se dá por robôs que se parecem bastante com as estátuas Chozo de Metroid. Novamente, são poucas no cenário e posicionadas de modo bastante irregular a ponto que o teletransporte e evolução tornam-se luxos pouco utilizados. A grande maioria dos save points não tem um desses robôs próximos, portanto, é bem provável que o jogador ande longos trechos de cenário sem poder assegurar seus ganhos ou que se torne uma tarefa constantemente tediosa de retornar a esses pontos para então retomar a exploração. Outros problemas estão no mapa que não permite um zoom adequado e também não contém detalhes ou informações sobre onde o jogador pode ter perdido ou não notado algo.
Esses são exemplos do porque Ghost Song falha em alcançar um patamar de excelência, seus elementos individuais constantemente entram em conflito. Você tem mecânicas funcionais de exploração e que podem ser expandidas por módulos, mas o mapa simplório muitas vezes não suporta e não incentiva tal exploração. O combate tem grandes possibilidades de customização, mas a evolução do arsenal, módulo e status faz com que grande parte não seja necessário. A baixa variedade de inimigos interessantes e, principalmente, a falta de chefes com padrões desafiadores também faz com que o combate nunca se realize de maneira apropriada, especialmente nas partes finais do título que você está muito mais forte do que qualquer inimigo que possa encontrar.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Humble Games.
Veredito
Ghost Song não é uma experiência ruim, mas uma que mostra brilhos de excelência sem os realizar completamente. Com tantos títulos metroidvania no mercado atualmente e vários deles com experiências mais polidas, é difícil recomendar Ghost Song.
Ghost Song isn’t a bad experience, but one that shows glimmers of excellence without fully realizing it. With so many metroidvania titles on the market today and with more polished experiences, it’s hard to recommend Ghost Song.
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