G.I. Joe: Wrath of Cobra – Review

Por mais que eu tenha crescido, lá nos anos 1980/1990, respirando algumas das animações americanas e japonesas mais clássicas exibidas na TV aberta, como Thundercats, Cavaleiros do Zodíaco e He-Man, nada é mais icônico desse período que os Comandos em Ação, não só pelas aventuras no campo audiovisual, mas também e principalmente pelos brinquedos, tão desejados pela minha geração como a máxima expressão do desejo em se parecer com aqueles caras durões que encaravam qualquer problema com o bom e velho poderio militar estadunidense à disposição.

Outros tempos, claro, quando tudo parecia (ou nos era vendido) muito mais maniqueísta do que aprendemos depois, quando aí sim nos familiarizamos melhor com o nome original daquela franquia: G.I. Joe. Os anos se passaram, a marca se renovou na TV, nos cinemas e em outras mídias, e nada mais nostálgico do que poder experimentar G.I. Joe: Wrath of Cobra, um típico beat ‘em up propositalmente criado para emular o que havia de mais divertido para o mesmo público-alvo daquela época, agora, décadas depois.

G.I. Joe: Wrath of Cobra

O resgate saudosista, porém, não está só na apresentação visual ou nas mecânicas do game, mas em toda a sua essência. Isso inclui cinemáticas cuidadosamente pensadas para emular o tipo de animação tão popular naquele período, com traços duros, animações pouco fluidas baseadas em quadros-chave, histórias da eterna batalha entre mocinhos e vilões, e um certo tom canastrão tão característico que o tempo todo conta com frases de efeito, ameaças megalomaníacas e planos mirabolantes.

A história do game, que envolve dominação mundial, clonagem atrapalhada e outras peripécias do perigoso Cobra, é exatamente aquilo que se espera dela: nenhum evento muito importante e poucos detalhes dignos de nota. Nada precisa ser dito para que, como bons soldados norte-americanos, saiamos espancando as hordas inimigas sem dó ou piedade. Na pele de um de quatro dos personagens mais icônicos dos desenhos animados (Duke, Scarlett, Roadblock, Snake Eyes), com a possibilidade de liberar outros mais adiante, não há limites para a porrada.

G.I. Joe: Wrath of Cobra

Porém, esperar pouco da trama não significa que a falta de qualquer fio narrativo minimamente interessante não seja um problema, mesmo para quem não se importa em saber o que está acontecendo. Ninguém pede um roteiro sofisticado ou aprofundamento de uma lore dramática, mas mesmo que se espere o episódio bobo da semana, com uma ideia horrorosa dos Cobra e estratégias estapafúrdias dos Joes para frustrar seus arqui-inimigos, aqui não há nada que se compreenda minimamente como um fiapo de história. É um vazio completo de ideias permeado por cut-scenes engraçadinhas. E olhe lá.

Batendo de frente com inimigos como Destro, Serpentor, Baroness e o próprio Comandante Cobra, que assumem aqui o esperado papel de chefes de fase, além de centenas de guardas Crimson mascarados e suas variações, a proposta não é diferente do que já vimos antes: com ataques variando entre os rápidos e os fortes compondo combos simples, comando de salto, corrida com golpe carregado, defesa (com possibilidade de contra-ataque no tempo certo) e o inevitável especial apelão a ser carregado. Com uma rápida adaptação, qualquer pessoa que já tenha experimentado qualquer um dos expoentes do gênero, como Double Dragon, Final Fight ou Streets of Rage, estará completamente confortável aqui.

G.I. Joe: Wrath of Cobra

O modelo de progressão é, portanto, tão óbvio quanto o esperado: siga adiante, enfrente o grupo de inimigos de um certo trecho do cenário fechado em si, e siga para o quadrante posterior quando todos tiverem sido sumariamente derrotados para repetir a ação. Simples, direto, pouco inventivo, mas bastante efetivo. Só não espere encontrar frangos assados ou cachorros-quentes dentro de barris, algo substituído por um elemento mais identificável (e sem graça) de recuperação de barra de energia dentro de caixotes destrutíveis.

É possível ainda encontrar fuzis, lança-granadas e outras armas de fogo escondidas dentro destas caixas providencialmente espalhadas pelo caminho, já que nem todo inimigo que carrega esses equipamentos é tão generoso em deixa-los no chão quando derrotados. Como nada é só tranquilidade, os trajetos também guardam várias armadilhas, como buracos, fios desencapados, bombas e outros perigos pouco convidativos. A soma se tudo isso, claro, significa que ao iniciar G.I. Joe: Wrath of Cobra, você vai encontrar absolutamente tudo o que espera de um jogo do gênero.

G.I. Joe: Wrath of Cobra

Isso significa jogar como antigamente, e experimentar visuais e elementos sonoros daqueles tempos menos complicados. Com a trilha claramente inspirada na geração 16 bits, tal como em TMNT Shredder’s Revenge, Streets of Rage 4, o jogo encontra o equilíbrio entre a emulação das limitações de décadas atrás com algumas facilidades dos dias atuais, impondo toda uma dinâmica noventista de progressão embalada pelo ritmo acelerado de ação quase ininterrupta de pura urgência que se apropria dos temas originais de uma forma satisfatoriamente orgânica.

O mesmo acontece com os visuais bidimensionais que demonstram um cuidado bastante interessante em traduzir para o estilo pixel art os conceitos, personagens, inimigos e situações reconhecíveis, sem que essa releitura se torne proibitiva para um novo público que ou conhece a marca por produtos mais recentes, ou realmente nunca se importou tanto assim com ela. Situações e temas são fiéis, mas exigem pouco ou nenhum conhecimento prévio para fazerem sentido assim que o quebra pau se inicia. O resultado são cores vibrantes, mas pouca personalidade.

G.I. Joe: Wrath of Cobra

E, por consequência, a maior força de G.I. Joe: Wrath of Cobra é muito provavelmente sua maior fraqueza também. De tão comprometido em representar o que há de mais icônico no gênero, o resultado é um jogo absolutamente genérico e sem qualquer tempero que o destaque em relação a dezenas de outros similares disponíveis no mercado atual, sobretudo no cenário de produção independente. Ao contrário, sem nenhum tipo de risco, é um jogo, enquanto proposta, inferior a qualquer uma de suas referências, mesmo com a tecnologia e as décadas de amadurecimento da indústria a seu favor.

O modelo de gameplay, por exemplo, é eficiente e traz um bom ciclo de repetição, aprendizagem de timing e proposta de prática para a masterização. Mas ao mesmo tempo, apresenta um hitbox cheio de inconsistências, fases demasiadamente alongadas, desequilíbrio entre inimigos e um cansaço evidente na fórmula, mesmo permitindo variar entre os protagonistas dentro da mesma campanha, incluindo os dois desbloqueáveis. Em outras palavras, usar os mesmos tipos de combos acaba enjoando, mesmo em uma campanha que dura, na dificuldade normal, não mais que três horas bem jogadas.

G.I. Joe: Wrath of Cobra

Outro problema está na repetição temática de situações, com muitas coisas requentadas, ambientes medíocres e cenários pouco inventivos. Uma rápida olhada nas capturas que ilustram esta análise basta para saber que são as mesmas construções, ruas e vielas pelas quais já passamos uma infinidade de vezes em outros jogos. A galhofa militarista tão divertida vista antes não se traduz no game, e mesmo uma ou outra passagem mais inspirada ainda parece vaga, fútil e pouco interessada em traduzir para os videogames tudo o que há na herança simples, mas rica da marca G.I. Joe.

Este olhar mais crítico sobre a obra, entretanto, é absolutamente relativo, sobretudo quando se tenta encontrar algo para além do que ele se propõe. Não há, claramente, qualquer intencionalidade em criar algo novo ou sequer explorar as nuances desse tipo de dinâmica que vá para além de se parecer (demais) com as coisas que o público-alvo certamente já gosta. Sintoma disso está nas opções complementares e desbloqueáveis, todas voltadas a acrescentar um modificador diferente, como o One-Hit Kill ou modos só contra chefes, que visam dobrar a aposta, aumentar a dificuldade e reofertar tudo de novo, só que de forma mais desafiadora.

G.I. Joe: Wrath of Cobra

O jogo perde ainda mais pontos com uma interface descuidada, com menus desleixados e que pouco dialogam com a identidade visual do projeto. Se a HUD tem a essência de um bom beat ‘em up, o que há fora da mise-en-scene é tosco e parece ter sido feito às pressas por pessoas diferentes daquelas que desenharam todo o resto. Piora o fato de que a localização para o português brasileiro por texto e legendas é desengonçado e, em muitos casos, até fica fora da caixa de diálogo, provando que a obra obviamente foi feita para o idioma original e sequer tem ajustes para os demais. É constrangedor.

Completa o pacote de problemas alguns bugs de desempenho e outros travamentos estranhos, além de inimigos com comportamentos bizarros (alguns chefes parecem não ter movimentos de ataque e os que tem são absolutamente tapados), ambas coisas comuns em conteúdos pré-lançamento que normalmente são corrigidas com alguns updates simples e relativamente imediatos, mas como o jogo já está disponível para PCs há algumas semanas, espera-se que as correções sejam disponibilizados antes mesmo de um prometido suporte pós-lançamento com conteúdos complementares. Ou seja, na data de lançamento, as coisas devem (e precisam) estar mais estáveis.

G.I. Joe: Wrath of Cobra

G.I. Joe: Wrath of Cobra é, essencialmente, um jogo de contrastes. Se por um lado, consegue criar uma relação óbvia e direta entre marca e gênero de época, o que significa ser coerente enquanto proposta, ele acaba se tornando refém de si mesmo ao se dispor a ser só um típico beat ‘em up saudosista. Funciona, é divertido, desafia o jogador na medida certa sobretudo nos níveis de dificuldade mais elevados ou com modificadores ativados, mas se esforça muito pouco em criar uma identidade própria, mesmo com um material de base tão poderoso em ser único em suas generalidades.

Melhorando muito quando aproveitado em mais jogadores de sofá – são permitidas até quatro pessoas ao mesmo tempo – é um game honesto e sem ganância, o que poderia ser um elogio não fosse concorrente de tantas coisas boas e mais ousadas tanto oriundas de um passado não tão distante assim quanto de produções mais recentes que respeitam o legado permitindo-se dar passos adiante. Seria ótimo que os desenvolvedores se apoiassem um pouquinho mais nas ambições de seus vilões e ousassem fazer algo mais surpreendente. Afinal, quem aposta só no que é seguro dificilmente vai conquistar o mundo.

Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela indie.io.

Veredito

G.I. Joe: Wrath of Cobra é, definitivamente, um beat’em up funcional e, por algum tempo, bastante divertido, mesmo sendo extremamente genérico. Apropriando-se de todas as principais convenções do gênero, porém, é medíocre ao trabalhar mal a sua história risível, é cansativo e repetitivo sobretudo jogando-se no single-player e infelizmente aproveita pouco a base da franquia que lhe empresta o título.

55

G.I. Joe: Wrath of Cobra

Fabricante: Maple Powered Games

Plataforma: PS5

Gênero: Beat'em Up

Distribuidora: indie.io

Lançamento: 21/11/2024

Dublado:

Legendado: Sim

Troféus: Sim (inclusive Platina)

Comprar na

[lightweight-accordion title="Veredict"]

G.I. Joe: Wrath of Cobra is definitely a functional beat’em up and, for a while, quite fun, even though it is extremely generic. It uses all the main conventions of the genre, but it is mediocre and poorly works its laughable story, it is tiring and repetitive, especially when playing in single-player and unfortunately it takes little advantage of the foundation of the franchise that lends it its title.

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