Fairy Tail 2 – Review

Julgar um título licenciado é sempre cheio de suas próprias armadilhas. Afinal, o lançamento de um jogo baseado em uma IP já consagrada se dá não só pela consciência de que há uma base de fãs pré-estabelecida interessada, mas com a responsabilidade de entregar um título fiel ao material-fonte e que ainda assim tenha um nível de qualidade equivalente ou até melhor.
Essa última parte tem sido, historicamente, o grande erro em jogos licenciados. Embora eles tenham diminuído de frequências nas últimas gerações, pelo menos em termos de marketing e atenção (ainda que silenciosamente presentes atualmente), os poucos grandes lançamentos que tem ocorrido parecem estar colocando uma ênfase maior em qualidade, com maior cuidado e fidelidade pensando primeiro nos fãs ao invés de só fazer uma grana rápida surfando no marketing de algum projeto maior em outra mídia.
Um dos melhores exemplos disso nos últimos anos foi o lançamento do primeiro Fairy Tail, um RPG desenvolvido pela Gust e publicado pela Koei Tecmo. Talvez não tão acessível para novatos ou jogadores que tenham caído no projeto sem entender que bulhufas é uma guilda de magos ou cujo conhecimento da calejada desenvolvedora japonesa se restringisse a crescente popularidade de Atelier Ryza (FT foi lançado entre os dois primeiros jogos da trilogia) e tenham se assustado com orçamento limitado por trás da adaptação de um dos melhores e mais queridos shonens das últimas décadas.
FT foi um casamento perfeito nos olhos de um fã mais apaixonado da série. Afinal, um RPG envolvendo a vasta e variada guilda de magos é um casamento bem intuitivo, dado o quanto trabalho em grupo entre os heróis para enfrentar uma ameaça gigantesca é parte fundamental do mundo criado por Hiro Mashima, talvez até mais do que outros shonens onde os heróis parecem brigar tanto entre si sobre quem é o melhor quanto contra seus adversários. Uma sequência abordando os demais arcos da história, dado o sucesso do jogo original, era de se esperar e ela finalmente está aqui.
Fairy Tail 2 foca então no que é visto como o arco final do anime/mangá original (que, como sempre, acabou tendo uma sequência na forma de Fairy Tail: 100 Years Quest), o Alvarez Empire Arc (ou só Alvarez). O jogo começa pouco depois do epílogo do primeiro jogo, então as histórias acabam sendo bastante conectadas. Assim, salvo se você tiver assistido todo o anime ou esteja familiarizado com os personagens, é difícil começar direto dessa sequência, já que ela assume que o jogador tenha um conhecimento considerável do que aconteceu até aqui.
A narrativa em si é uma reinterpretação dos eventos da obra original, sendo bastante fiel aos seus acontecimentos passo a passo. Enquanto o jovem Natsu Dragneel ainda é o protagonista central da trama, o jogo te permite assumir o controle de seu personagem favorito na jornada da guilda Fairy Tail em sua batalha para salvar o mundo contra uma invasão do Império Alvarez, uma força militar letal que mal está sendo contida pelo Conselho da Magia graças ao enorme poder da guarda pessoal do Imperador Spriggan, conhecidos como Spriggan 12.
Por trás da invasão e dos Spriggan 12 está Zeref, visto como não só um usuário de magia extremamente perigoso e poderoso, mas o mago mais maligno que já andou pelo mundo. Comandando não só um vasto exército, mas um grupo de guerreiros capazes de, supostamente, destruírem continentes por si só, Zeref é a ameaça definitiva da saga Fairy Tail, mas não a única desse arco, com alguns antigos e novos inimigos procurando uma oportunidade para usarem o caos da guerra em seu favor.
O quanto você enquanto jogador irá aproveitar da história, com toda sinceridade, depende do grau de investimento que você já teria com Fairy Tail por si só. Reviver alguns dos momentos mais icônicos da franquia, especialmente quando se é fã dela, traz um grau de diversão considerável por si só e, mesmo os jogadores que a conheceram através do primeiro jogo se engajaram na narrativa. O problema fica pelo fato de que, tal qual reviver os ápices que Alvarez traz, ele também vem consigo alguns dos problemas que a narrativa original já trazia, então não espere mudanças aqui.
Dito isso, embora não mude nada da estrutura principal, Fairy Tail 2 traz missões secundárias e cenas extras exclusivas do jogo que ajudam a expandir em uma das maiores qualidades da obra de Hiro Mashima: seus personagens. As interações entre o grupo são excelentes e o fato de grande parte das cenas serem in-game, sem se apoiar no bom e velho estilo de visual novel, ajuda a demonstrar isso já que os movimentos exagerados são parte das diferentes personalidades demonstradas aqui.
A principal evolução vista em FT2 fica por conta do seu sistema de combate. Por mais “barata” que seja a comparação, a sensação que se tem é de um salto bem similar ao dado entre Atelier Ryza: Ever Darkness & The Secret Hideout e Atelier Ryza 2: Lost Legends & the Secret Fairy, com um sistema de combate que exige um pouco mais de planejamento em tempo real e o uso de combos mesmo mantendo suas raízes como um combate por turnos.
O sistema de menus não está mais presente, agora substituído por sistema baseado em comandos com cada personagem tendo ataques mapeados para um dos quatro botões de face do controle (até um limite de oito graças a adição do modificador de R1 + X, Quadrado, Círculo ou Triângulo). O ataque básico fica mapeado para Quadrado e, ao atacar repetidamente com ele, você irá acumular SP que serve como “combustível” para usar ataques mais fortes, além da possibilidade de defender ataques usando L1.
Acumular o máximo de SP possível é fundamental para conseguir usar combos maiores já que, a cada uso, as habilidades vão aumentando a quantidade de SP consumido e atacar com esses ataques mais fortes é fundamental para reduzir a Break Gauge (essencialmente uma barra de defesa) dos inimigos. Ao fazê-lo, não só você poderá usar link attacks poderosos com seus aliados que ajudam a continuar a reduzir a barra ou causar mais dano ao HP deles, mas, subirá o seu Fairy Rank, o que aumenta o poder dos seus golpes e a quantidade de SP que você consegue armazenar e, ao zerar o medidor, destrava poderosos ataques supremos chamados de Unison Raids, também executados com seus aliados.
O lado estratégico fica não só na questão do gerenciamento de recursos para usar os ataques certos (algo que pode se tornar mais fácil ao atacar inimigos em campo e começar com a iniciativa., mas no fato de que você só tem controle direto sobre um dos membros da Fairy Tail, com os outros 2 (a party ativa é composta por três membros) sendo controlados por IA. O jogador tem liberdade para alternar entre o personagem ativo rapidamente, com o direcional para cima e para baixo alternando entre os membros ativos e L2 te dando acesso à possibilidade de trocar por um dos membros na reserva.
Alternar entre os personagens é fundamental. Apesar da IA ser decente, ter controle direto permite ao jogador usar melhor em seu fato o fato de cada habilidade ter diferentes propriedades, com alguns causando mais dano à Break Gauge, outros ao HP, além de habilidades de cura e buff/debuff, além de seus próprios efeitos elementais. Então, contra inimigos fracos contra fogo, é melhor ter Natsu como seu principal atacante, enquanto fraqueza contra gelo vai te exigir mudar para Gray, enquanto vento já é mais do escopo da Wendy e por aí vai.
O sistema de progressão também é bem intuitivo, com cada personagem ganhando pontos de ether ao subir seu Origin Rank. Esses pontos então podem ser usados para comprar novas habilidades em uma de três árvores de habilidades, cada uma com um foco diferente. Ao todo, são 66 nódulos a serem desbloqueados, alguns mais voltados para buffs de estatísticas (por exemplo, +5% de HP ou DEF), outros desbloqueando novas habilidades ou melhorando suas habilidades ativas. Não há muita customização (cada árvore tem dois ou três “braços”, mas você pode alternar entre eles livremente e irá desbloquear todos no fim das contas), mas a liberdade de priorizar o que quiser é bem-vinda.
Se há algo a se reclamar de Fairy Tail fica muito por conta da parte técnica do jogo. Embora seja uma clara evolução em relação ao jogo anterior, com áreas mais amplas para se explorar, mais itens a se encontrar e mais inimigos espalhados pelo campo, com a batalha acontecendo no mesmo lugar em que você encontrar com ele, o jogo ainda é visualmente bem limitado. Algumas das limitações vem do próprio material original, com o Hiro não sendo exatamente tímido em reusar designs, algo visto aqui com monstros retornando do jogo anterior com o mesmo design, mas o problema fica pelo fato dos modelos não serem tão bonitos assim.
Dito isso, os modelos dos personagens humanos são bem bonitos e a qualidade da dublagem e trilha sonora merecem elogios. No entanto, fica claro que o jogo teve um orçamento bem limitado, não chegando, por exemplo, no nível de qualidade visto nos Atelier mais recentes, com algumas animações dos monstros também sendo bem esquisitas. Novamente, algo que não é visto nos heróis, já que as animações e efeitos dos golpes, por exemplo, são bem vistosos.
No frigir dos ovos, Fairy Tail 2, até mais do que o original, é um jogo feito para fãs da franquia. É uma sequência que mantém o espírito que tornou o primeiro jogo um sucesso e é difícil não elogiá-lo, mas algumas mudanças deverão dividir os fãs, como a alteração do sistema de combate, e as limitações técnicas limitem o êxito do título como um todo. Ainda assim, como fã da série, é inegável que ele faz jus ao que os fãs da obra podem esperar e querer.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Koei Tecmo.
Veredito
Fairy Tail 2 é um bom RPG que adapta de forma excelente os acontecimentos do arco final do mangá/anime. Trata-se de um prato cheio para os fãs com seu bom sistema de combate e boa representação dos personagens, ainda que suas limitações técnicas travem o potencial do jogo.
Fairy Tail 2 is a good RPG that excellently adapts the events of the last arc of the manga/anime. It’s a real treat for fans with its good combat system and good character representation, although its technical limitations hinder the game’s potential.
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