Desde o lançamento do primeiro Destiny lá em 2014, a promessa era a de que uma verdadeira revolução estava chegando, a de jogos que durariam anos, quem sabe gerações, passando por retroalimentação constante e incrementando conteúdos de forma contínua e com potencial virtualmente infinito. Não seria a primeira vez que isso seria oferecido, claro, mas seria diferente. Se as promessas foram cumpridas naquele momento? Não sei. Mas 8 anos depois, já na segunda iteração da franquia, tenho a percepção de que finalmente estamos deslumbrando a realização sólida de tudo isso. Destiny 2: A Bruxa-Rainha (ou do original The Witch Queen), que se soma a algumas tantas expansões anteriores, oferece substância, densidade e abre novas janelas para o universo de uma franquia que até então parecia mais incrível no papel do que aquilo que já tinha sido mostrado.
Sim, começo esta análise pela sua conclusão, porque no final das contas, a minha pergunta desde o anúncio da expansão até este exato momento era: afinal, Destiny 2 se mantém relevante com todas essas adições ou tudo isso não passa de uma coleção de remendos para engordar o tempo de campanha e a oferta de armas e cenários para os modos multiplayer? Talvez eu não tenha uma resposta definitiva, se é que há uma, mas enquanto consumidor, tenho me sentido bastante impactado positivamente com esses novos conteúdos, mesmo que o modelo comercial seja algo para um debate à parte. Se estamos já acostumados, nesta indústria vital, aos formatos mais convencionais de DLCs, passes de temporada, edições definitivas e todos esses artifícios, o que há de tão especial em Destiny 2?
Antes de mais nada, há uma sensação de crescimento exponencial do universo conhecido, e dentre todos os grandes conteúdos, A Bruxa-Rainha é provavelmente o mais relevante nesse sentido desde… bom, desde sempre. Enquanto campanha – que uma vez mais pode ser vivida de forma solo em sua quase totalidade ou sempre acompanhado de mais pessoas – há uma densidade de conteúdo que se mostra algo muito maior do que uma grande sidequest como é comum em outros jogos. A história está sendo contada, levando-nos adiante, e não funciona somente como um crescimento lateral, e a personagem do título é só a ponta do iceberg de algo muito maior, mais instigante e que transforma inclusive como jogamos e como ressignificamos tudo o que veio antes.
Em outras palavras, essas mudanças trazem consequências não só para o aprofundamento das relações entre personagens, bem como problematiza certezas já estabelecidas e, de quebra, traz novas mecânicas muito bem justificadas. A primeira delas, uma das mais esperadas pela comunidade, é a possibilidade de finalmente criarmos armas nós mesmos em um sistema de forja, e essa nova funcionalidade não só tem suas bases na narrativa como ainda é apresentada ao exigir a criação de uma arma inicial que inaugura uma nova categoria, a dos Gladios, equipamentos com grande poder de fogo e que traz um timing de ação diferente daquilo que já estávamos acostumados. A necessidade de se coletar e gerenciar recursos se torna algo ainda mais interessante do que o já complexo sistema comercial do jogo. Mesmo que demore para termos conhecimento e materiais para criação diversificada das mais diferentes armas, é uma ótima melhoria.
Também há um novo item, a Lança Sináptica, que recebemos logo na introdução dessa nova aventura, que permite que alguns pontos de melhoria sejam aplicados a certos aspectos, lembrando a árvore de habilidades de alguns RPGs mais convencionais, o que não chega a ser um deslumbre de profundidade, mas ao se somar com todas as modificações a serem implementadas em armas e armaduras, compõe um mosaico cheio de nuances para cada vez mais destacar o nosso personagem de qualquer outro. Há também uma série de perfumarias e apetrechos puramente estéticos que continuam, como cores e modificadores de aparência, e cada detalhe a mais só incrementa – e talvez essa seja a regra estabelecida para o produto – aquilo que já existia, sem desmerecer o que tinha vindo antes.
Outro ponto muito interessante para o gameplay é a possibilidade de inimigos se apropriarem da Luz para seus próprios objetivos, incluindo a posse, a sua maneira, de Fantasmas. Velhos fãs da franquia já imaginam o que isso significa em termos conceituais, e o que esse detalhe pode significar para o conhecimento da elite dos guardiões que se entendiam privilegiados, quase que divinamente iluminados, por serem detentores da Luz. Para não entrar em spoilers, os motivos disso eu deixo para vocês descobrirem, mas importante destacar que isso muda muito alguns aspectos de abordagem dos combates. Por exemplo, uma vez que eliminamos um portador de um Fantasma inimigo, é necessário destrui-lo antes que ele reviva nosso inimigo caído. Parece óbvio, mas as vezes isso muda tudo.
Isso porque aqueles guardiões que gostam do combate a distância, principalmente ao enfrentar grandes hordas, deverão se planejar bem para aproximações estratégicas, já que quebrar um Fantasma é algo que se faz somente os esmagando com as mãos em um comando de finalização. Certa vez, percebi que não adiantava muito focar forças em chefes e ignorar soldados comuns simplesmente porque ao ser obrigado a caminhar para o centro da ação, ficamos vulneráveis. Como há um tempo para essa eliminação final, não há tantas opções assim. Saber quando e como lutar contra esses inimigos especiais para evitar que eles voltem com a barra de vida completa melhora, e muito, a necessidade de abordagens mais estrategicamente planejadas. Se você é um grande sniper, repense. Isso pode não ser mais suficiente.
Uma adição que me pareceu um pouco deslocada, porém, traz a resolução repetitiva de puzzles bastante simples para acesso a uma certa área especial muito significativa no entendimento do enredo. Não que seja ruim ou especialmente desagradável, só fora de contexto mesmo. Em contrapartida, há uma nova habilidade de se revelar objetos, passagens e plataformas escondidas para se chegar a pontos especiais do mapa que é muito bem-vinda e, também acessível por gradações, garantem mistérios a serem encontrados por muito tempo. Além disso, felizmente há muito menos repetição daqueles padrões de defesa de território, como as constantes missões onde você manda seu Fantasma fazer algo que leva tempo e precisa se virar enquanto isso.
As missões de campanha, aliás, são bastante longas – evite entrar em qualquer uma delas se estiver dispondo só daqueles 15 minutos de bobeira e só entre quando for jogar à vera – e oferecem uma diversidade interessante, com boas revelações. Ainda que não fujam muito dos princípios básicos do “vá até um lugar, elimine os soldados rasos, derrube sub-chefes e derrote o chefão”, o contexto funciona melhor sobretudo na forma como isso deve ser feito. A nossa relação com Savathûn é realmente especial, com encontros constantes. Considerando o trecho final da nova campanha, é o melhor e mais diversificado enfrentamento de chefe da franquia até então, e possivelmente um dos mais marcantes da história recente dos jogos de gênero. O mesmo vale para as novas áreas livres para exploração, que se diferenciam das demais até no sentido da ambientação, mesmo que a pouca diversidade dos eventos públicos e das patrulhas acabe se tornando, em algum momento, repetitiva e previsível.
Nunca escondi que as passagens que mais me incomodavam em Destiny, enquanto franquia, eram as de plataforma, mas isso sempre foi algo muito mais de sensação pessoal do que um aspecto técnico em si. Ainda que sejam momentos mais pontuais, eles continuam presentes em A Bruxa-Rainha, principalmente na transição para grandes áreas de confronto. A boa notícia é que nunca chegam a se tornarem demasiadamente extensos a ponto de se mostrarem incômodos para quem não gosta ou não se importa com eles, nem trazem uma obrigação de grande precisão em saltos de longa distância. Se você é daqueles que tem dificuldade de se localizar espacialmente nos jogos em primeira pessoa, pode cair numa escalada aqui ou numa arena cheia de abismos ali, mas nada que seja um entrave de verdade.
Quer mais uma ótima notícia? Se você é daqueles que jogou Destiny 2 lá na época do seu lançamento, ou mesmo se o pegou quando ficou gratuito na PSPlus, ou ainda tomou coragem quando ele foi liberado gratuitamente para todo mundo, mas depois de fechar a campanha base acabou deixando o jogo de lado, a nova expansão é bastante convidativa ao não obrigar que se tenha jogado as anteriores. Primeiro e mais importante, porque ela basicamente nivela todo mundo para cima, deixando equipamentos todos padronizados para estatísticas a 1350 pontos – e consequentemente elevando o nível principal de luz do seu guardião para esse patamar. Isso significa que quem quiser voltar para a franquia agora, mesmo pulando o que veio nesse meio tempo, pode. Segundo que a narrativa funciona de forma independente, ainda que seja inevitável notar lacunas.
Para chegar ao final da trama, o jogador deverá evoluir a partir daí, e vai enfrentar as missões finais na faixa dos 1510 pontos de luz. Achei um pouco estranho que até chegar aos 1500 a coisa flui muito tranquila, com inimigos dropando equipamentos e armas de forma generosa e sempre avançando aquilo que se tem em mãos. A boa e velha funcionalidade de desmontar coisas novas para elevar as estatísticas daquilo que já tínhamos também facilita bastante, e em duas ou três horas eu já estava com meus equipamentos antigos lendários ou exóticos upados para o máximo. Claro que as novas armas – encontradas, oferecidas como prêmio ou fabricadas – acabam ganhando destaque, mas há um ou outro elemento que eu mantive do que já tinha desde a versão original do jogo graças a essa capacidade de atualização contínua.
Ao alcançar itens nesse ponto, porém, começa a ficar raro encontrar elementos melhores, algo que já se tornou um padrão há uns 2 anos. É como se 1500 fosse um teto e a partir daí a coisa desacelera muito, mesmo cumprindo metas recomendadas para níveis acima. Para passar de 1500 para 1513 (que foi quando parti para os finalmentes da campanha base) demorou mais do que passar dos 1350 pros 1500. Curioso, mas coerente para evitar que algumas horas a mais de loot nos tornassem poderosos demais para as batalhas finais. Claro que o pós-game mantém essa progressão, mas também com mais cadência. Felizmente para os mais dedicados e afoitos, há a possibilidade de jogar num nível de dificuldade mais elevado, aqui chamado de Lendária, que traz recompensas muito, mas muito melhores em todas as esferas. Vale o sacrifício, mas prepare-se para o desespero, já que o modo se adapta ao que você já tem para garantir o desafio elevado, seja jogando solo, seja acompanhado.
Outra mudança mais discreta, mas fundamental que pode ser notada é um quase redesign de algumas classes e sub-classes para um melhor equilíbrio entre elas, sobretudo a de Vácuo. Como um todo, há algumas adições que possibilitam não só uma maior capacidade de customização de recursos passivos e ativos, como especiais, granadas, ataques corpo-a-corpo e de suporte, como também uma melhor adequação ao estilo do jogador com algumas variáveis que podem fazer muita diferença. Ainda tenho, obviamente, meus estilos favoritos e os inimigos tremem (na minha imaginação, claro) diante o poder da minha tempestade elétrica, mas posso dizer que me senti bastante surpreso ao testar ou me aprofundar em outras variáveis elementais e curti-las antes de voltar ao meu set preferido. Aliás, contratos e novas demandas de certos NPCs antigos e novos mantém aquele incentivo em utilizar diferentes tipos de armas nos três níveis, algo que prolonga ainda mais a vida útil do título.
Por outro lado, o quesito que parece ter sofrido menos impacto é o elemento PvP. Não sou daqueles jogadores que se mantém ativo pelas arenas contra outros jogadores em Destiny 2, e talvez seja o modo (ou modos, se considerarmos as grandes categorias Crisol e Artimanha) onde menos passo tempo quando fora da campanha, mas mesmo assim, é onde parece que tudo se mantém muito igual desde sempre, delegando mudanças ao comportamento dos jogadores, a forma como encaramos as partidas contra outros guardiões e até às melhorias estratégicas que adotamos ao aprender novas habilidades que foram incentivadas ou na campanha, ou nos assaltos obrigatórios (e obviamente os alternativos que são tão legais quanto).
A sensação é que Destiny 2 se encaminha cada vez mais para valorizar uma experiência multiplayer de compartilhamento colaborativo, e o competitivo fica mesmo para um segundo plano, um bônus sem tantas expectativas. Ainda assim, bom sempre destacar que tanto junto como contra outra pessoas, a experiência continua lisa, fluida e muito confortável. Não notei nenhum problema e desempenho de rede ou algo assim jogando com outras pessoas. Pela atividade da comunidade, inclusive, encontrar outros jogadores para compartilhar missões obrigatoriamente coletivas é rápido, fácil e muito equilibrado, tal como fechar os times nas pancadarias do quem pode mais chora menos. Mesmo experimentando o jogo sem meus habituais parceiros em alguns momentos, célebres desconhecidos sempre foram companheiros (ou adversários) dignos de jornada e mesmo o jogo não sendo tão social como poderia ser, é definitivamente uma experiência que funciona muito melhor ao lado de outros guardiões.
Destiny 2 ainda tem muita lenha para queimar antes de encerrar seu ciclo de expansão para todos os lados. Não digo isso só porque há um evidente gancho final para algo maior e ainda mais revelador para os próximos anos, mas principalmente porque ele continua sendo o melhor naquilo que se propõe a fazer. Em tempos onde todo mundo procura copiar fórmulas e formatos para alcançar uma longevidade com qualidade de vida como o produto da Bungie, A Bruxa-Rainha prova uma vez mais que qualquer um que pretenda emular o sucesso da franquia vai precisar comer muito feijão pra chegar lá. Esta não só é a melhor expansão do jogo, como também é a mais encantadora, narrativamente mais interessante e aquela que tem mais sucesso em melhorar, na superfície ou na profundidade, aquilo que já era muito bem resolvido.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Bungie.
Veredito
Destiny 2: A Bruxa-Rainha amplia, melhora e refina tudo aquilo que já funciona extremamente bem, provando que esse jogo como serviço ainda está longe do esgotamento. Além disso, oferece uma nova jornada envolvente, revelações importantes e um ponto de virada que só faz crescer a promessa pelo que mais vem adiante.
Destiny 2: The Witch Queen expands, improves, and refines everything that already works extremely well, proving that this game as a service is still far from exhaustion. Moreover, it offers an engaging new journey, important revelations, and a turning point that only builds on promise for what lies ahead.
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