Crash Bandicoot retorna ao mundo dos games após quase uma década de hiato. A Vicarious Visions, em parceria com a Activision (e um empurrãozinho da Sony), trouxe a coletânea N.Sane Trilogy, com o remaster dos 3 primeiros games do marsupial, originalmente desenvolvido pelo estúdio criador do mascote: Naughty Dog.
Para quem não conhece, o gameplay consiste basicamente em um game de plataforma 3D, no qual controlamos Crash por telas lineares com o objetivo de chegar ao final, pegando as Wumpa Fruits, destruindo caixas e inimigos pelo caminho, fugindo das caixas Nitro e TNT, entrando em áreas bônus e chegando ao final para capturar o cristal que garantirá a passagem para a próxima leva de telas, não antes de enfrentar o chefe de fase. Depois da fase terminada, o jogador pode retornar e concluí-la o mais rápido possível, ganhando outro tipo de joia como recompensa por quebrar o recorde do game.
O maior nêmese de Crash sempre foi o Dr. Neo Cortex, o cientista maluco que criou a criatura e que planeja dominar o mundo. Crash e Coco, junto com o mentor Aku Aku (uma máscara tribal flutuante), precisam enfrentá-lo nas três aventuras antes que tudo vá por água abaixo.
Os três games, apesar de similares em sua estrutura de plataforma 3D, diferem em alguns detalhes: O primeiro, originalmente lançado em 1996, fora um dos primeiros títulos de plataforma 3D, sendo desenvolvido meses antes do lançamento de Super Mario 64. Como um dos pioneiros, o game ainda tinha uma dificuldade bem brutal (e algo que será mais detalhado nos próximos parágrafos), com necessidade de precisão nos pulos e nos ataques de Crash em seus inimigos. O jogo era bem mais linear e as fases parecem mais os corredores que usualmente jogamos em plataformas 3D, só que com uma perspectiva tridimensional.
O segundo, Cortex Strikes Back, lançado um ano depois, implementou telas mais abertas, com rotas alternativas, além de habilidades para o marsupial como rasteira e o famoso body slam feito ao pular e depois apertar o botão de agachar. E o terceiro, Warped, de 1998, foi o mais ousado e ofereceu muito mais variedade em termos de fase (submarinas, aéreas, corridas com motos, etc) e habilidades que iam sendo adquiridas por Crash à medida que ele ganhava do boss de cada mundo, ajudando na hora de pular e de completar os time trials, que tiveram sua estreia neste título.
As fases consistem em uma alternância entre telas 2.5D (com algumas tendo profundidade de movimento) e 3D. Apesar dos temas das telas repetirem ao longo de cada título, Crash fascina por seu level design, que gradualmente vai aumentando de dificuldade a partir das bases estabelecidas no início de cada tela. Ao contrário de outros games de plataforma que preferem dar variedade de coletáveis ao invés de utilidade para eles, acumular as 100 Wumpa Fruits para receber 1 vida torna a coleta dos itens muito mais necessária. Outros itens, como as de Tawna no primeiro título, oferecem a oportunidade de entrar nas fases bônus, também importante para o avanço e acúmulo de vidas. Há também algumas engenhosas mudança de perspectiva no meio de algumas telas, como a fuga do Crash de um Triceratops no terceiro título, que muda para a visão 2D quando o marsupial consegue despistar a criatura jurássica.
O primeiro continua sendo o mais difícil e exige muito mais precisão e quase nenhuma falha do jogador para superar os obstáculos. As telas também têm um nível de progressão mais imperdoável. No primeiro e segundo ainda havia poucas fases com veículos, implementados no terceiro jogo como forma de variar o gameplay durante as fases. Tais telas acabam sendo as que pior envelheceram no jogo, já que acabam fugindo da mecânica de plataforma estabelecida, se tornando difíceis e enferrujadas de se controlar, especialmente as de moto com Crash e jetski da Coco.
Simplicidade em seu design acaba sendo o ponto forte da experiência e a satisfação de terminar os títulos é tamanha devido a essa dificuldade mais punitiva. Sim, às vezes algumas telas têm inconsistências ou um ritmo desbalanceado. Porém, como uma remasterização de títulos antigos, não fazia parte dos planos da Vicarious refazer por completo as telas, mas sim restaurá-las a ponto de se tornarem mais acessíveis para uma nova geração. E isso foi feito de forma sublime pelo estúdio.
Com isso em mente, os três jogos acabaram recebendo certa padronização em alguns de seus aspectos, usando de base o terceiro jogo da franquia, o mais "polido" entre os três títulos originais. Aqui entra a polêmica do sistema de pulo do jogo, em que Crash usa o momento de seu movimento a favor do alcance do seu pulo. Pense em algo como Mario, em que você tem que "correr" um pouco antes de pular para alcançar uma distância maior. Porém, isso não existia na versão do primeiro título, a Vicarious Visions decidiu implementar essa mudança nos três jogos para que os jogadores que nunca tivessem experimentado a trilogia pudessem ir aprendendo as habilidades de plataforma conforme fossem terminando cada título. Assim, quem já tinha jogado os títulos no PS1 pode sentir certa estranheza, especialmente no primeiro, que além de demandar mais precisão nos pulos tem certas fases que não oferecem o mesmo espaço entre uma plataforma e outra para pular (com o notório exemplo das telas Road to Nowhere e The High Road). Em termos de dificuldade, é recomendável começar a jogar a partir do terceiro ou segundo título, já que o primeiro é o mais difícil da trilogia.
Com visual totalmente retrabalhado, o game oferece uma direção de arte que remete aos jogos originais mas sem comprometer em criar uma identidade própria. A iluminação contrastante com o ensolarado de áreas como florestas e desertos em relação a áreas industriais e poluídas, mais escuras e cheias de canos e robôs por todo o lado, tudo muito vivo e bem animado. As texturas também são incríveis, desde os pelos de Crash e todos os seus amigos animais até a textura e iluminação individual de cada item, tudo passando uma riqueza visual sem precedentes para a franquia. Há também algumas sutis diferenças de paleta de cores em algumas telas em relação ao original, dando mais personalidade a elas. Os três jogos entregam um pacote visual conciso e completo, oferecendo um mundo colorido, cartunesco e bizarro. A trilha sonora remixada também mantém os temas originais com novos arranjos e batidas modernas.
Crash e seu elenco de coadjuvantes e inimigos e vilões nunca pareceram tão vivos e cartunescos como aqui, com animações de movimento e as icônicas telas de game over sendo o maior destaque. O cuidado que a Naughty Dog (e as adições da Vicarious) tiveram em criar animações que transparecessem a personalidade de cada personagem é refletida no remaster e mostra a diferença entre Crash e tantos outros mascotes cartunescos sem o mesmo nível de polidez. Muitas vezes parece que estamos jogando uma animação, similar a jogos como o remake de Ratchet & Clank lançado ano passado.
Fora o visual e som, há outras novidades, como a possibilidade de jogar boa parte das telas dos jogos com Coco; checkpoints e máscaras Aku Aku que aparecem para dar uma força depois do jogador morrer múltiplas vezes na mesma tela; sistema automático de saves; lista de troféus individuais para cada jogo, com direito a 3 platinas no total; telas de pause para o primeiro jogo; e time trials para os dois primeiros, algo que era exclusivo no terceiro título original. E claro, a possibilidade de movimentar Crash por meio do analógico, algo inexistente no controle na época em que o primeiro saiu. Muda-se muito a sensação e noção de pulo e distância que o jogador tem.
Apesar do ótimo trabalho em modernizar os gráficos e a jogabilidade da trilogia, há algumas falhas que poderiam ser resolvidas em atualizações futuras, como as longas telas de loadings entre as fases e a falta de um botão de Retry em fases como as de corrida de moto em Warped, sendo que o jogador precisa sair dela para reiniciar a corrida, mesmo após notar que não existe possibilidade de chegar ao final em primeiro lugar. São apenas detalhes quando comparado à qualidade da coletânea como um todo, mas ainda sim merecem ser mencionados.
Por ter uma dificuldade acima da média dos jogos de plataforma atuais, o jogador que nunca experimentou nada da franquia deve demorar umas boas 10 a 12 horas para chegar ao fim dos três títulos. E se quiser completar todos os time trials e coletar todas as gems e caixas escondidas em cada tela, o valor de raplay é alto e provavelmente irá gastar o dobro do tempo até decorar precisamente como destruir todas as caixas no tempo certo.
Veredito
Crash N.Sane Trilogy é uma das melhores remasterizações já feitas, mostrando o cuidado e carinho que a Vicarious Visions tem com os títulos originais. Apesar de uma dificuldade mais punitiva e algumas inconsistências no level design remanescentes dos games antigos, o título é a porta de entrada perfeita para quem nunca experimentou a série do marsupial e uma ótima sessão de nostalgia para os veteranos, fazendo justiça a um dos pioneiros nos games de plataforma 3D e um dos mascotes mais queridos da história dos games.
Jogo analisado com cópia digital adquirida pelo redator.
Veredito
Crash N.Sane Trilogy is one of the best remasters ever made, showing the care and affection that Vicarious Visions has with the original titles. Despite a more punitive difficulty and some inconsistencies in the remaining level design of the old games, the title is the perfect gateway for anyone who has never experienced the series and a great nostalgia session for veterans, doing justice to one of the pioneers in 3D platform games and one of the most beloved mascots in game history.
[/lightweight-accordion]