É curioso ver o tempo que se leva até a influência do sucesso de um dado título render diferentes clones ou “jogos inspirados” em seus conceitos. Especialmente gêneros que exigem um alto grau de investimento e bastante tempo de desenvolvimento, o tempo que se leva até chegar ao ponto de lançar um jogo inspirado pelo sucesso estrondoso de um ano talvez seja longo demais e perca totalmente a onda levantada por este sucesso.
Esse parece ser justamente o que estamos vivendo com a onda atual de novos hero shooters, jogos inspirados pelo estrondoso sucesso de Overwatch lá em 2016 e que só agora começam a chegar às mãos dos jogadores, tendo demorado muito mais para tomar forma do que outras ondas como Metroidvanias e Soulslikes, ao ponto em que o próprio Overwatch parece ter encontrado seu nicho e se fixado nisso, não tendo mais o mesmo grau de atenção que outrora possuía.
Dado todo o sucesso da PlayStation Studios ao longo dos últimos 10 a 15 anos com seus jogos narrativos e o alto reconhecimento que seus estúdios dedicados a experiências singleplayer, era natural que eventualmente ela buscasse ampliar seu portfólio para incluir jogos primariamente multiplayer, algo que vinha se desenhando com os projetos anunciados e rumores tanto dos estúdios mais tradicionais da marca quanto os recém-adquiridos. Um desses projetos é Concord, jogo de estréia da Firewalk Studios, uma desenvolvedora que surgiu em 2018 e no passado se juntou oficialmente ao PlayStation Studios.
Concord é justamente o que você deve imaginar ao ouvir o termo “Hero Shooter”. Um FPS totalmente multiplayer voltado para diferentes modos PVP no qual grupos de cinco jogadores competem para alcançar a vitória, com cada equipe sendo formada por diferentes heróis, cada qual com suas próprias habilidades e armas únicas, com diferentes estilos de gameplay que buscam agradar a todo tipo diferente de jogador.
O universo do jogo tem uma abordagem bem sci-fi, com o jogador fazendo parte de um grupo de heróis de uma tripulação chamada de Estrela do Norte, que acaba de ser aceita como parte dos Freegunners, basicamente mercenários que assumem diferentes contratos ao redor do universo e competem entre si para ver qual grupo consegue completar essas missões antes do outro.
Um dos prometidos diferenciais de Concord é o fato de existir uma narrativa se desenvolvendo ali, com diferentes personagens sendo trabalhados e explorados ao longo das semanas. Embora, naturalmente, não seja possível ver todo esse conteúdo até aqui, algo que marca muito é que a vibe dessa narrativa me parece muito inspirada em Guardiões da Galáxia, tentando capturar a mesma dinâmica e humor visto tanto no jogo da Eidos-Montreal quanto, principalmente, nos filmes do James Gunn. Isso acaba fazendo com que os personagens sejam derivativos demais e percam a oportunidade de ter um carisma próprio e, consequentemente, tornando essas cenas bem descartáveis.
Um dos pontos mais estranhos dos personagens é que, no esforço para ter um grupo de personagens bem variado, algo que eu considero como um ponto forte do jogo, ele acaba falhando em entregar personagens carismáticos. Diversidade por diversidade não é um sucesso quando se falha em criar bons personagens diversos e é justamente nisso que o jogo mais erra, com os personagens com design mais alienígena sendo justamente os mais visualmente interessantes.
Dito isso, em um FPS competitivo a narrativa ou personalidade dos personagens não é exatamente algo tão importante assim, com o gameplay sendo o seu ponto principal. E, honestamente, esse é o ponto mais alto do jogo. Para o quão sem graça são os designs dos personagens, os kits de habilidades brilham, com pelo menos um dos 16 heróis disponíveis se adequando ao seu estilo de jogo com toda certeza.
É engraçado porque parece muito que a Firewalk pensou primeiro no kit de habilidades e construiu os personagens a partir daí, algo que acaba significando uma priorização à como essas habilidades funcionam na prática. Isso significa que, embora alguns Freegunners sejam mais fáceis de se aprender no começo, dedicando um pouco de tempo todos eles são viáveis, especialmente em partidas com grupos se coordenando.
A coordenação entre os grupos é essencial, independente do modo, justamente por Concord tomar a decisão bem interessante de, ao contrário de outros jogos do gênero, não trazer habilidades supremas. Cada herói tem uma habilidade mapeada para o L1 (geralmente mais defensiva ou de suporte) e outra pro R1 (normalmente mais ofensiva), com uma grande parte também tendo algo relacionado à esquiva (ativada com O). A exceção fica por conta dos tanques que, por terem muito mais energia do que os demais, acabam tendo menos mobilidade e, consequentemente, sem esquiva.
É interessante que o jogo também tem um foco considerável em te incentivar a trocar de Freegunner entre as rodadas ou respawn, com diferentes bônus sendo ativados ao escolher cada uma das classes. Isso acaba também sendo uma parte da estratégia e um planejamento que faz com que o jogo, à medida em que você passa mais tempo com ele e o entende melhor, fique mais divertido. Em vários momentos eu me vi encaixando curtas partidas de Concord ao longo do dia, graças ao quão fácil é só pegar, jogar e largar, já que o jogo, por não ser free-to-play, acaba também não tendo os tradicionais sistemas de passe de temporada e loot boxes de outros jogos do gênero (ainda que exista um sistema de progressão que desbloqueia itens cosméticos para o jogador e variações dos Freegunners que te permitem customizá-los mais ao seu estilo de jogo).
Porém, os modos de jogo talvez sejam um dos pontos em que o jogo acaba se perdendo. Embora, no total, sejam 06 modos de jogo, eles ficam divididos entre três playlists diferentes, com o jogo decidindo aleatoriamente qual modo você irá jogar. Um dos pontos mais interessantes disso é que, ao contrário do que se esperaria, os modos em si são mais inspirados no que se veria em Call of Duty do que em Overwatch.
A principal playlist é o Pancaria, com os tradicionais modos Team Deathmatch e Kill Confirmed, aqui chamados de Eliminação e Caça ao Troféu, com ambos sendo partidas mais leves em que seu foco é só derrotar os inimigos, com o Caça ao Troféu tendo a leve variação da exigência de coletar um cartão que é deixado pelo inimigo ao morrer para “confirmar” o ponto. A segunda playlist, chamada Superação, já é mais voltada para os modos focados em objetivos do jogo, Controle de Área, no qual as equipes brigam pelo controle de diferentes zonas, e Caça ao Sinal, que funciona de forma parecida, com os grupos capturando e protegendo zonas até que elas mudem para a próxima.
O jogo possui uma terceira playlist chamada de Rivalidade, que é voltada para os modos mais competitivos chamados de Extração de Carga, no qual uma equipe precisa plantar a carga em uma zona e defendê-la dos inimigos, e Ponto de Conflito, cujo objetivo é ou capturar uma zona ou derrotar todos os inimigos. A diferença desses modos é que eles não possuem respawn mas, sinceramente, passe longe dos modos pois são com muita tranquilidade os piores que ele tem a oferecer e não justificam sua existência.
Os mapas, no geral, são bem variados, com diferentes áreas abertas e corredores que incentivam uma movimentação mais tática, mesmo após conhecê-los mais à fundo. O jogo tem uma quantidade bem grande de mapas no lançamento, com um total de 12, e embora o design das áreas em si seja bem legal, o visual é um pouco genérico e sem graça, com grande parte da qualidade visual do jogo ficando mais pelos efeitos do combate do que pelas arenas na qual eles acontecem.
Talvez, o ponto mais chato da experiência com Concord nessa primeira semana seja a dificuldade que é encontrar partidas. Apesar de possuir crossplay com PC, até as partidas mais simples costumam demorar um pouco para encontrar uma equipe completa. Dito isso, o gameplay em si flui perfeitamente, com nenhum tipo de glitch ou bug ou problema de conexão, Por mais que não seja o exclusivo mais poderoso do console, ele faz um bom uso do poder do hardware para entregar uma experiência bem sólida.
Infelizmente, com a curta base de jogadores no momento, talvez pelo fato do jogo ter saído tão próximo da chegada de Valorant ao PS5 e a competição direta com jogos free-to-play enquanto ele possui um custo de entrada, é difícil saber como será a experiência do jogo a longo prazo. Dito isso, a Firewalk promete mais conteúdo, incluindo mais conteúdo da história, mais Freegunners, mapas, Variações e modos de jogo para os próximos meses, então, caso sua base de jogadores se mantenha firme e cresça, há bastante a ser explorado aqui ainda.
Embora o gameplay de Concord seja bem agradável, infelizmente, ele acaba não alcançando todo seu potencial por passar uma sensação de que, apesar do longo tempo de desenvolvimento, ele ainda pareça um pouco “cru”. Várias de suas ideias funcionam excepcionalmente bem, enquanto outras falham muito, se combinando para entregar um jogo que não é excepcional, mas também não é uma tragédia, meio que só existindo algo que, considerando a qualidade do portfólio da PlayStation Studios, faz com que este que deveria ser o grande baluarte multiplayer da Sony chegue menos como um furacão e mais como uma brisa leve.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Sony Interactive Entertainment.
Veredito
Embora traga um gameplay sólido e divertido, Concord falha em vários outros aspectos, incluindo seus modos competitivos e a falta de carisma dos seus personagens. É uma experiência mediana que pode ser divertida em curtas doses e recompensadora ao jogador que invista tempo, mas que não faz o suficiente para prendê-lo.
Despite a solid and fun gameplay, Concord falls short in several other aspects, including its competitive modes and the lack of charisma of its characters. It’s an average experience that can be fun in short doses and rewarding to the player who invests time on it, but it doesn’t do enough to keep you hooked.
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