Análise – Dawn of Fear

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Desde o lançamento de Resident Evil: Code Veronica, há quase 20 anos, alguns fãs do gênero survivor horror (ou horror de sobrevivência) tem suas ressalvas com os rumos que esta e outras franquias tomaram. Dentre eles, há alguns mais fervorosos e, digamos, conservadores, que acreditam que a fórmula original, presente principalmente nos games da geração 32 bits deveria ser mantida intocável.

De certa forma, os primeiros games da franquia RE, assim como outros jogos influenciados pelo formato, como Dino Crisis, Fear Effect, Parasite Eve e até mesmo produções anteriores que deram forma ao gênero, como Alone in the Dark, acabaram firmando novos paradigmas na indústria dos games, com seus ângulos de câmera sofisticados, movimentação que mais tarde seria identificada como “tanque”, gestão de recursos escassos, sensação de impotência diante uma situação absurda e inesperada, e tudo mais. Se algumas dessas características evoluíram e ganharam novos contornos com o passar dos anos, outras parecem ter ficado datadas para os dias atuais, ainda que olhos e corações mais saudosistas não permitam que caiam no esquecimento.

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Ao que tudo indica, é com base nesta nostalgia que Dawn of Fear foi criado e lançado exclusivamente para Playstation 4. Toda a sua gênese busca emular, de forma bastante explícita e desavergonhada, sensações e reações presentes principalmente no primeiro game da franquia da Capcom. Fosse outro momento histórico, o jogo poderia ser compreendido com um verdadeiro plágio, tamanha a semelhança. A grande questão é se a homenagem faz jus ao homenageado e tem condições de atender a essa teórica demanda da comunidade. E já podemos adiantar a resposta: não.

Compreendamos melhor: ainda que seja um sistema obviamente datado, a movimentação estilo tanque não é um problema para quem a conhece, nem mesmo para quem se dedica alguns minutinhos para se acostumar. E o jogo, logo no início, garante esse tempo para adaptação do jogador. Tudo é perfeitamente identificável: uma mansão clássica, prateleiras e mais prateleiras antigas, passagens secretas, design labiríntico, inimigos em maior quantidade que a munição, mistérios, rituais macabros e tudo mais o que se pode lembrar dos games desse gênero da segunda metade da década de 1990. Até o piano de cauda e a falta de localização para o português brasileiro estão lá.

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O ponto é que todas essas características funcionam muito aquém do que já está estabelecido há décadas. O posicionamento fixo de algumas câmeras, em muitos casos, é desastroso, com algumas quebras de eixo, e dá uma dimensão muito ruim de vários ambientes, sejam eles mais amplos, sejam corredores apertados. Mesmo os movimentos de câmera mais atrapalham do que ajudam em várias passagens, sobretudo em momentos onde há inimigos ou a necessidade de comandos mais rápidos e precisos. O desencontro entre jogabilidade e posicionamento de câmera piora tudo quando a transição de um plano para outro também prejudica a readequação do controle.

Por outro lado, há crédito na composição de puzzles e armadilhas. Ainda que não tenham nada de especial em termos de inventividade – são sempre mecanismos e painéis com combinações encontradas nas dicas que o jogo oferece – são bem preparados e cumprem o propósito. Não espere nada que seja necessário quebrar a cabeça ou esperar um “detonado” para desempacar, mas é dos elementos mais positivos na experiência. O mesmo vale para o inventário, convenientemente organizado em um bloco de anotações, funcional e prático, com uma pitada de criatividade estética. Curiosamente, portanto, o elemento mais inovador do jogo é o que se sai melhor quando comparado ao conjunto da obra.

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O desenho de níveis também conta alguns pontos a favor. O backtracking, outra característica marcante dos jogos do gênero, é bem organizado e consegue dosar bem o avanço e novas visitas a áreas já conhecidas. Funciona melhor quando o jogo não tenta reinventar a roda e faz exatamente o que a cartilha manda: chaves diferentes para portas no mesmo corredor, portas que só abrem de um lado para facilitar o retorno, segredos escondidos em passagens especiais, save points limitados e espalhados estrategicamente e uma exploração por estruturas inesperadas de uma mansão. Está tudo lá e todos os que já tiverem experimentado algo do tipo se sentirão em casa.

No mais, Dawn of Fear é uma série de boas intenções perdidas. O visual acerta em buscar uma simplicidade que, mesmo em tempos atuais de HD, apelam para nossa memória afetiva de como esse game deveria se parecer. É evidente que se parece pouco com a recente remasterização do remake de Resident Evil (e provavelmente nem seria essa a proposta). O problema é que em muitos aspectos, parece muito mais uma colagem de objetos modelados sem muita coerência entre si. A multiplicidade de cores e de iluminação em cada ambiente, ao invés de oferecer diversidade acaba parecendo só uma série de ambientes desconexos e que estão longe de parecer parte de uma mesma construção. Curiosamente, em outros casos, a composição é muito sofisticada e merece elogios, salientando essa sensação de descompasso da produção.

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Tudo isso junto acaba comprometendo a jogabilidade e mecânicas simples, como abrir uma porta ou atirar em um inimigo, acabam incomodando muito mais do que deveriam. Se o simples caminhar já demanda uma adaptação ao modelo e a transição entre planos pré-renderizados atravancam a espacialidade, o sistema de mira semi-assistido exige paciência, e fugas (necessárias) podem ser frustrantes. Pontos de interesse não ficam piscando o tempo todo – algo muito agradável e diferente para os tempos atuais – mas a interação truncada pode fazer com que elementos-chave do cenário passem despercebidos simplesmente porque o comando de interação não acertou o hitbox do jeito esperado.

A transição entre salas apresenta uma evolução técnica do que visto anteriormente, já que não é mais necessário que cada sala tenha uma mini-loading disfarçado naquela animação de portas se abrindo. Mas acaba funcionando mal, já que quando um inimigo está perseguindo o protagonista, ele fica “congelado” assim que acionamos a porta, evitando artificialmente que ele ataque durante o tempo em que ela se abra e feche. O resultado é uma sensação bem estranha e quase sempre de quebra da imersão. Soma-se a isso vários deslizes no sistema de colisão e de interação, e a fluidez de gameplay fica comprometida ao máximo.

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Outro problema sério que atrapalha Dawn of Fear está logo nos primeiros minutos e diz respeito à construção narrativa e estabelecimento do clima de terror. Ainda que a tela de texto que abre o game apresente uma premissa instigante (ainda que nem um pouco original), nada nos é ofertado para que nos envolvamos emocionalmente com a trama. Sabemos rapidamente que uma morte inesperada (e um histórico de desgraças familiares) faz com que Alex, nosso protagonista, retorne ao antigo casarão onde cresceu.

Uma sequência de eventos estranhos e macabros fazem com que ele logo se encontre sozinho ali, com a única motivação de entender o que está acontecendo e, obviamente, escapar vivo. Um típico plot de filme (e de jogos) de terror B, tal como esperado. Mas falta charme, falta aquele componente de mistério que o levaria a ficar procurando uma saída de um lugar que ele já conhecia, ao menos vagamente. O desenvolvimento da trama perde ritmo, e grande parte dele se desenrola por diálogos mornos e documentos preguiçosos com os quais vamos esbarrando pelo caminho.

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Não demora para que estejamos visitando salões, quartos de criança e todos os clichês que um game com essas influências exige. E, claro, há os zumbis, sedentos por carne humana e prontos para atacar sem aviso. Junto com eles, outras criaturas grotescas também atormentam a jornada, incluindo aí alguns encontros insossos com chefes. A sensação de perigo a cada nova porta aberta está, de fato, presente, até pela falta de clareza sobre o tipo e quantidade de dano que resulta de cada ataque. A marcação da saúde do herói é bastante criativa – o tal bloco de anotações vai ficando marcado com sangue – mas há vários momentos onde um ataque simples pode levar a morte e outros onde ataques mais ferozes não mudam quase nada. Quase que sem querer, tudo fica mais imprevisível e a sensação de horror e de quase-morte constante criam tensão.

A trilha sonora, mesmo com as esperadas limitações de uma produção de orçamento modesto, tem seus momentos especiais, com passagens que mais lembram Silent Hill e sua carga emocional do que a fanfarronice de Resident Evil. Evidentemente, há muito mais inspirações de onde os desenvolvedores bebem para criar uma experiência autêntica. Mas novamente as melhores ideias caem por terra em uma mixagem bastante simplória, grunhidos muitas vezes mal encaixados no tempo e no espaço, ambiência confusa e ruídos (tiros, corpos se arrastando, interações, etc.) datados. O mapeamento sonoro como um todo sofre quando em conjunto, enterrando quaisquer boas intenções.

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Não podemos deixar de falar sobre problemas técnicos, desempenho, bugs e crashes. Normalmente, são questões que podem ser relevados em análises, sobretudo porque querendo ou não, há uma constante na indústria (e aí vale para produções independentes ou de alto orçamento) de que games no lançamento ainda carecem de um certo polimento e que isso é corrigido com o tempo. Mas no caso de Dawn of Fear há alguns complicadores: primeiro que com saves limitadíssimos, houve vários momentos onde o jogo simplesmente parou de funcionar e lá se foi um longo progresso. Em outros casos, um ou outro bug também impediu o avanço (como ficar preso a um painel para digitar uma senha sem números e sem comando para sair). São questões que certamente serão corrigidas por meio de patches e atualizações, mas que atrapalharam bastante a experiência.

Não há dúvidas que a produção da Brok3nsite incentivada pelo programa Playstation Talents tem potencial. Suas fontes de inspiração são claras, explícitas e muito bem-vindas, e o jogo chega apropriadamente em um contexto de saudosismo para com essas produções, oferecendo uma experiência raiz do gênero. O grande problema está no modo como esses elementos são estruturados como um conjunto. Particularmente, confesso, eu queria muito que o jogo fosse bom, mas há tantas ressalvas em todos os aspectos da produção que é tão difícil recomendá-lo quanto manter a dedicação para jogá-lo e escrever essa análise. Infelizmente, a tensão causada pelo jogo está, na sua maioria, nas suas características técnicas, e não enquanto experiência. E isso é tudo o que não se quer em produções dessa natureza.

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Jogo analisado com código fornecido pela Good Game Publishing.

Veredito

Dawn of Fear é uma coleção de boas inspirações nostálgicas mal executadas. Com aspectos artísticos e técnicos inconstantes e uma jogabilidade truncada, o jogo sofre ainda com problemas técnicos e com escolhas equivocadas de level design que infelizmente levam suas boas ideias para o buraco.

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Dawn of Fear

Fabricante: Brok3nsite

Plataforma: ps4

Gênero: Survivor Horror

Distribuidora: Good Game Publishing

Lançamento: 03/02/2020

Dublado: Não

Legendado: Não

Troféus: (inclusive Platina)

Comprar na

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Dawn of Fear is a poorly executed collection of good nostalgic inspirations. With fickle artistic and technical aspects and garbled gameplay, the game still suffers from technical problems and wrong level design choices that unfortunately flunk its good ideas.

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Dawn of Fear is a poorly executed collection of good nostalgic inspirations. With fickle artistic and technical aspects and garbled gameplay, the game still suffers from technical problems and wrong level design choices that unfortunately flunk its good ideas.

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