Avatar The Last Airbender: Quest for Balance – Review

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O anime que não é anime Avatar: The Last Airbender se tornou, desde seu lançamento no já longínquo ano de 2005 em um período áureo do canal Nickelodeon, um verdadeiro fenômeno de audiência e repercussão. A história acompanha Aang, uma criança que estivera congelada por 100 anos e que desperta em um mundo em guerra, permeado pela opressão impetrada pelo Reino do Fogo, o mesmo que dizimou todo o seu povo, os Nômades do Ar. Como o Avatar, uma entidade capaz de dominar os quatro elementos que surge de geração em geração, sua missão é basicamente trazer o equilíbrio para o mundo, e para tal, o herói terá que se provar digno do título, encontrar seu caminho pela dominação – ou dobra, como comumente é dito na série – dos demais três elementos que lhe faltam, e cumprir seu destino.

Batalhas que misturam artes marciais e poderes elementais, referências culturais incríveis, um humor muito bem pensado e uma narrativa deliciosa são alguns dos detalhes mais marcantes da saga, que mais tarde ganharia expansões não só para outra animação como também para diferentes mídias, como romances e quadrinhos. É um prato cheio também para adaptações para outras linguagens, mas o filme questionável dirigido por M. Night Shyamalan, lançado em 2010, nos provou que esta transliteração não é assim tão simples. Estamos aguardando uma nova entrada live action da marca que deve chegar pelas mãos da Netflix, mas até lá, outra versão vem até nós com Avatar The Last Airbender: Quest for Balance, game de ação e aventura em terceira pessoa que basicamente conta a mesma trama original, com alguns adendos e muitas coisas a menos.

Visualmente, é um jogo que respeita bastante o traço original, e se apropria dos recursos de cel shading para transportar para um universo 3D as cores e o estilo do desenho animado. O resultado é mediano, talvez suficiente, mas ao mesmo tempo expõe um escopo de produção menos exuberante do que a franquia merecia. Há várias simplificações de textura, as linhas preenchem o mínimo necessário e tirando os personagens centrais, os demais tem muito pouco a acrescentar. Todavia, são os ciclos de animação, principalmente em cenas de corte, que se mostram realmente limitados, e nos lembram das adaptações de marcas famosas lá da geração PS2 e que de vez em quando dão as caras em produções menores.

A escolha por uma câmera quase fixa, da qual não temos nenhum controle para além da possibilidade de dar uma puxadinha mais a frente, se prova datada e muitas vezes trabalha contra o jogo, nos colocando em perspectivas estranhas e que nos dão pouca dimensão de profundidade em vários momentos onde a precisão é exigida. Uma passagem boba, como pular de uma plataforma para outra, por exemplo, pode ser bastante irritante por simplesmente perdermos a noção da relação entre um objeto e outro. Houve momentos, e foram muitos mais do que eu gostaria, que eu demorei para superar por não ter o entendimento que um degrau estava em um nível superior na relação com o outro, coisa que há muito tempo parece superada.

A economia estética, por assim dizer, pode ser vista ainda nas escolhas sonoras, que se apropriam muito pouco da maravilhosa trilha sonora original – talvez por questões de direitos de uso, ou talvez só por escolhas criativas – além de manter o diálogo por voz para algumas passagens in-game ou em cenas de corte, enquanto outras se mantém somente por texto, o que é ainda pior considerando que o jogo não está localizado para o nosso português brasileiro. A redação, inclusive, tomou algumas decisões questionáveis no que se refere aos recortes narrados, dando muito espaço para certos momentos e deixando outros simplesmente de lado, o que resulta em uma inconsistência narrativa que se escora no conhecimento prévio do jogador para funcionar. Ou seja, para quem não acompanhou a série, o jogo faz pouco sentido e oferece um envolvimento raso e confuso com a história e com esse rico universo.

Tudo isso, entretanto, não chega perto da decepção que se mostra o modelo de gameplay. Enquanto um jogo de exploração e plataforma, ainda há méritos, com uma construção de fases que fica longe de ser brilhante, mas que garante boas caminhadas de descoberta. Missões secundárias e, principalmente, puzzles que nos colocam um desafio extra para chegar ao chefe final, todas trazem pontos positivos e créditos para a jornada de Aang e seus amigos, mesmo que o level design seja pautado por pequenas arenas conectadas por corredores óbvios. O mapa, disponível via menu, é mais decorativo do qualquer outra coisa, porque com tão poucos caminhos, se perder é quase um ultraje.

Controlamos, na maior parte do tempo, sozinhos ou ao lado de parceiro cooperativo local, o personagem título, mas na grande maioria do tempo estaremos acompanhados por um ou mais companheiros de viagem. Katara e Sokka são os mais frequentes por motivos óbvios, e a ideia de poder se revezar no controle de cada um deles é interessante, principalmente na resolução de quebra-cabeças mais elaborados que dependem de vários deles atuando de diferentes maneiras. Só que não demora muito para que um ou outro se torne inútil ou desnecessário. Por exemplo, assim que dominamos o elemento Água logo nas primeiras horas, Aang faz tudo o que a Katara faz, sobrando para ela ser uma parte redundante da party, com uma função minimizada de suporte de cura. Afinal, o menino da tatuagem na cabeça faz o que ela faz e ainda tem salto duplo e outras capacidades únicas. No máximo, esses duplos servem para tarefas artificalmente feitas para dois dobradores do mesmo elemento, como elevar um ponte ou coisas do tipo, mas nas missões mesmo, são figurantes de (pouco) luxo.

Falando nelas, as tarefas, como encontrar um certo número de itens para um NPC qualquer ou acabar com um grupo de vilões genéricos, são em certa medida divertidas como deveriam ser, ou pelo menos como eram há 20 anos atrás, mas não cumprem bem o objetivo de dar mais substância para a jornada, de aumentar o envolvimento com aquela gente, e acaba transparecendo a intenção de engordar a campanha que acaba por durar longas 13 a 15 horas. Além disso, nem sempre o jogo é bem sucedido no conceito de condução, e por vezes você fica perdido não porque não entendeu o que deve ser feito, mas porque o jogo esqueceu de nos dar subsídios para que encontremos essa solução. A maior muleta de design para esse formato de progressão, porém, acaba sendo utilizada de forma muito estranha, no formato de ambientes paralelos, os quais nós que conhecemos a obra original até temos um ideia do que poderia ser, mas que é muito mal explicado dentro do game. O Mundo Espiritual, aqui, é um lugar onde se empurra caixas e se acende tochas.

Cada uma destas ações – missões secundárias, desafios em um universo externo, exploração complementar – garantem pontos de habilidade (tematizados aqui como peças de Pai Sho) que servem para desbloquear melhorias na árvore de cada personagem; além de dinheiro para comprar, quando encontramos mercadores em cada uma das fases, melhorias e consumíveis, como frutas para restauração de HP ou chás para aumentar atributos temporariamente. Nada que já não tenhamos visto uma infinidade de vezes e que aqui é fácil de se reconhecer. Só que sem a opção de seleção de dificuldade, o jogo é pouco desafiador na grande maioria da campanha, então vários desses itens ficarão no inventário por um bom tempo até que sintamos a real necessidade (ou curiosidade) de utilizá-los.

Um último aspecto da jogabilidade da qual não se poderia deixar de falar é o sistema de combate que, sendo franco, é o pior para um jogo do gênero em muito, muito tempo, não só pelo potencial desperdiçado dos movimentos e dos golpes que a franquia entrega de bandeja para os desenvolvedores, mas principalmente pela absurda falta de fluidez e de sentido. Temos, por padrão, um ataque fraco e rápido e outro mais forte, com tempo de cooldown, além de comandos para defesa e outros movimentos específicos de cada protagonista. Com o tempo, desbloqueamos combos e combinações teoricamente interessantes destes comandos de ataque e de defesa. Mas na prática, a coisa é só irritante.

Ao entrar em batalha, ficamos restritos à área onde nossos inimigos estão, normalmente uma arena pequena, um artifício comum, por vezes preguiçoso para evitar que os conflitos sejam levados para outros espaços indesejados, mas enfim, uma decisão de desenvolvimento legítima. A pancadaria, contudo, é extremamente simplória, poucas vezes os inimigos sentem impacto, acertar a direção é um trabalho hercúleo e o foco é destrambelhado. Se isso ainda não é suficiente, os combos são repetitivos ao extremo mesmo quando estamos no nível máximo possível, e ficar preso num canto recebendo danos sistemáticos em animações cíclicas sem tempo de se levantar e recuperar antes do próximo tombo é de um desespero triste. Usar novos movimentos e intercalar poderes elementais deveria ser o ápice do jogo, mas o resultado é um sistema lastimável, onde aprendemos, por obrigação ou puro sadismo, a lidar com a pobreza mais para evitar o desgaste do que para realmente curtir boas coreografias e combates mais sofisticados.

As lutas contra chefes são um detalhe a parte, com algumas até funcionando bem naquele esquema de aprendermos padrões e utilizarmos elementos dos cenários para superar os inimigos, mas mesmo nisso há uma repetição de referências vazias que tornam tudo medíocre demais. É até compreensível encontrar o mesmo inimigo em várias passagens, porque afinal há que se manter os eventos minimamente canônicos, assim como utilizar hordas de soldados para evitar ainda mais reiterações é também um recurso válido. Mas seja no primeiro ou no último encontro com alguns dos melhores antagonistas da cultura pop, tudo é tão sem sal que só passa quase que automaticamente, sem qualquer impacto emocional ou narrativo.

Vários eventos que vivenciamos são, portanto, muito mais contextuais que remetem a passagens reconhecíveis, do que marcantes por si só. Muitas escolhas de desenvolvimento me fizeram imaginar que elas foram tomadas muito mais para simplificar o trabalho do que por, de fato, fazerem sentido. Há semi-fases onde jogamos naquele estilo infinity run que ficou famoso sobretudo em jogos mobile, por exemplo, e mesmo sendo bobas e desnecessárias, trazem uma variedade até que bem-vinda. O que parece bizarro é ter, na animação, uma sequência incrível onde os personagens literalmente descem por um tobogã que seria ótima no jogo e, no final, é contada via cena de corte em formato de HQ e, minutos antes, termos passado por um trecho onde subimos em um pinguim-lontra (ou algo que o valha) para sair escorregando por uma pista de gelo que começa do nada e dá em lugar nenhum. Inexplicável.

Isso acontece com outras decisões controversas. Várias coisas são narradas passivamente, algumas das mais importantes, aliás, para logo depois estarmos jogando uma fase dentro da casa de alguém onde nossa missão é basicamente perguntar para um monte de NPC iguais uns aos outros onde está a joia perdida da anfitriã. O mundo acabando, o pau torando nos diferentes reinos, e ao invés de vivenciar isso em uma grande aventura como é na animação, estamos andando para lá e para cá numa casa fechada sem qualquer motivo, só procurando uma saída que vai dar em um diálogo com uma personagem com quem estávamos conversando antes e que disse para terminamos o bate-papo no quintal. Só não é mais decepcionante porque, nessa altura, eu já estava só esperando o fim do jogo chegar, e o anticlímax de encontrar a minha heroína favorita da franquia inteira em um bate-papo sonolento foi a pá de cal na empolgação.

Para os mais empolgados, estas tarefas secundárias podem ser revisitadas posteriormente para se completar os 100% de cada episódio, lembrando que tal como a animação, o jogo é dividido em livros (cada qual com um elemento que falta ser dominado) que por sua vez está sub dividido em capítulos, ou fases. No menu inicial, tudo o que já foi superado tem lá a porcentagem de conclusão, quantas missões foram finalizadas e quantas ficaram em aberto, além de um colecionável principal e se for descoberto ou não. Muita coisa só pode ser desvendada posteriormente porque depende de um tipo de dobra que, na altura da narrativa, Aang ainda não tinha aprendido e nem tinha alguém ao lado para fazer. Depois do primeiro livro concluído, também se abrem as trials para que possamos ir direto a eles, se ainda sobrar alguma vontade.

É necessário, por sinal, falar desse elemento dos puzzles onde temos que empurrar blocos e acender fogareiros com personagens que, segurando uma tocha, são incapazes de pular, algo que jamais se sustenta tematicamente dentro do jogo, e não faz nada diferente como um modo extra fora dele. Curiosamente, são as passagens mais interessantes do jogo pela proposta que, por vezes, são bem desenhadas sobretudo pensando no público alvo, mas ao mesmo tempo, não traz qualquer aspecto contextual que realmente tenha uma conexão com o tema da franquia. O jogo até se esforça para dizer que o que se aprende resolvendo os quebra-cabeças desenvolve novos aprendizados no Avatar em formação, resultando na liberação de novas capacidades, mas cabe ao jogador só aceitar, porque qualquer questionamento é exigir demais de algo que claramente foi pensado independentemente da marca.

O conjunto da obra, no final das contas, é vítima das expectativas que o licenciamento de uma obra tão popular podem gerar no público, mas é inegável que se fosse tematizado em um universo original, continuaria sendo uma experiência insatisfatória. Se Avatar The Last Airbender: Quest for Balance fosse um jogo de três ou quatro gerações atrás, quando as ideias aqui demonstradas eram preponderantes no mercado, ainda assim seria um mais-do-mesmo sem charme e sem boas ideias que o sustentassem. O fato de ser um jogo pretensamente pensado para crianças menos exigentes não exime o produto de ser mal feito e subaproveitado.

Nos dias atuais, o game é injustificável da forma como foi feito, por mais que proporcione um ou outro momento de memória afetiva para os fãs da encantadora lenda de Aang, mas nem mesmo a nostalgia, aquela mesma, é o suficiente para que nos importemos com que está ali retratado. Ironicamente, o subtítulo só nos lembra que o equilíbrio desejado pode até ter sido alcançado, mas só se considerarmos que todos os quesitos do game são igualmente ruins. A melhor qualidade do jogo, assim, é ter nos lembrado que ainda não tivemos um bom jogo baseado neste universo e, bem, continuaremos esperando, porque não foi desta vez.

Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela GameMill Entertainment.

Veredito

Avatar The Last Airbender: Quest for Balance é um amontoado de ideias rasas implementadas de modo simplório e desajeitado. A narrativa e visual aproveitam pouco o rico material base, a exploração é insossa e o sistema de combate é um insulto. Na média, uma grande decepção.

40

Avatar The Last Airbender: Quest for Balance

Fabricante: Bamtang Games

Plataforma: PS4 / PS5

Gênero: Ação / Aventura

Distribuidora: GameMill Entertainment

Lançamento: 22/09/2023

Dublado: Não

Legendado: Não

Troféus: Sim (inclusive Platina)

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Avatar The Last Airbender: Quest for Balance is a pile of shallow ideas implemented in a simplistic and clumsy way. The narrative and visuals make little use of the rich base material, the exploration is bland and the combat system is an insult. In the end, a big disappointment.

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Avatar The Last Airbender: Quest for Balance is a pile of shallow ideas implemented in a simplistic and clumsy way. The narrative and visuals make little use of the rich base material, the exploration is bland and the combat system is an insult. In the end, a big disappointment.

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