Ao longo dos anos, um pequeno estúdio japonês foi crescendo e pouco a pouco ganhando mais e mais renome pelos seus títulos únicos, adornados por um dos estilos artísticos mais distintos encontrados em toda a indústria de videogames, independente do seu país de origem. Essa desenvolvedora, a Vanillaware, finalmente alcançou o ápice do seu reconhecimento com um incrível misto entre um Adventure e RTS em 2019/2020 com o lançamento de 13 Sentinels: Aegis Rim. Mas onde tudo começou?
Bem, tudo meio que começou com o segundo título da desenvolvedora, um surpreendente misto entre visual novel e RTS chamado GrimGrimoire. O primeiro jogo de console da desenvolvedora e co-desenvolvido com a Nippon Ichi Software foi lançado para PlayStation 2 já no fim da vida do console em 2007 e se tornou uma espécie de clássico cult, reverenciado pelos poucos que o jogaram, mas amplamente ignorado por aqueles que já haviam começado a migrar para o PS3/Xbox 360.
Ainda assim, ele se mostrou um sucesso o suficiente para permitir novos lançamentos e, com eles, o estúdio ir aos poucos galgando seu espaço. E como títulos do nível de Odin Sphere, Muramasa: The Demon Blade, Dragon’s Crown e o já citado 13 Sentinels: Aegis Rim foram progressivamente melhor recebidos por crítica e público, eventualmente chegou a hora de trazer aquele velho título para plataformas recentes, agora chamado aptamente de GrimGrimoire OnceMore.
O jogo segue a jornada de Lillet Blan, uma jovem bruxa recrutada para treinar na mais famosa academia de magia do mundo, a Silver Star Tower, durante cinco dias. Lillet terá esses dias para aprender o máximo possível e desenvolver suas aptidões mágicas enquanto busca aprender mais sobre os vários mistérios que envolvem essa aparentemente maravilhosa escola.
Acontece que a Silver Star Tower é uma escola estabelecida dentro do antigo castelo de um poderoso e maligno mago, cujo espírito foi aprisionado dentro da própria instituição. Como em todo bom jogo, convenientemente, o espírito desse mago é libertado justamente no último dia da estadia de Lillet na escola e parte em busca da Philosopher’s Stone (a famosa Pedra Filosofal), usando seus poderes para colocar em perigo todos que cruzam seu caminho.
Acontece que, a beira de ser assassinada por Calvaros, o mago, quando o relógio bate à meia-noite do 5° dia, Lillet se vê de volta no começo de todo o ciclo, mas com todas as suas memórias intactas. Cabe a ela então investigar exatamente o que está acontecendo, buscando uma forma de solucionar os mistérios da escola, quebrar esse ciclo infindável de cinco dias e conseguir salvar os seus novos amigos e, principalmente, a si mesma.
A história é, surpreendentemente, um dos pontos fortes do jogo. Apesar de ser bem simples e direta, algo que é refletido na curta duração do jogo, ela consegue desenvolver muito bem seus personagens, dando motivações claras e críveis para todos os professores e alunos, além de estar recheado de plot twists interessantes que, mesmo quase 20 anos após o seu lançamento, ainda surpreendem pelo quão bem estruturados são.
Parte disso é o fato de Lillet ser uma excelente protagonista. A jovem garota é bastante decidida, espirituosa e cheia de personalidade, fazendo com que as reações dela ao mundo pareçam genuínas e as mudanças pelas quais ela passa ao longo dos ciclos da história façam bastante sentido. Adicione a isso que Calvaros é um excelente vilão, sempre uma ameaça em plano de fundo, mas sem a necessidade de se fazer presente em todas as cenas, e temos uma dinâmica que funciona excepcionalmente bem.
É aqui também que é possível notar uma das principais melhorias adicionadas por essa remasterização que foi a completa regravação da dublagem do jogo, tanto em japonês quanto em inglês. Dada a baixa qualidade dos arquivos de áudio originais, a desenvolvedora resolveu regravar tudo, melhorando imensamente a qualidade dos diálogos em ambos os idiomas e só enriquecendo ainda mais a experiência.
Em termos de gameplay, GrimGrimoire OnceMore é um surpreendentemente divertido e desafiador RTS (Estratégia em Tempo Real, na sigla em inglês). Nesse mundo, os magos utilizam seus grimórios para invocar criaturas mágicas chamadas de Familiars a partir de runas mágicas, usando essas criaturas para executar determinadas ações durante as sessões de combate.
A surpresa principal fica por conta do jogo se passar inteiramente num plano 2D, com mapas divididos em diferentes andares e tudo acontecendo em tempo real. Os Familiars são divididos em 04 estilos diferentes de magia, vinculadas às aulas de cada um dos quatro professores apresentados ao longo do jogo, além de se dividirem em diferentes tipos de unidade, como ataque, defesa, cura e coleta de suprimentos.
Como todo bom RTS, aqui é necessário coletar um recurso específico para poder fazer qualquer coisa em combate: a Mana. A Mana é coletada através de cristais espalhados pelos mapas que precisam ser ativados por suas unidades e levadas de volta para as runas. Esse processo é feito automaticamente após você designar uma unidade para fazê-lo e, como é de se esperar, quanto mais unidades você dedicar a isso, mais rápido seu medidor irá subir.
O desafio fica por conta do fato de que cada cristal só pode ficar vinculado a um tipo específico de Runa e, consequentemente, a Mana coletada ali também só pode ser usada para invocar unidades desse mesmo tipo de magia. Portanto, se você tiver unidades coletando Mana para uma Runa de Glamour, você não poderá usá-la para invocar Familiars vinculados à Necromancia ou Alquimia, por exemplo.
Junte a isso que há um limite em cada fase de quantas unidades você pode ter ativa ao mesmo tempo e o fato de que cada um dos quatro tipos de magia tem uma relação de fraqueza e resistência com as outras escolas e você precisará constantemente estar manejando seus recursos, pensando em quais cristais estão sendo explorados e por quais Runas, quais unidades fabricar e, naturalmente, qual a melhor hora de enviá-los para atacar seus adversários.
É tudo muito simples e intuitivo, mas que se mostra bastante desafiador e, consequentemente, muito divertido justamente pela forma como as várias opções disponíveis vão se entrelaçando para apresentar um emaranhado gigantesco de opções e desafios a serem resolvidos. Com isso, o jogo se mostra um prato cheio para os fãs do gênero, contando inclusive com desafios adicionais para quem não se satisfizer com as batalhas da história. Por outro lado, se você só quer saber da história, o jogo conta com um modo mais fácil de jogo, tornando tudo muito mais acessível.
Cabe dizer ainda que o esquema de controles aqui é relativamente bem intuitivo. Você pode tanto selecionar suas unidades usando o analógico como um mouse quanto usar atalhos mapeados para os direcionais, ainda que quando há algumas dezenas de unidades disponíveis, seja bem fácil se embaralhar no calor do momento. O remaster também trouxe a opção de salvar o jogo em meio às batalhas e de acelerar o tempo de espera em combate, ajudando assim a pular os tempos de espera comuns em RTS.
Falando em melhorias dessa remasterização, cabe dizer que ela também trouxe pequenas adições ao combate que, caso o jogador não saiba que elas não estavam ali, jamais imaginaria que são novos dada a forma bem intuitiva em que foram adicionadas. São elas a adição de poderosos ataques mágicos, dando ao jogador mais um recurso para lidar com certas situações em que o número de unidades adversárias é bem alto e você pode estar prestes a perder.
A segunda importante adição é um novo sistema de árvore de habilidades para seus Familiars, adicionando uma profundidade maior à escolha de quais você usará além de simplesmente criá-los e enviá-los para batalha. Por fim, as dificuldades também foram rebalanceadas, em especial o Hard, tornando-o mais justo e fugindo da punitividade excessiva pela qual ele era conhecido. Todas essas mudanças foram, declaradamente, feitas de forma a aumentar o fator replay do jogo e funcionam bem nesse sentido.
Por último, mas não menos importante, cabe dizer que, como já era de se esperar de um jogo da Vanillaware, GrimGrimoire OnceMore segue sendo um jogo muito bonito. É claro, isso não se dá por questões técnicas ou grandes feitos de animação, mas sim pelo visual cheio de personalidade e característico da desenvolvedora que brilha ainda mais em HD. A adição de uma galeria para ver as artes do jogo é algo de praxe de remasters, mas não deixa de ser bem-vindo quando se fala de um estúdio famoso pela sua arte tão especial.
A trilha sonora do jogo também é excelente, captando muito bem a ambientação e tornando os momentos muito mais tensos ou ternos a depender daquilo que o jogo pede dela. E, novamente, o excelente trabalho feito com a regravação das linhas de diálogo do jogo ajudam a tornar esse remaster ainda melhor e muito bem-vindo.
Fica bem claro então que, quer seja você um conhecedor recente da Vanillaware buscando saber mais da desenvolvedora ou um fã de longa data que teve a sorte de jogar o título ainda no PS2, GrimGrimoire OnceMore merece a sua atenção. Mesmo 16 anos depois, esse RTS 2D cheio de magia e criatividade segue sendo uma experiência única e capaz de envolver e conquistar qualquer jogador.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela NIS America.
Veredito
GrimGrimoire OnceMore é um excelente remaster de uma jóia esquecida do PS2 que finalmente recebe a chance de ter a atenção que merece. Seu sistema de RTS em 2D funciona excepcionalmente bem, desafiando e entretendo na medida certa e sua história é tão boa quanto o seu gameplay.
GrimGrimoire OnceMore is an excellent remaster of a hidden gem from the PS2 era that finally gets the chance to receive the attention it deserves. Its 2D RTS system works exceptionally well and its story is as good as its gameplay.
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