Signs of the Sojourner – Review

É inegável que jogos independentes vivem de ciclos repetidos à exaustão. Primeiro foram os jogos de plataforma 2D, depois os infames “walking simulators” e,  então, uma grande onda de metroidvanias e roguelikes/roguelites. Agora parece ser a vez da incorporação de “card games” como mecânica central ao jogo.

Muito disso vem do avassalador sucesso de Slay the Spire em 2019, com várias desenvolvedoras tentando dar vida a sua própria interpretação a um sistema de combate incorporando cartas. Seguindo essa mesma premissa mas com uma ideia um pouco diferente vem Signs of the Sojourner, uma experiência narrativa que busca usar esses sistemas para mostrar o quão complicada a comunicação entre seres humanos pode ser.

A popularidade de jogos usando cartas faz sentido. Afinal de contas, os card games são extremamente populares no mundo de todas as formas, de TCGs a jogos de baralho, todo mundo já teve experiência jogando Magic ou Truco. É uma linguagem universal que pode facilmente ser traduzida para os videogames, desde que as mecânicas por trás dela tenham propósito.

E é usar essa linguagem universal para contar a dificuldade da comunicação entre as pessoas que torna Signs of the Sojourner um jogo tão único e difícil de explicar. Nele, o jogador assume o papel de um jovem que, após a morte de sua mãe, é forçado a assumir o controle da loja dela e partir em diferentes jornadas ao redor da região coletando para revender em sua cidadezinha.

Fazer o seu melhor para encontrar itens para venda é fundamental, já que a sua cidade está prestes a parar de fazer parte da rota, algo que só não ocorreu ainda graças a sua mãe. Cabe a você então fazer as conexões certas para manter as coisas funcionando, com toda conversa que você tem mudando o seu destino e a sua forma de diálogo.

Essas mudanças são representadas pelas cartas em SotS. Cada carta possui um símbolo do lado esquerdo e outro do lado direito, com cada um deles representando um diferente tipo de emoção. Essas emoções são sinônimos de “formas de falar” como lógico, direto, empático ou apaixonado, sendo possível focar em só uma forma de expressão ou mudar constantemente para manter a conversa funcionando.

O sucesso do diálogo vai sempre depender do seu deck de cartas e a sua mão, que te permite manter (ou não) a conexão com a outra parte para alcançar o seu objetivo. Todas as interações com outros personagens tem uma quantidade determinada de sucessos necessários ou falhas possíveis antes do diálogo dar errado. Mas, como toda boa experiência interpessoal, nem sempre o sucesso é a única forma de avançar pelo jogo.

Inicialmente, o seu deck contará apenas com dois tipos de carta e, à medida que você avança, mais variado e rico o seu baralho se torna. Afinal, após interagir com um personagem, independente do resultado, você sempre ganhará uma nova carta para o seu baralho, sendo necessário trocar uma carta atual por ela. Isso significa que, à medida que você interage mais com um certo tipo de personagens você terá mais cartas daquele determinado tipo.

Isso torna possível conversar e interagir com personagens que antes você não teria como conversar da forma ideal para alcançar os seus objetivos. Mas, focar demais em interagir com esses personagens, pode acabar te impedindo de dialogar com os moradores da sua vila, tendo um diferente efeito no sucesso da sua jornada.

Essa forma de diálogo pode parecer muito complexa, mas funciona muito bem no contexto do jogo. Parte disso vem de cada playthrough da história durar pouco mais de 2 ou 3 horas, sendo que sempre há caminhos distintos e novas experiências a se ter toda vez que você começar uma jogatina nova. Mas, o principal é que, quando a história funciona, ela funciona muito bem.

Talvez o mais impressionante disso é que, à medida que você avança, você não só conhecerá mais sobre a sua mãe, lados dela que você nunca sequer sonhou, mas sua experiência com pessoas que você conheceu durante toda a vida irá mudar. A mais notória de todas é o seu melhor amigo que cuida da loja enquanto você viaja.

No começo, boa parte dos seus diálogos com ele são longos, já que vocês falam a mesma língua, com uma grande empatia um pelo outro. A depender de como você decidir seguir a sua jornada, você pode continuar a interagir bem com ele ou pode ver esses laços rompidos por você mudar pelos efeitos do mundo ao seu redor.

Há uma constante sensação de ganho e perda quando você vai avançando pelo jogo. Cada decisão, cada interação sempre vem com algo que você ganha daquela pessoa, mas também terá efeitos que te farão perder algo com os outros. A verdade é que é impossível não mudar ao longo da jornada e o funcionamento dessa mecânica é o maior êxito de SotS.

É uma pena que, apesar de funcionar tão bem, a história em si contada por SotS deixa bastante a desejar. Isso pode parecer contraintuitivo, mas vem do fato dos personagens não serem muito memoráveis e a narrativa como um todo não entregar uma história como um todo muito marcante.

O pretexto por trás da jornada do protagonista teria bastante potencial para servir como um grande motivador, mas, mesmo com o jogo tentando trazer mais detalhes sobre a mãe do protagonista para torná-la uma personagem importante, isso não chega a se tornar real. A conclusão da história também deixa a desejar, sendo uma conclusão relativamente previsível e que falha em ser tudo que poderia.

O meio da história é onde ele se destaca, mas mesmo assim acaba não se tornando tão especial quanto poderia ser. Talvez a escolha mais esquisita seja o fato do protagonista ser mudo em um jogo totalmente focado em diálogos. É compreensível não ter dublagem por se tratar de um jogo independente, mas a completa falta de fala do protagonista é realmente uma decisão muito esquisita.

Mesmo com alguns pequenos problemas, Signs of the Sojourner é um ótimo jogo com uma mecânica central espetacular, mas que não deixa de ter suas falhas. A construção de deck e o uso das cartas é muito bem implementado e funciona muito bem no contexto do jogo, ainda que a história como um todo não seja exatamente tudo aquilo que poderia ser.

Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Digerati.