É admirável a evolução da produção de jogos independentes na última década, algo que é totalmente perceptível quando comparamos o escopo dos projetos existentes na transição do PS3 para o PS4, e deste último para o PS5. Os desenvolvedores saíram de projetos pequenos e mais contidos para entregar títulos que se assemelham (seja em qualidade ou estética) a mega produções de estúdios veteranos da indústria. Esse é o caso de Mortal Shell, que após um bem-sucedido lançamento no PlayStation 4, chega ao PlayStation 5 com sua Enhanced Edition, trazendo diversas melhorias significativas que prometem ampliar ainda mais a sua experiência nos consoles da nova geração.
O foco deste review se concentra nas novidades e características do jogo rodando no PlayStation 5 e, portanto, caso deseje uma análise mais aprofundada em relação ao gameplay e enredo do jogo, você pode conferir a nossa análise de Mortal Shell no PS4.
Produzido pela Cold Symmetry, uma desenvolvedora composta por cerca de 15 integrantes, Mortal Shell Enhanced Edition é um RPG de ação que é fortemente inspirado pelos jogos da série Dark Souls, da aclamada From Software. Isso é facilmente notado nos mais diversos elementos que compõem o título, seja por meio da estética gótica, que predomina as diferentes ambientações do jogo, ou através das suas mecânicas de gameplay. Some isso aos belíssimos gráficos produzidos na Unreal Engine 4 e você tem um jogo que não deve em nada visualmente quando comparado aos jogos AAA da indústria.
Mortal Shell Enhanced Edition conta sua história de maneira bastante subjetiva e cabe ao jogador explorar o mundo em busca de respostas que solucionem as diversas lacunas que o título propositalmente deixa em aberto. Após acordar como um recipiente vazio (uma espécie de espírito imortal), o jogador entrará em um mundo apocalíptico, onde o que restou da humanidade luta para sobreviver. Neste lugar cruel e completamente hostil, você encontra uma entidade misteriosa que oferece a liberdade deste local amaldiçoado em troca de três glândulas que estão espalhadas pela terra. Ainda que existam elementos que entreguem uma visão mais aprofundada sobre o universo do título, como NPCs, itens e cenários, é difícil criar uma conexão com a narrativa e que, ao final de sua campanha de cerca de 15 horas, acaba tomando o mesmo rumo clichê de dezenas de outros títulos.
Assim como sua fonte de inspiração, Mortal Shell procura entregar uma experiência completamente sem guia para o jogador. Apesar de existirem tutoriais pontuais, o jogo não gastará nenhum segundo para explicar qual caminho deve ser seguido ou qual a melhor ordem de execução de seus “objetivos” (quando existem). Isso não é um problema em si, mas o level design de algumas localidades são extremamente confusos, o que dificulta a localização pelo mundo. O mapa não é muito extenso, possuindo apenas 4 regiões que são interligadas por um pequeno hub central; mas ainda assim é extremamente gratificante explorar cada um desses belíssimos cenários, graças à incrível ambientação do jogo.
Dentre todas as melhorias que Mortal Shell Enhanced Edition oferece para o PlayStation 5, a mais notável é a incrível e estável performance de 60 quadros por segundo ao longo de toda a sua campanha. Tal melhoria traz bastante fluidez para as animações, o que melhora significativamente o combate do título que sofria com as limitações impostas pelo hardware da geração passada. Os loadings também passaram por uma melhoria significativa, mas ainda estão longe do primor técnico atingido por títulos como Nioh Remastered ou Demon’s Souls. Para fins de comparação, o PlayStation 4 base possui tempos de carregamento que variam de 20 a 40 segundos, enquanto que o PS5 reduz esse tempo em pouco mais da metade, variando entre 10 a 15 segundos.
A resolução do título por sua vez não é renderizada a 4K como o prometido, o que por si só decepciona um pouco, mas os desenvolvedores prometeram um patch que elevará a resolução para 1800p. Vale lembrar que não existem modos adicionais que priorizem a resolução ou taxa de quadros. Independente disso, os gráficos continuam muito bonitos graças às novas texturas de alta qualidade, que aumentam o nível de detalhes nos ambientes, armaduras e inimigos. Outro fator decepcionante é a impossibilidade de exportar o seu save da versão de PS4 de Mortal Shell para o PS5, o que é um balde de água fria para aqueles que desejam manter o seu progresso da geração passada. Em compensação, os problemas de corrupção de saves que existiam na versão anterior do título foram totalmente corrigidos e agora você não precisa fazer backups constantes de seus dados.
O combate de Mortal Shell segue à risca o mesmo ciclo trabalhado pelos jogos da série Souls e, ainda que ele sofra de problemas bastante similares, tenta inovar a fórmula através de algumas mecânicas características. A mais marcante delas é a habilidade do personagem principal que pode endurecer seu corpo, transformando-se momentaneamente em uma estátua de pedra para poder anular algum golpe inimigo. A habilidade substitui o clássico botão de defesa, tão utilizado em Dark Souls, e possui um tempo de recarga, sendo necessário um bom julgamento do jogador para aplicá-la nos momentos adequados durante o combate. Além disso, a mesma pode ser utilizada de maneira ofensiva, uma vez que é possível endurecer durante a realização de um combo, podendo assim maximizar o dano causado ao oponente e levando a situações que podem virar o jogo.
Outra mecânica interessante são as “cascas” (ou shells no original), corpos de guerreiros derrotados, que estão espalhados pelo mundo do jogo e que o jogador pode utilizar como um receptáculo para a sua forma espiritual. Desta forma, o seu personagem é extremamente frágil, sendo extremamente necessário utilizar as cascas para obter uma forma corpórea mais resistente. Existem cerca de quatro cascas na campanha e cada uma possui seus próprios atributos e árvores de habilidades passivas, que podem ser melhoradas com o tempo, basicamente funcionando como classes de personagens. Isso permite que o jogador monte diferentes builds que se adequem ao seu estilo de jogo, seja mais agressivo ou defensivo.
Apesar das mecânicas mencionadas anteriormente tentarem diversificar o combate, este infelizmente ainda permanece bastante cru e sem muito dinamismo. As batalhas são lentas e, com base no estilo de jogo adotado por você, elas podem se tornar extremamente repetitivas, caindo no velho ciclo de “atacar e esperar” da série Souls. Isso se agrava por conta do arsenal limitadíssimo de equipamentos presentes no título, que se resumem a quatro armas voltadas para o combate corpo a corpo e uma para ataques à distância. Não existe magia propriamente dita no game e, em seu lugar, temos as habilidades de armas que funcionam de forma semelhante às weapon arts de Dark Souls 3. Cada arma possui cerca de duas habilidades especiais, como invocar estalagmites de gelo a partir do chão, por exemplo, e que podem ser utilizadas para diversificar os combos realizados.
Com a nova versão para PlayStation 5, os desenvolvedores puderam desfrutar do DualSense, algo que fazem de forma bastante inventiva durante o gameplay. Após utilizar a sua habilidade de endurecer, o L2 ficará em um estado “petrificado”, graças aos gatilhos adaptáveis, e só poderá ser apertado novamente após a habilidade ser carregada. Tal implementação elimina a necessidade do jogador observar a HUD e passa a ser algo sensitivo, o que faz com que toda a atenção seja voltada unicamente no inimigo à sua frente. O mesmo pode ser dito do R2, que gradativamente ficará mais “pesado” conforme a stamina do personagem se esgota ao realizar golpes. Por fim, vale mencionar o feedback háptico que entrega sensações interessantes ao se aproximar de itens e receber golpes de inimigos. Não é algo tão competente quanto o que é visto em Astro’s Playroom, por exemplo, mas merece algum destaque.
A trilha sonora do jogo é bastante pontual, e marca presença apenas durante as batalhas contra os chefes. Ao invés de trilhas orquestrais como as vistas em Dark Souls, o título vai de extremo oposto e possui músicas experimentais, que quase se misturam com o som ambiente. Tal decisão é totalmente acertada por parte dos desenvolvedores, uma vez que o design de áudio do jogo é excepcional e oferece uma imersão absurda no mundo devastado e cruel do título. Há um constante sentimento de inquietação, medo e perigo que são evocados durante o tempo todo ao longo da campanha, e boa parte disso vem apenas dos sons espalhados pelo próprio cenário. Caso você deseje uma experiência diferente, existe o DLC gratuito Rotten Autumn, que substitui a trilha original por faixas da Rotting Christ, uma banda de black metal que tornam frenéticos os embates contra chefes.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Playstack Limited.
Veredito
Mortal Shell Enhanced Edition chega ao PlayStation 5 com erros e acertos, mas certamente é um título que possui o potencial necessário para bater de frente com as diversas mega produções da indústria de jogos. É um jogo visualmente belíssimo e, apesar de seu gameplay carecer de maior polimento e dinamismo, consegue entreter bem o jogador ao longo de sua curta campanha.
Mortal Shell Enhanced Edition arrives on the PlayStation 5 with mistakes and successes, but it is certainly a title that has the necessary potential to go head-to-head with the various mega productions of the game industry. It is a visually beautiful game and, although its gameplay lacks more polish and dynamism, it manages to entertain the player well throughout its short campaign.
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