A Vanillaware é, há muito tempo, uma das desenvolvedoras mais únicas (e talentosas) de toda a indústria de videogames. Enquanto muito da fama do estúdio vem do estilo gráfico adotado por todos os seus jogos, usando uma arte em 2D inigualável e que mais se assemelha a uma pintura do que uma obra interativa, há muito a se dizer também sobre o quanto os seus lançamentos são distintos entre si.
Ainda que o estúdio fundado por George Kamitani em 2002 tenha lançado jogos bastante influenciados pelo trabalho dele enquanto ainda estava na Capcom, com revisões modernas do que seria um beat ‘em up, a propensão do estúdio em experimentar com diferentes gêneros e incorporar novos elementos para contar as histórias que o estúdio deseja.
Talvez a única constante ao longo dos anos, desde o lançamento de Princess Crown, passando por GrimGrimoire, Odin Sphere até Dragon’s Crown é o quanto o estúdio fez uso de diferentes mundos medievais para os seus jogos, com a única exceção ficando por conta de Muramasa: The Demon Blade (o qual, ainda assim, é uma versão mágica do Japão feudal, o que se equivale a visão européia dos mundos medievais).
Mas, com o lançamento de 13 Sentinels: Aegis Rim, todas as regras vistas nos trabalhos anteriores da Vanillaware voaram pela janela. Enquanto esse não é o primeiro jogo de estratégia em tempo real da desenvolvedora (esse título fica com GrimGrimoire), é a primeira vez que ela tenta a mão em usar uma das mais populares estruturas narrativas japonesas: jovens estudantes e Mechas.
Marcado por um longo ciclo de desenvolvimento (o título foi anunciado em 2015, tendo iniciado seu desenvolvimento em 2013), 13 Sentinels teve um caminho bem complicado até finalmente chegar nas mãos dos jogadores. No entanto, mesmo com essas dificuldades, uma coisa pode ser dita com muita tranquilidade: a espera mais do que valeu a pena.
É estranho dizer isso pensando no portfólio da Vanillaware que é recheado de jogos com um ótimo combate tomando precedência em relação a história, mas 13 Sentinels inverte completamente essa lógica. O que se tem aqui é um jogo que, apesar de alguns pequenos problemas no combate é, acima de tudo, uma obra-prima narrativa. E é nisso que o jogo foca.
13 Sentinels: Aegis Rim traz uma das mais insanas histórias de ficção científica já contadas em um jogo e é melhor aproveitada sabendo pouco sobre o que ela realmente é. Ela deliberadamente usa viagem no tempo, mechas, kaijus e vários clichês de forma genial, te deixando confuso no início enquanto ela vai, bem devagar (é sério, a história se desenvolve bem lentamente), te apresentando mais elementos e te fazendo compreendê-la melhor.
Mas, caso você queira saber algo sobre a história, aqui vai um pequeno resumo. 13 Sentinels gira em torno de 13 jovens protagonistas que são estudantes do ensino médio (com os seus típicos problemas pessoais) em Tóquio em diferentes períodos da história do país e que, quando não estão na escola, pilotam mechas gigantes conhecidos como Sentinels para lutar contra forças alienígenas invadindo o planeta.
Cada um dos protagonistas tem sua própria história contada a partir de capítulos e você irá, constantemente, alternar de um para outro, sendo necessário concluir o capítulo de um deles para desbloquear o capítulo equivalente de outro personagem. Se você for parar e analisar essa premissa, ela parece uma receita para o desastre mas, de alguma forma, acaba funcionando de forma excepcional.
Isso acontece pelo jogo conseguir seguir uma linha narrativa em que você consegue acompanhar com facilidade o que está acontecendo, mesmo que existam várias e várias linhas narrativas correndo em paralelo. E isso se torna ainda mais rico porque, quase sempre, os capítulos terminam de uma maneira que te deixa instigado a querer saber o que vem a seguir, sabendo como manipular as suas emoções.
Um outro ponto de extremo sucesso na narrativa é o fato de cada um dos personagens ser bem distinto dos outros. Cada um dos protagonistas tem suas próprias motivações, seus interesses e a relação entre eles sempre tem um verdadeiro ar de legitimidade, com os diálogos sendo escritos de forma bem natural e crível. Isso faz com que o jogador se sinta compelido a saber o que vai acontecer com esses personagens, te dando outra razão para se manter jogando por longas horas (o título leva cerca de 30-40 horas para ser concluído).
Estruturalmente, o jogo é dividido em duas “fases”. Em uma delas você caminha pela cidade de Tóquio em diferentes períodos de tempo controlando um dos 13 protagonistas do jogo, conhecendo um pouco mais sobre cada um deles, sobre os seus amigos (incluindo várias interações entre diferentes protagonistas) e avançando o plot do jogo.
Algo importante é apontar que você ativamente explora os ambientes em um sidescroller 2D (afinal, é a Vanillaware), então, apesar dos personagens ficarem parados conversando quando estão interagindo entre si, os outros personagens no ambiente também tem suas próprias animações e interações, então, ao contrário do que muitos dizem por aí, 13 Sentinels não é uma visual novel.
Ainda assim, existe um certo limite em com quem você pode falar e interagir, então não espere um RPG no qual você pode falar com cada pessoa da cidade. Você, na maioria das vezes, só irá conversar com dois ou três personagens, mexer em alguns objetos e usar a mecânica do Thought Cloud para tocar em determinados assuntos necessários para avançar a história.
Essa mecânica em específico é um dos pontos mais interessantes trazidos pelo jogo. A medida que você vai conversando com outros personagens e interagindo com os cenários, certas palavras-chave vão sendo marcadas pelo protagonista e podem ser usadas depois em diálogos com outros personagens em outros pontos da história.
Falar com todo mundo e conseguir todas as palavras é essencial para conseguir avançar, visto que, caso você não tenha acesso a uma determinada palavra, você pode acabar não abordando certos assuntos com outro personagem e evitando, assim, saber o que deveria vir a seguir. Felizmente, o jogo possui um flow chart (bem similar ao de visual novels) que te ajuda bastante a poder resolver esses pequenos problemas que possam vir a surgir, ainda que seja bem tranquilo conseguir coletar todas as palavras.
A outra “fase” de 13 Sentinels são as sessões de combate do jogo. Nelas, você controla um determinado grupo de Sentinels (eventualmente você terá controle de todas elas) em uma mistura de RTS com Tower Defense, com uma visão por cima que mais parece com estar observando um radar (já que os prédios, Sentinels e inimigos são meros traços e formas geométricas) do que o estilo adotado pelo resto do jogo.
Durante o combate, o jogador precisa defender certos pontos no mapa enquanto dá ordens as suas Sentinels para derrotar forças alienígenas invasoras. Essas ordens podem ser dadas após uma barra ser preenchida, com cada Sentinel tendo um tempo diferente e vantagens distintas em relação aos demais. No entanto, o looping de gameplay é bem simples, com o jogador esperando a barra carregar, escolhendo as ordens e esperando elas serem executadas e a barra preencher novamente.
Certos Sentinels são melhores atacando de longe, enquanto outros são mais voltados para o combate corpo-a-corpo ou à curta distância e possuem habilidades que os permitem diminuir a distância entre eles e os adversários. Cada Sentinel pode ser melhorado entre os combates, tornando-os mais poderosos para lidar com as ameaças que vão surgindo a medida que o jogador vai avançando na história.
O combate como um todo é divertido, mas não é nada demais. Pensando pelo ponto de vista da estratégia, ele é bem intuitivo e fácil de se compreender, mas é igualmente fácil de completar essas fases, agindo mais como um complemento a história do que uma parte digna de elogias por si mesmo. Essa simplicidade se estender a parte visual é algo bem negativo, já que por ser um jogo de mechas, era de se esperar que houvesse a possibilidade de ver os mechas em ação e não meros símbolos geométricos.
Isso chama ainda mais atenção quando se considera o quão bonito e bem-feito é o restante do jogo. A arte 2D de 13 Sentinels é, facilmente, a mais bonita entre todos os jogos da Vanillaware até aqui. Cada personagem e cada cenário tem uma quantidade incrível de detalhes, mostrando o quão cuidadoso foi o trabalho do estúdio ao desenhá-los e todos os personagens possuem múltiplas expressões que mostram claramente os sentimentos de cada momento.
Mesmo diante do combate não tão especial, todos os outros aspectos de 13 Sentinels: Aegis Rim são suficientes para elevá-lo ao posto de um dos melhores jogos de 2020 e o melhor jogo da Vanillaware até hoje. A história é um incrível trabalho de ficção científica, tão cativante pelos seus personagens quanto pelo plot, a arte mantém a tradição da desenvolvedora e o combate, ainda que não seja tão profundo, é divertido. Se há um jogo que precisa ficar no seu radar daqui pra frente, é esse.
Jogo analisado no PS4 padrão com código fornecido pela Atlus USA.
Veredito
13 Sentinels: Aegis Rim é uma das melhores experiências narrativas do ano e um fantástico conto de ficção científica que irá agradar a todos os fãs de robôs gigantes. Apesar do combate deixar um pouco a desejar, ele faz o suficiente para não tirar nada do espetacular estilo artístico e da história sendo contada.
13 Sentinels: Aegis Rim is one of the best narrative experiences of the year and a fantastic sci-fi tale that will please all fans of giant robots. Although the combat leaves a little to be desired, it does enough to take nothing away from the spectacular artistic style and the story being told.
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