Não é mais nenhuma novidade no mercado atual o relançamento de grandes clássicos do passado em formato de coletâneas, e o relativo sucesso desse resgate histórico mostra que é necessário criar possibilidades de podermos revisitar (ou conhecer pela primeira vez) alguns dos games mais influentes de nossa história nas plataformas mais comuns dos dias de hoje. Darius Cozmic Collection é uma dessas oportunidades, lançado inicialmente para o Nintendo Switch em 2019 e que agora chega ao Playstation 4, dividido em duas partes: Arcade e Console. Nesta análise, contudo, vamos falar do pacote completo, do conjunto da obra toda.
Minha jornada com a franquia Darius se iniciou com a versão de SNES (naquele momento, eu pouco sabia de toda a trajetória da marca) e sua base conceitual sempre foi muito singular. Afinal, os chamados “jogos de navinha”, ou em termos mais sofisticados, os shmups, ou shoot ‘em ups sempre trabalhavam com uma temática de guerra mais convencional ou batalhas espaciais futuristas. Bastaram alguns minutos – e várias mortes – para que o primeiro chefão aparecesse em formato de peixe mecânico para que Darius mostrasse toda a sua identidade, algo bastante aperfeiçoado ao longo da difícil campanha.
Lá se vão quase 25 anos desde essa primeira experiência e agora, bem mais velho, tive a oportunidade de revisitar não só essa versão, como tantas outras que não tinham nos alcançado na década de 1990, já que vários desses games são exclusivos do Japão e mesmo os que chegaram ao ocidente não eram os mais fáceis de se encontrar nas locadoras ou botecos, dominados por máquinas de luta ou e de beat ‘em ups. É uma verdadeira volta nostálgica ao passado que se mistura com uma sensação de resgate histórico, uma espécie de dívida sendo paga com a rica trajetória dos videogames.
Como um todo, somando ambos os pacotes, temos: Darius (versões original, nova e extra para arcades); Darius II (arcade e Mega Drive); Darius Twin (SNES, versões americana e japonesa); SAGAIA (Versões 1 e 2 do Arcade, Mega Drive europeu e Master System japonês); Darius Force (SNES japonês); Darius Alpha (PC); Darius Plus (PC); e Darius Gaiden (Arcade). São 16 games (alguns como versões semelhantes uns dos outros), ou, se preferir, 10 jogos diferentes. A divisão entre as duas coletâneas está no nome: um do os pacotes tem tudo o que foi lançado para os arcades – convenientemente, com o título Darius Cozmic Collection Arcade – e o outro para todas as plataformas domésticas, o Darius Cozmic Collection Console.
Sendo assim, as versões “repetidas” não são lá tão atrativas assim, já que a diferença muitas vezes é bem sutil e até imperceptível se não houver aquela comparação frame-a-frame, e funcionam muito mais como um arquivo do que realmente como experiências novas. Ainda assim, passear pelos 10 games diferentes permite uma comparação bastante interessante sobre como os jogos transitavam por diferentes gerações ao mesmo tempo. Guardadas as devidas limitações técnicas de cada plataforma, é um movimento transversal que a indústria atual já não acomoda mais.
Em essência, a franquia sempre se manteve muito bem delimitada em sua proposta. Temos aqui uma coleção de shoot ‘em ups laterais que ajudaram a sedimentar vários dos aspectos que hoje definem o gênero: na progressão horizontal, a nave pode ser controlada enquanto avança em um corredor cheio de inimigos e obstáculos, em meio a um verdadeiro bombardeio inimigo. Começando sempre com um arsenal modesto, é possível ir coletando power-ups (normalmente, liberados ao derrotar líderes de esquadrão) que aumentam dano e alcance, além de tiros e bombas ficarem visualmente sempre mais impactantes.
Os inimigos, por sua vez, tem um comportamento bastante característico e memorizar seus movimentos (às custas de muitas derrotas) é o cerne do gameplay. Cada tipo tem seu padrão de deslocamento na tela e de visual, e saber eliminá-los rapidamente é essencial para que todos não se acumulem na tela e não tornem o trecho intransponível. Mortes são inevitáveis, e a reiteração, mesmo nos primeiros níveis, é parte da experiência. Tudo para, claro, chegar ao final do corredor e enfrentar aquele chefão de fase apelão e seguir para a próxima, escolhendo entre dois caminhos possíveis. Hoje, é uma descrição daquelas que parecem um tanto quanto óbvias, porque afinal, é parte do gênero, mas significou vários avanços técnicos e da própria linguagem.
Sendo mais específico, a primeira versão do jogo para arcades traz um game em proporção pouco convencional para a época, em um formato widescreen. Para os puristas, um banho de nostalgia (e de dificuldade), mas é uma versão bastante crua e, neste caso, vale a pena investir nas versões atualizadas, melhor balanceadas. Darius II dá um belo salto em termos gráficos, e mantém a jogabilidade, com alguns bons ajustes de fluidez. SAGAIA é aquela versão de combate diretamente com chefes, mais direto e objetivo. Darius Gaiden seria o terceiro capítulo oficial e também traz refinamentos e boas adições, se mostrando uma das melhores opções do pacote. Darius Twin e Darius Forces apresentam talvez o ápice de maturação das mecânicas originais e Alpha e Plus, os dois únicos da coletânea a serem feitos para PCs trazem algumas novidades, mas são um tanto quanto esquecíveis.
Em termos gráficos, temos algumas variações estéticas entre os games, sobretudo na transição entre plataformas, flertando com o 2.5 D lá nas versões mais recentes, mas há uma linha bastante definida. São jogos de ritmo acelerado, e de dificuldade intensa, e a opção feita com esse pacote foi a de lançar cada uma destas versões do modo mais purista possível, mantendo formato da janela, cutscenes originais, trilha sonora e interface, ainda que todas estejam localizadas para o inglês. Manteve-se inclusive a tela original de alguns deles avisando que o game é de uso irrestrito ao Japão, algo um tanto quanto estranho para uma coletânea lançada mundialmente, mas que faz parte da proposta de manutenção essencial do que foi o game em seu tempo.
Interessante também o detalhe de haver, no menu inicial, uma descrição muito generosa de cada produto, de onde ele foi lançado, em que ano, e se é um port, uma opção melhorada, ou só uma alternativa de região. Foi um momento singular onde muitas vezes os jogos recebiam outros nomes para cada região do mundo, e para quem olha para o pacote, fica estranho ver títulos como SAGAIA e SuperNova num pacote de jogos da linha Darius. São continuações? Spinoffs? Prequels? Tudo fica um pouco mais evidente ao selecionar o jogo no menu inicial e essa curadoria é essencial para que o público se localize. Fazer o paralelo entre as versões de arcade e console também fica mais fácil.
Algo interessante também é que há elementos modernos de HUD complementares, que ajudam a ter informações adicionais sobre o nível em que nos encontramos, o chefe, e outros dados. Há também ajustes adicionais em termos de formato de tela, som, volume e dificuldade, e estes variam de jogo pra jogo. A questão é que o jogador precisa se atentar a essas escolhas, já que algumas combinações de formato de tela e de HUD adicional podem se sobrepor, poluindo demais e até atrapalhando o espaço diegético. Então, nem sempre dar o zoom para ter uma tela mais preenchida é a melhor opção.
Algo que ajuda um bocado, sobretudo os novatos na franquia, são os sistemas de salvamento e carregamento rápidos. É um recurso que não havia e impossibilitava dar continuidade a uma jornada iniciada. Primeiro, porque a campanha, se assim podemos chamar cada nova entrada, é muito rápida – o jogador sempre escolhe um dentre dois caminhos para seguir, mas sempre seguindo em frente – e segundo porque, bem, não era um costume ter qualquer tipo de save state. Continue vencendo e siga até o final antes de desligar o game ou morra antes disso. Há também opções de continue infinito em alguns jogos, sobretudo os de console, e há aqueles onde a morte faz retornar a um checkpoint e outros onde você segue adiante de onde parou. E, vale lembrar, não são todos, mas vários oferecem a opção de coop local.
Ao passear por todas as opções, não estranhe ter seu preferido, seja por conta de uma dificuldade mais adequada para o que você espera, seja pela qualidade em si. Claro, revisitar os clássicos é importante, e eu diria até necessário. Mas não há vergonha em eleger aquele onde realmente passaremos mais tempo. Uma das opções mais completas do pacote é, sem dúvidas, Darius Gaiden, talvez a mais equilibrada em termos de dificuldade, qualidade técnica e diversão. E faltou, inexplicavelmente, Super Darius, talvez a versão de consoles mais aclamada da franquia. Também é possível verificar que versões contemporâneas de consoles e arcades mostram uma diferença grande entre as plataformas, e na época, as máquinas dedicadas tinham mais recursos a serem explorados. As versões de console, quase sempre (e para outras IPs também), eram mais limitadas, menos vistosas, por assim dizer.
Por fim, uma característica que quase nunca levamos em consideração em análises, mas que aqui de faz necessário, é a questão do investimento. Você já deve ter visto que a PSN está com algum tipo de problema em relação sobretudo a uma das coletâneas (se não viu, confira mais detalhes aqui), mas mesmo o preço oficial parece bastante salgado, ainda que para uma coletânea de respeito – e que, sim, ainda tem alguns buracos – de uma franquia de enorme prestígio. No momento da redação desta análise, com o jogo já disponível na PSN, um dos pacotes está custando R$ 186,90 e o outro R$ 323,90, valores bastante substanciais, sobretudo quando comparados a de games de investimento alto e lançamentos AAA. Continha de mais e, bem, são R$ 510,80 para ambas as coleções. Então, recomendamos esperar a correção dos preços e, mesmo depois disso, o ideal é aproveitar promoções futuras, já que mesmo sendo jogos clássicos e recomendados, é um preço bem salgado.
Questões financeiras à parte, é uma coletânea (em duas partes) de muito respeito. Traz alguns dos jogos mais importantes do gênero e que deveriam, ao menos, serem experimentados por todos e todas. Além disso, continuam divertidíssimos e altamente desafiadores, e há opções de customização em vários deles para que todo mundo possa se divertir, mesmo que mais casualmente, sozinho ou acompanhado.
Jogo analisado no PS4 padrão com código fornecido pela ININ Games.
Veredito
Darius Cozmic Collection, a soma de duas coletâneas de games para arcades e consoles da franquia, traz alguns dos jogos mais incríveis do gênero shut ‘em up, o bom e velho “jogo de navinha”, e consegue oferecer uma experiência muito sólida, seja pela viagem no tempo e na aula de história dos videogames, seja porque os jogos selecionados continuam muito divertidos e atuais, mesmo com suas limitações inerentes ao momento onde foram lançados. A interface funciona, com alguns probleminhas a serem evitados, e os controles respondem tão bem quanto se poderia esperar. Com um preço de lançamento bastante salgado e uma ou outra falta, é um pacote de respeito, mesmo que várias das versões do mesmo jogo pareçam desnecessárias. Para fãs do gênero, uma coleção para se guardar e recordar.
Darius Cozmic Collection, the sum of two collections of the frachise’s games for arcades and consoles, brings some of the most incredible titles of the shut’em up genre, offering a solid experience, either by the time travel or the videogame’s history class, or because the chosen games are still fun and current, even with limitations from the period they were released. The interface works well, with minor problems, and the same can be said about the gameplay. With an expensive launch day price, and one or another flaw, it’s a respectful package, even if many versions of the same game might seem unnecessary. For fans of the genre, it’s a collection to buy and cherish.
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