Blackwood Crossing

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Há muitos anos atrás, a Rede Cultura transmitiu um seriado que me marcou profundamente: Anos Incríveis. Em um dos episódios, os amigos inseparáveis, unha e carne, Kevin Arnold e Paul Pfeiffer, começaram a ter algumas diferenças e viram sua amizade balançar. No fim, ambos entenderam que ser amigo nem sempre significa concordar em tudo e o episódio terminou com uma frase que gosto bastante: "Às vezes precisamos crescer separados para podermos continuar a crescer juntos".

Blackwood Crossing também é sobre um relacionamento em apuros, em que diferenças e mudanças geram conflitos não resolvidos. Neste caso, o que está em jogo é a relação entre os irmãos Scarlett e Finn. Órfãos logo quando pequenos, criados pelos avós, os irmãos sempre foram muito ligados, porém, com o passar do tempo e a chegada da adolescência, essa ligação começou a ser colocada à prova.

Scarlett é a mais velha e se encontra naquele conturbado período de transição da infância para a adolescência, em que brincadeiras começam a ser considerada infantis, a realidade do mundo é mais palpável e o interesse por garotos está aflorando. Isso faz com que ela se afaste pouco a pouco do irmão e dedique seu tempo a outras atividades.

Finn é um garoto de dez anos, cheio de energia e de uma mente criativa e inventiva. Ele era muito novo quando os pais morreram e, por isso, sua ligação com a irmã é muito mais forte. Desse modo, o distanciamento de Scarlett gera um sentimento de perda e uma angústia ainda difícil de serem compreendidos nesta idade, o que resulta em diversos acessos de raiva e ciúmes.

Uma viagem de trem coloca o sentimento dos irmãos frente a frente e é chegada a hora do confronto de emoções na busca por entendimento. No entanto, a presença de um menininho usando uma máscara de coelho mostra que este não é um trem comum; coisas estranhas e absurdas estão acontecendo, e a escuridão parece bastante interessada em Finn. A partir daí, a história toma um rumo surreal e é carregada por simbolismos.

Apesar de gráficos e personagens bonitinhos que lembram animações da Pixar, esta não é uma história infantil, muito longe disso. Blackwood Crossing possui uma narrativa com uma carga dramática muito pesada, que trata de temas como amadurecimento, perda e desapego na forma de diálogos e sensações. Em muitos momentos você é levado a se questionar se está vivendo um sonho em repetição e qual o papel do garoto com máscara de coelho (alô, Donnie Darko).

O jogo se passa em primeira pessoa, em que você está no controle de Scarlett. A história é seu maior foco, o que faz com que o jogo tenha uma progressão bem linear, pausada por quebra-cabeças de baixa dificuldade. Os quebra-cabeças se dividem basicamente em dois tipos: um é baseado em falar com personagens na ordem correta para formar um diálogo coerente, sendo que isso auxilia na compreensão do contexto da história; o outro se baseia em coletar itens escondidos no cenário para resolver algum enigma. Desse modo, o jogo se encaixa em um adventure com fortes elementos narrativos.

Como mencionado, a história é carregada de simbolismos, o que a torna muito aberta a interpretações diversas para cada jogador. A desenvolvedora usa isso a seu favor, por vezes te direcionando propositalmente a uma conclusão para depois te surpreender com uma reviravolta. Tudo isso culmina em momentos intensos e dramáticos, te levando gradualmente a se preocupar cada vez mais com a relação dos irmãos.

Você irá terminar essa viagem de trem em menos de três horas, o que é uma duração razoável. Mesmo assim, sinto que poderia ter se estendido um pouco mais, explorando e desenvolvendo melhor os personagens secundários com mais cenas e quebra-cabeças. Apesar de um baixo replay, aconselho a jogar uma segunda vez, pois várias cenas e objetos terão um contexto e significado muito mais relevante e importante.

O jogo é dublado em inglês britânico, com toda a pomposidade que este sotaque traz. O destaque vai para a voz do Finn, interpretada por Kit Connor, um ator de apenas 13 anos que faz um trabalho surpreendente. Você consegue sentir na voz do Finn um sentimento de abandono, raiva, frustração e angústia facilmente acreditáveis. Scarlet também tem uma boa dublagem, mas é mais contida e, estranhamente, em alguns momentos seu timbre lembra o de Finn, me deixando confuso. O jogo, infelizmente, não possui legendas em português brasileiro.

A desenvolvedora por trás de Blackwood Crossing é o estúdio independente PaperSeven, fundado por ex-funcionários da extinta Black Rock Studio (de Pure e Split Second), sendo este seu título de estreia. Sua missão é criar jogos que tenham profundidade e sentido e, neste aspecto, posso afirmar que o estúdio acertou em cheio com relação ao tom e à narrativa do jogo. No entanto, na parte técnica, há ainda pontos a serem melhorados.

O primeiro alvo de crítica é a movimentação da personagem. É um caminhar esquisito, parece que ela está mancando ou dando pulinhos (e isto não tem nada a ver com o jogo), além de ser lento e não haver comando para acelerar. Somado a isso, há uma câmera a qual não consegui encontrar uma configuração que me agradasse; é lenta para virar, porém, incômoda e rápida quando você quer apontar para um objeto específico, principalmente se ele for pequeno.

A interação com objetos e personagens é feita apontando um retículo que fica no centro da tela. No entanto a área de "ativação" de alguns elementos é muito diminuta ou fica restrita a um local específico e, com isso, algumas vezes tive a falsa impressão de que um objeto/personagem não era passível de interação quando na verdade era o contrário.

Por fim, apesar de ser um jogo que não traz gráficos pesados ou cheios de efeitos, é estranha a presença de um tempo de carregamento alto. O loading na transição entre capítulos é de cerca de 20 segundos, um tempo notável e que poderia ser melhorado.

Como um todo, a desenvolvedora está de parabéns em sua estreia com Blackwood Crossing. A história é comovente e o desenvolvimento do relacionamento entre os irmãos é tão tocante que torna os problemas técnicos irrelevantes. Há também de se parabenizar a trilha sonora, baseada em acordes de piano com notas melancólicas. Fico na esperança de melhorias técnicas nos próximos títulos e no aguardo de mais uma narrativa envolvente.

Veredito

Blackwood Crossing é uma comovente história de amadurecimento, desapego e superação, em que vemos o confronto dos irmãos órfãos, Scarlett e Finn, enquanto tentam colocar suas diferenças de lado e reencontrar o elo que os unia, durante uma estranha viagem de trem marcada por simbolismo e eventos surreais. Há um foco grande na narrativa, complementada por pequenos quebra-cabeças de baixa dificuldade. Se você gosta de se emocionar, prepare o coração e embarque nesta viagem.

Jogo analisado com código fornecido pela desenvolvedora.


 

Veredito

85

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Blackwood Crossing is a touching coming of age story about overcoming losses. We watch two orphans siblings, Scarlett and Finn, in confrontation of emotions while they try to put differences aside and find again the strong bond that once united them, during a strange train trip filled with symbolism and surreal events. There’s a strong focus on narrative, accompanied by puzzles of low difficulty. If you like touching moments, prepare your heart and embark on this journey.

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Blackwood Crossing is a touching coming of age story about overcoming losses. We watch two orphans siblings, Scarlett and Finn, in confrontation of emotions while they try to put differences aside and find again the strong bond that once united them, during a strange train trip filled with symbolism and surreal events. There’s a strong focus on narrative, accompanied by puzzles of low difficulty. If you like touching moments, prepare your heart and embark on this journey.

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