[PSN] Neverending Nightmares

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Vamos falar sobre TOC. O Transtorno Obsessivo Compulsivo é comumente entendido como alguma “mania” que a pessoa tem em que ela se vê obrigada a fazer, caso contrário ela se sentirá desconfortável e incomodada. Pode se manifestar de forma mais leve, como lavar as mãos a todo o momento ou deixar objetos perfeitamente alinhados (já conheci uma pessoa que só aumentava ou abaixava o volume em múltiplos de 5), mas em casos mais graves pode trazer muitos transtornos à pessoa e até mesmo incapacitá-la, afetando tanto sua vida pessoal quanto profissional. Na verdade, trata-se de um transtorno mental que tem sido bem comum na população e que necessita de acompanhamento médico.

Agora para um tópico mais grave, vamos falar sobre depressão. É também classificada como um transtorno mental e deve ser diferenciada de um estado depressivo, isto é, um estado momentâneo de tristeza. A depressão de verdade é duradoura, atinge forte a pessoa e a deixa abalada a ponto de não ter mais prazer nem em fazer as coisas que gosta. Nada parece dar certo, nada parece importar, e pensamentos mórbidos povoam a mente. É uma doença que exige acompanhamento médico e muito apoio de amigos e familiares para não prejudicar a pessoa de maneira definitiva. É um mal que infelizmente vem se acentuando cada vez mais na sociedade.

Enfim, vamos falar sobre Matt Gilgenbach. Ele é uma infeliz vítima do encontro destes dois universos, TOC e depressão, que apesar da possibilidade de serem controlados, nunca vão embora. E não, este não é o protagonista de Neverending Nightmares, mas sim seu criador. Feito de um modo semiautobiográfico, Matt Gilgenbach (que também tem em seu currículo o jogo rítmico Retro/Grade) encontrou na criação do jogo uma forma de lidar e extravasar aquilo que o aprisionava em sua mente, ao mesmo tempo procurando alcançar outras pessoas que sofrem como ele e que de alguma forma podem se identificar com o jogo. Lançado para PC e Ouya em 2014, Neverending Nightmares finalmente chega ao PS4 e PS Vita (cross-buy).

Este é um jogo de terror psicológico bem perturbador, com algumas cenas que causam repugnância e arrepio. Seu tom obscuro é dado logo na primeira cena, com uma garota sendo esfaqueada, provavelmente pelo protagonista, Thomas. A garota chama-se Gabrielle, ou Gabby. O relacionamento entre os dois e o desenrolar de suas histórias são o que preenchem o jogo e acontecem por meio de uma narrativa aberta e ramificada.

O gameplay é baseado principalmente na exploração de corredores. Muitos corredores. Uma repetição de corredores. E portas que levam a novos corredores. Você se sente em um loop, com cada interação levando a pequenas mudanças no cenário e a elementos que despertam a sua atenção. Apesar de em um primeiro momento ter uma similaridade com P.T., seu significado está mais intimamente relacionado ao TOC, a uma compulsão em realizar as mesmas ações, de novo e de novo. Há também o relacionamento com a depressão, em que você se sente sem saída, sufocado, parece que nada dá certo, não importe o quanto você tente.

Vários elementos são utilizados para trazer a tensão e passar uma sensação claustrofóbica no jogador. O primeiro deles são os gráficos em preto e branco. O uso de rabiscos para produzir os efeitos de luz e sombra, com a ênfase nas sombras, deixa uma sensação muito grande de se sentir em um ambiente cada vez mais fechado e opressivo. Alguns elementos no cenário são coloridos, indicando a possibilidade de interação com eles. Além disso, a cor vermelha também é destacada, chamando a atenção do jogador para o sangue, figura constante no jogo.

O segundo elemento de tensão são as músicas e o som ambiente, que evocam suspense e medo, e que tornam obrigatório o uso de fones de ouvidos para uma experiência completa. É de arrepiar quando, do nada, uma voz sussurra ao seu ouvido “Thomas” ou “Wake up” (acorde). Choros e lamentações também fazem parte do pacote, bem como o uso de jump scares, aquelas cenas em que a música atinge um tom mais alto, acompanhada de um acontecimento inesperado que te assusta de surpresa.

O próprio protagonista, Thomas, também vai evocar sentimentos de tensão e desespero. Ele é um personagem fisicamente fraco e que provavelmente sofre de asma. Poucos segundos correndo e ele perde o fôlego. Sua respiração nesses momentos é tão estressante que chega a angustiar. Ele também é um personagem depressivo e transtornado, o que vai se acentuando conforme a história avança. A fraqueza do personagem torna o ritmo do jogo lento, o que pode irritar os mais impacientes.

Apesar de ser possível morrer no jogo, de formas bizarras e repugnantes, não existe uma tela de Game Over. Você simplesmente acorda em um dos quartos para reviver o pesadelo, daí o título Neverending Nightmares (Pesadelos Intermináveis, em tradução livre). Mas os pesadelos do personagem uma hora chegam ao fim, na forma de 3 finais diferentes, baseados em pequenas ações que você toma e que ramificam a história.

Mesmo com mais de um final e uma história ramificada, o jogo, infelizmente, é curto e deixa muitas questões em aberto. Isso provavelmente não é devido a uma preguiça do desenvolvedor, mas sim uma decisão de design. O jogo é repleto de simbolismos e elementos que parecem não fazer sentido, cabendo ao jogador interpretá-los a sua maneira. É novamente como uma obra de arte, que evoca sentimentos diferentes em cada pessoa, algumas se identificado mais do que as outras.

Veredito

Neverending Nightmares traz uma experiência curta, mas angustiante e claustrofóbica, feita para causar incômodos e arrepios. É um convite para explorar a intimidade de uma pessoa que sofreu de TOC e depressão na vida real, extravasados na forma de um jogo. Acaba se encaixando mais como uma expressão de arte do que um jogo de videogame devido aos simbolismos e à abertura existente na história. Se você procura passar uma madrugada com alguns sustos e pensamentos sombrios, Neverending Nightmares será uma boa companhia. Não se esqueça dos fones de ouvido.

Jogo analisado com o código fornecido pela desenvolvedora.

Veredito

75

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