[PSN] Valiant Hearts: The Great War

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Valiant Hearts é um jogo que busca um recorte pouco trabalhado dentro de um dos temas mais recorrentes na indústria de games: a guerra. Porém, o usual tem sido colocar o jogador na posição de soldado, de guerreiro que luta e supera os inúmeros obstáculos e inimigos dos exércitos opositores, numa daquelas fantasias de poder tão recorrentes no universo dos jogos em geral.

Valiant Hearts busca a experiência dos civis, dos que são levados à guerra à força e não encontram nada mais do que destruição e morte em seus caminhos e com os quais a guerra é mais inclemente. A escolha de cenário para retratar os horrores dos conflitos armados é bastante correta: a Primeira Guerra Mundial, um conflito extremamente marcante na história europeia, que foi capaz de deixar cicatrizes profundas no povo do velho continente e cujos soldados voltaram para casa com o trauma da experiência de trincheiras, e não com histórias heroicas para contar.

Para aqueles que buscam conhecer um pouco mais da história, o jogo apresenta uma série de fatos históricos interessantes, além de curiosos itens colecionáveis que sempre acrescentam algo sobre o contexto do game.

O jogo alterna seu foco entre os personagens Emile, Karl, Anna e Freddie. O primeiro é um pacato fazendeiro francês que vê seu genro, o alemão Karl, ser expulso da França para lutar pela pátria germânica, enquanto o próprio Emile é recrutado à força para combater por seu país. Conforme o conflito avança, ambos se reencontram e cruzam caminhos com Anna e Freddie, também arrastados para a guerra, seja pelo trauma da perda, seja pelo desejo de salvar alguém querido. Todos vão interagir enquanto Emile e Karl trabalham para que o jovem alemão possa voltar para a França e cuidar de sua mulher e seu filho recém-nascido.

Além dessas quatro pessoas, o jogo foca bastante em Walt, um cachorro treinado para atuar na guerra e que é uma espécie de anjo da guarda do grupo, sempre pronto a ajudar nos momentos mais difíceis e a receber algum afago.

Durante toda a história, o jogador será apresentado ao terrível conflito da Primeira Guerra, com seus bombardeios inclementes, seus gases venenosos, a explosão de bases subterrâneas sem chances de defesa ou rendição para os adversários, etc. Valiant Hearts não procura poupar o jogador de nada que tenha acontecido de pior naquela época.

Entretanto, uma aparente contradição se desenha a quem se defronta com Valiant Hearts. A direção de arte do jogo é de uma qualidade altíssima, trazendo um traço de desenho que torna cada cenário e cada movimento algo belo e simpático. A trilha sonora é marcante, poderosa e capaz de realmente envolver o jogador emocionalmente. É uma experiência notadamente marcada pela beleza.

Surge aí, então, a pergunta: como um jogo procura mostrar os horrores da guerra ao mesmo tempo em que busca uma beleza tão grande no visual e no som responsáveis por dar vida a esse retrato?

A resposta é tão simples quanto poderosa: essa beleza estética representa uma forma de resistência, uma forma prática de declarar que, no meio do terror, ainda existe a vida e essa vida pode ser dotada de beleza, a beleza que toda vida humana pode ter, graças aos sonhos, ao amor, à vontade. É uma contradição que mantém o jogo pungente em sua mensagem: se não houvesse beleza, não haveria o que o conflito armado pudesse destruir, não existiria nada para salvar, nem nada a lamentar. Nesse sentido, o filme Vidas ao Vento vem à memória, pois, como Valiant Hearts, é uma obra que procura exaltar o sonho num tempo de guerra e sofrimento, e mostra como esse sonho é algo ainda mais importante nesse momento.

Contraditória é também a relação que essa estrutura dual trama versus estética mantém com a jogabilidade. Na prática, Valiant Hearts é um jogo 2D de puzzles, normalmente exigindo que o jogador colete itens espalhados pelo cenário para desbloquear o caminho dos personagens. Há certa variação entre o tipo de situação a que cada um dos personagens é submetido, com Freddie tendo momentos mais tensos de combate, Emile usando sua pá para escapar ou resolver problemas no subterrâneo e Anna usando suas habilidades médicas para curar feridos num mini-game rítmico. Entretanto, esses elementos não são estanques e costumam aparecer nos trechos de outros personagens (com exceção do mini-game de Anna, que é próprio dela).

Nenhum desses puzzles é particularmente complexo ou difícil, sendo necessário apenas ter paciência para juntar todas as peças e fazer o que for preciso para avançar. Mesmo nos momentos de batalha, o jogo é bastante generoso com os checkpoints para recolocar o jogador próximo de onde errou.

E eis a contradição que essa jogabilidade parece apresentar: aquele mundo cheio de dificuldades e problemas, e que, ao mesmo tempo, apresenta uma beleza tão grande, é povoado por puzzles que parecem querer distrair o jogador da trama pesada, quase como se estivessem deslocados ali: é necessário mesmo que seja Emile quem recupere tal alavanca, ou que seja justamente Freddie quem exploda tal canhão? É como se o jogo desse uma condição de poder ao jogador numa situação em que isso seria impensável.

É nessa reflexão que Valiant Hearts se mostra um jogo fortemente alegórico, usando suas ferramentas de expressão para significar coisas diferentes. A resolução dos puzzles é como uma exteriorização do esforço interno dos personagens, lutando contra seus medos e usando suas esperanças como armas para triunfar. Nesse sentido, a estrutura de puzzles ganha um significado único no jogo: o ato de reunir peças corretas, acertar o timing dos movimentos, saber usar as habilidades de Walt nas horas certas, tudo isso é como se os personagens reunissem para si mesmos os elementos necessários para triunfar, como se juntassem seus pedaços de sujeito para lutar e sobreviver à experiência extrema a que estão submetidos.

Todo esse mecanismo complexo que é Valiant Hearts está em todo o jogo, mostrando-se com mais clareza num mini-game específico: em certos momentos, alguns personagens se reúnem no táxi de Anna para ir de um trecho a outro e, nessas seções, é preciso desviar de uma série de perigos que acometem o carro. As ameaças surgem no ritmo de belas músicas clássicas, que, além de ajudar a pautar o ritmo para o jogador, criam uma situação que une perigo e sublime. Enquanto tudo isso acontece, cabe aos personagens superar a ameaça com perícia para se manterem vivos, mesmo que isso signifique, por vezes, cair em outra armadilha. É uma mistura poderosa que mostra a luta dos homens em momentos de duras condições, uma luta que mistura sangue, sonhos e força.

Veredito

Valiant Hearts é um jogo que aborda um tema batido com incrível novidade e precisão, sabendo criar uma poderosa estrutura de significação: temática, jogabilidade e estética visual e sonora trabalham para despertar no jogador uma pungente e emocionante luta pela sobrevivência num tempo cruel.

Jogo analisado com código fornecido pela Ubisoft.

Veredito

98

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